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Dezenas de milhões de norte-americanos já votaram nas eleições de 2020 pelo correio, dando continuidade a uma mudança histórica nos métodos de votação que teve início com as eleições primárias realizadas durante a pandemia de Covid-19.
Cédulas enviadas pelo correio, contudo, não são automaticamente aceitas, como acontece com as cédulas de votação presencial. Ao contrário, elas podem ser rejeitadas se tiverem problemas de assinatura em seus envelopes de devolução. A não ser que contem com o endosso dos eleitores – isto é, que os eleitores corrijam os problemas de assinatura – essas cédulas serão rejeitadas.
Graças às informações sobre participação do eleitorado em dois campos de batalha, a Flórida e a Carolina do Norte, podemos identificar a quantidade de cédulas enviadas pelo correio que correm o risco de ser rejeitadas. Até aqui, podemos dizer que há milhares de cédulas separadas para serem descartadas nesses dois estados. Além disso, minorias raciais e democratas têm uma probabilidade desproporcionalmente maior de verem seus votos pelo correio rejeitados nesta eleição.
A questão da assinatura
Acima, usamos a palavra “risco” para descrever as cédulas da Flórida e Carolina do Norte que podem ser descartadas. Apesar de essas cédulas terem problema com as assinaturas, elas ainda não foram formalmente rejeitadas.
Nem todos os estados têm as mesmas exigências para o voto pelo correio, mas as cédulas geralmente são descartadas se não vierem acompanhadas da assinatura do eleitor. Outra fonte de problemas é a assinatura flagrantemente errada. Isso acontece quando uma autoridade eleitoral conclui que a assinatura do eleitor no envelope de devolução não é igual à assinatura registrada.
Alguns estados, como a Carolina do Norte, exigem a assinatura de testemunhas nos envelopes de devolução – e a falta de testemunhas é considerada um problema.
Cédulas rejeitadas podem influenciar as eleições
Nossas estimativas quanto às cédulas de votação que podem ser rejeitadas na Flórida e na Carolina do Norte são conservadoras. Ao realizarmos os cálculos, usando dados oficiais, pressupomos que quaisquer inconsistências que encontrássemos nos dados seriam decididas em favor da aceitação das cédulas.
Dito isso, eis o que sabíamos até o dia 22 de outubro.
Na Flórida, 3.210.873 eleitores enviaram cédulas pelo correio. Desse total, 15.003 cédulas podem ser rejeitadas, o que corresponde a uma rejeição de 0,47%. Essa porcentagem não é uma estimativa. Ela se baseia em cálculos feitos a partir de dados oficiais de todo o estado.
Essas milhares de cédulas atualmente no limbo podem fazer a diferença. Lembre-se da eleição de 2018. Em sua candidatura bem-sucedida para o Senado, o republicano Rick Scott venceu o concorrente democrata Bill Nelson por apenas 10.033 votos.
Mais de 2 milhões de pessoas na Flórida ainda têm de devolver as cédulas que lhes foram enviadas pelas autoridades eleitorais do condado, então a quantidade de cédulas sujeitas à rejeição no estado pode superar os 15 mil.
Na Carolina do Norte, uma porcentagem ainda maior de cédulas corre o risco de ser descartada. No estado todo, 8.228 das 701.425 cédulas enviadas pelo correio têm problemas, o que pode gerar uma taxa de rejeição de 1,2%.
Assim como na Flórida, as eleições na Carolina do Norte são muito disputadas. Na eleição de 2016 para o governo do estado, a diferença entre o vencedor, o democrata Roy Cooper, do seu adversário, republicano Pat McCrory, foi de meros 10.277 votos em meio a aproximadamente 4,6 milhões de eleitores. A quantidade de cédulas sob questionamento na Carolina do Norte – 8.228 – ainda é menor do que essa margem, mas pode aumentar à medida que as cédulas forem devolvidas.
Taxa de rejeição de cédulas por partido e raça
Os riscos da rejeição das cédulas enviadas pelo correio não estão uniformemente distribuídos por todos os eleitores, e as rejeições não são politicamente neutras.
A partir de nossos dados na Flórida e Carolina do Norte, podemos ver que os democratas têm taxas de rejeição maiores do que os republicanos. As diferenças partidárias nas taxas de rejeição em potencial – taxa dos democratas em relação à dos republicanos – é de aproximadamente 0,07% na Flórida e 0,16% na Carolina do Norte.
Além disso, os democratas estão mais dispostos do que os republicanos a votarem pelo correio – ainda que essa tendência possa estar mudando. Isso afetará qualquer distorção causada pelas taxas de rejeição das cédulas de democratas e republicanos.
Os dados eleitorais oficiais da Flórida e Carolina do Norte também revelam um claro padrão racial entre as cédulas que podem ser descartadas. Os eleitores negros e hispânicos têm uma probabilidade maior do que os brancos de ver suas cédulas rejeitadas por falta de assinatura ou outras discrepâncias.
Na Flórida, as cédulas enviadas por eleitores hispânicos têm 2,6 mais chances de serem rejeitadas do que as cédulas enviadas pelos brancos. Na Carolina do Norte, o risco de os negros terem seus votos descartados é três vezes maior em relação aos brancos. Os eleitores brancos, pois, têm uma taxa de rejeição de voto menor do que os eleitores de minorias, que tendem a votar mais em candidatos democratas do que em republicanos.
Cédulas ainda podem ser “consertadas”
Tanto na Flórida quanto na Carolina do Norte, os eleitores que enviaram cédulas pelo correio com problemas de assinatura ainda podem “consertar o voto”.
Os eleitores da Flórida podem corrigir os votos dados pelo correio até terça-feira, 5 de novembro. Isso pode ser feito por meio de uma simples declaração. Até pouco tempo, os detalhes referentes à correção do voto por correspondência na Carolina do Norte dependiam de decisão judicial. Mas hoje, em alguns casos, os eleitores podem “consertar” votos com problemas. Mas as cédulas sem assinatura de testemunhas não podem ser arrumadas na Carolina do Norte, e os eleitores que cometem esse tipo de erro devem pedir novas cédulas se quiserem que seus votos sejam contados como válidos.
Para se consertar um voto com problema de assinatura você precisa saber que ele está sujeito à rejeição. Nem todos os estados informam os eleitores de problemas envolvendo seus votos.
Em alguns estados, os eleitores que votam pelo correio podem consultar o status de seu voto diretamente com as autoridades eleitorais ou usando o serviço pela Internet disponibilizado pela Secretaria de Estado, como fazem os eleitores do Novo México e Ohio.
Mas outros estados, como Maine e New Hampshire, não há leis determinando que os eleitores tenham a oportunidade de consertar seus votos enviados pelo correio. Para esta eleição, contudo, autoridades desses dois estados da Nova Inglaterra criaram procedimentos para permitir que os eleitores arrumem os votos com problemas.
Levando em conta o aumento dos votos pelo correio nesta eleição, provavelmente haverá confusão envolvendo cédulas rejeitadas e corrigidas. No futuro, é importante que os estados criem processos transparentes de correção de votos, a fim de garantir que os eleitores sejam capazes de exercitar seu direito ao voto.
*Michael Herron é professor de Ciência Política na Dartmouth College. Daniel A. Smith é professor de Ciência Política na Universidade da Flórida.
© 2020 The Conversation. Publicado com permissão. Original em inglês.