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Milícias ocupam terras na Crimeia

Estúdio Yalta Film na Crimeia foi tomado em um processo sistemático de desapropriações, algo que só ocorreu na revolução Russa | james hill para The New York Times
Estúdio Yalta Film na Crimeia foi tomado em um processo sistemático de desapropriações, algo que só ocorreu na revolução Russa (Foto: james hill para The New York Times)

No imbróglio de despojos da Crimeia, forças armadas invadiram uma infinidade de empresas em toda a península, expulsando os proprietários e reivindicando a propriedade para o governo da Crimeia.

O estaleiro Zaliv, em Kerch, foi invadido pela milícia por terra e por mar, com dezenas de integrantes chegando em dois barcos, disse Nicolay Kuzmenko, presidente do conselho do estaleiro.

"Parecia uma operação militar", ele disse, e a "força de autodefesa", apoiada pelo governo, usava balaclavas pretas para esconder o rosto.

A força, que ajudou os militares russos a controlarem a Crimeia, responde ao primeiro ministro Sergei Aksyonov, que a chama de "milícia do povo".

Segundo algumas pessoas, desde que a Rússia anexou a península do Mar Negro há 10 meses, mais de US$ 1 bilhão em bens imóveis e outros ativos foram tomados de seus antigos proprietários. Os bens incluem bancos, hotéis, estaleiros, fazendas, postos de gasolina, a padaria principal, uma leiteria e até o Estúdio de Cinema Yalta, que 50 anos atrás fez desta agora decaída região a Hollywood da União Soviética.

O confisco de propriedades em uma escala tão arrebatadora não ocorria desde a revolução russa, disseram os proprietários. Muitos argumentaram nos tribunais que os confiscos violaram uma cláusula da Constituição russa que determina uma indenização quando o governo toma uma propriedade.

"Se eles realmente acreditam que este é um território russo, as leis russas devem ser aplicadas e não uma leizinha da Crimeia que contradiz a russa", disse Roman V. Marchenko, advogado em Kiev.

Mas, acrescentou, "acreditamos firmemente que, por razões políticas, não haverá justiça nos tribunais russos".

Advogados dizem que o governo está seletivamente se apoderando de propriedades para cobrir suas contas. "As autoridades da Crimeia receberam carta branca para financiar seu orçamento e vão atrás de proprietários e acionistas que não são do seu partido e nem pertencem ao Conselho de Estado", disse Zhan Zapruta, advogado da Krymavtotrans, principal fornecedora de passagens de ônibus da Península, anexada em setembro.

O Conselho de Estado da Crimeia abriu as portas para o confisco em agosto, quando deu ao governo o direito de apropriação de propriedades para manter a "atividade vital". A lei também estabelece que o governo irá pagar indenizações.

"Nada foi confiscado. Há um processo de redenção forçada", disse Vladimir A. Konstantinov, presidente do Conselho de Estado.

Konstantinov e outros dizem que estão recuperando as propriedades que alegam terem sido roubadas do governo através de acordos ilegais feitos por autoridades ucranianas e seus comparsas.

Uma das propriedades confiscadas é o Estúdio de Cinema Yalta.

Em outubro, homens armados invadiram o prédio da administração e forçaram todos a se deitarem no chão, disse Sergei M. Arshinov, empresário de Moscou proprietário do estúdio.

O governo da Crimeia cita o estúdio como um exemplo de venda "criminosa" de terrenos, dizendo que vai pagar cerca de US$100 mil em indenização, refletindo o preço de venda determinado pela alçada ucraniana. Mas Arshinov afirma que ele e seu irmão pagaram aproximadamente US$ 3 milhões pela propriedade, depois que um amigo que fazia parte da Comissão Estadual de Cinema da Rússia lhes pediu que resgatassem o estúdio à beira da falência, 15 anos atrás.

Mas o principal alvo agora é Igor Kolomoisky, proprietário majoritário do maior banco da Ucrânia, o PrivatBank. Em dezembro, o ministério da Propriedade e da Terra da Crimeia anunciou um leilão de 83 propriedades nas quais Kolomoisky tem participação. Uma lista anterior de suas propriedades inclui hotéis, escritórios, prédios de apartamentos, resorts e 16 postos de gasolina. O anúncio disse que o dinheiro da venda das propriedades iria para o orçamento da Crimeia e para os correntistas que perderam suas contas bancárias quando o PrivatBank parou de operar na região após a anexação. Mas um alto executivo do banco, Timur Novikov, disse ser impossível verificar a maneira na qual tal lista foi compilada, dizendo, "Acho que é uma bagunça total."

Em Kiev, o ministério da Justiça disse que quase quatro mil empresas e organizações ucranianas perderam propriedades. Konstantinov disse que os proprietários seriam indenizados.

Vários advogados disseram que seus casos foram encaminhados para a Suprema Corte russa, que deverá se pronunciar sobre a constitucionalidade da lei da Crimeia. Enquanto isso, todos os bens pertencentes ao PrivatBank estão apreendidos, incluindo agências, reservas de dinheiro e caixas automáticos, disse Novikov, o executivo responsável por obter soluções jurídicas. Ele estima as perdas totais do banco em US$ 1,1 bilhão.

Inicialmente, o presidente Vladimir V. Putin, da Rússia, parecia incentivar a população da Crimeia a parar de pagar seus empréstimos. Durante um programa de entrevista com o presidente na primavera passada, alguém perguntou sobre o empréstimo feito para pagar por um carro: "O PrivatBank não opera mais na Crimeia. O que devo fazer?"

E Putin respondeu: "Por favor, use o carro e não se preocupe". Mais tarde, o governo russo pediu o pagamento dos empréstimos.

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