Mulher usa telefone celular para se conectar à internet em Havana, em dezembro de 2018, quando a internet móvel começou a funcionar no país| Foto: YAMIL LAGE / AFP

A notícia se espalhou pelo Telegram e depois pelo Twitter. No dia acordado, o povo cubano se uniria em uma só voz.

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Não para clamar pela democracia, nem para pedir a renúncia de Miguel Díaz-Canel e nem para exigir a liberdade dos presos políticos. O objetivo era protestar contra os altos preços de internet móvel.

A resposta esmagadora - milhares de tuítes com a hashtag #BajenLosPreciosDeInternet (baixem os preços da internet) - tornou-se, segundo algumas estimativas, o maior protesto, embora digital, a se espalhar na ilha comunista em anos. Dissidentes há muito monitorados pelo governo aderiram à causa, além de estudantes, empresários e outros cubanos.

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Eles não estavam exigindo mudanças políticas. Eles estavam dizendo que queriam que seu governo fosse mais responsivo.

"As redes sociais estão revolucionando Cuba", disse um vendedor de Havana de 20 anos que ajudou a lançar o protesto de junho, em uma entrevista via Telegram. "Esta é a única maneira que eles vão nos ouvir".

Em um mundo que sofreu mudanças permanentes por causa das redes sociais, Cuba foi uma das últimas fronteiras. O acesso doméstico à web começou a se expandir em 2008, mas ainda era limitado principalmente à elite do governo e a alguns profissionais. Para navegar na internet, a maioria dos cubanos precisava encontrar um ponto de acesso público, comprar um cartão telefônico e usar um smartphone barato.

Isso mudou há sete meses, quando este país de mais de 11 milhões de habitantes introduziu o serviço de telefonia móvel 3G - um avanço que permite aos cubanos ter acesso à internet em qualquer lugar e a qualquer momento que tenham cobertura celular.

O custo, de US$ 7 por mês para o pacote mais barato, permanece fora do alcance de muitos em um país onde a renda média mensal é de US$ 44. No entanto, um número crescente de cubanos - mais de 2,2 milhões - está acessando o serviço 3G e isto está dando origem a uma nova classe de internautas, que estão se organizando para defender causas e movimentos sociais de uma maneira nunca vista desde a revolução cubana.

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Desconforto para o regime

Por anos, os censores cubanos bloquearam sites que consideram politicamente sensíveis. Mas o governo surpreendeu alguns observadores ao não seguir o exemplo de países como a China, que bloqueia sites populares de mídia social, incluindo o Facebook e o Twitter. Díaz-Canel, que assumiu a liderança do país no ano passado, e outros altos funcionários cubanos adotaram as redes sociais - abrindo contas no Twitter, por exemplo. Em maio, o governo tomou medidas para permitir o acesso Wi-Fi doméstico de forma mais ampla.

Em resposta, alguns cubanos estão enviando reclamações e preocupações diárias diretamente aos seus líderes.

"Anos atrás, quando tínhamos Fidel, você poderia escrever uma carta respeitosa, dizendo que seu telhado precisava de conserto ou algo assim", disse Liber Puente, CEO da empresa de TI TostoneT, de Havana. "E se você tivesse sorte, as equipes de reparos apareceriam de repente - às vezes com Fidel. Agora, os cubanos do Twitter estão fazendo solicitações diretamente para seu governo - e alguns não estão sendo tão educados quanto antes", contou.

Grande parte da atividade online está sendo conduzida dentro de certos parâmetros de debate. Cuba continua sendo um estado autoritário de partido único e os usuários não estão desafiando seus líderes; eles estão se concentrando em preocupações mais locais e pessoais. A abordagem equivale a uma aceitação tática do sistema comunista da ilha.

Mas há sinais de que as críticas e reclamações podem estar entrando em um terreno menos confortável para o regime comunista.

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Após o protesto pelo preço da internet, a imprensa pró-governo culpou "mercenários" apoiados pelos EUA. Organizadores e participantes negam a acusação.

"Isso não tem nada a ver com os Estados Unidos ou os cubano-americanos", disse o organizador de 20 anos, que falou sob condição de anonimato por preocupação com retaliação. "As pessoas estão cansadas dessas mesmas velhas mentiras".

Parada gay e filas para comprar alimentos

Em um movimento visto como um crescente desconforto com o poder das pessoas na web, as autoridades cubanas proibiram abruptamente uma parada do orgulho gay na capital, que foi organizada, em grande parte, pela internet. Até mesmo o aviso de cancelamento veio via mídia social: o Centro Nacional para Educação Sexual de Cuba disse no Facebook que o evento havia sido cancelado por causa de "novas tensões no contexto internacional e regional".

Os organizadores, destemidos, reagruparam-se rapidamente nas redes sociais e centenas protestaram contra a proibição. Eles marcharam cerca de um quilômetro antes de serem parados pela polícia, que deteve vários participantes.

"Quando eles começaram a detenção de pessoas, estavam procurando por um líder", disse Norges Rodriguez, ativista pelos direitos dos gays. "Mas o protesto foi organizado através das mídias sociais, não havia um líder específico".

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Rodriguez e seu marido, Taylor Torres Escalona, ​​33, ajudaram a introduzir os cubanos no poder da sátira social baseada na web. Depois que o governo anunciou um novo racionamento de alimentos em maio, o casal tuitou uma foto deles mesmos posando de forma divertida em uma longa fila de alimentos, acompanhada da hashtag #lacolachallenge - ou o desafio da fila.

O tuíte tragicômico fez com que outros cubanos postassem suas próprias selfies em filas para comprar comida usando a mesma hashtag.

"Não sei se (autoridades do governo) perceberam exatamente o que estavam fazendo" quando introduziram o 3G, disse Rodriguez. "Mas eles não podem voltar atrás agora".

Denúncias de abuso

Observadores cubanos dizem que as mídias sociais também podem fornecer segurança a jornalistas e ativistas.

Em uma manhã de maio, a jornalista dissidente Luz Escobar estava sentada em um hotel em ruínas perto do aeroporto de Havana, entrevistando moradores desalojados por um furacão que havia atingido a capital. Eles estavam reclamando de uma resposta do governo, "quando as autoridades de repente entraram", segundo o relato dela.

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Escobar disse que foi levada pela polícia, que lhe disse que não estava autorizada a conduzir tais entrevistas. Seu desaparecimento provocou uma resposta rápida no Twitter: mais de 1.000 usuários divulgaram notícias de sua detenção.

Dentro de cinco horas, ela foi libertada pelas autoridades.

"Meu sentimento é que (a campanha do Twitter) teve um impacto", disse ela. "Fiquei impressionada com a solidariedade no Twitter vinda de pessoas que eu não conhecia. Algumas delas não tinham nada a ver com a imprensa. Elas eram apenas cidadãos, artistas, quem quer que fosse".

"As mídias sociais são incríveis", disse ela.