Armas ecológicas, biologia sintética e direito internacional. No ano passado, quando o exército dos Estados Unidos divulgou imagens de um avião não tripulado que tinha o tamanho e a forma de um beija-flor zumbindo em um estacionamento, toda a mídia entrou em polvorosa.
A revista Time dedicou até mesmo uma capa para o assunto. Enquanto isso, sem fazerem alarde algum apesar de anunciarem um enorme potencial para remodelar a guerra moderna os militares emitiram um edital para que cientistas encontrassem formas de produzir explosivos para armas à base de micróbios.
Imagine uma cuba de levedura geneticamente modificada que gera produtos químicos para bombas e mísseis em vez de cerveja.
O edital se beneficia de novas pesquisas na área da biologia sintética, uma ciência que aplica princípios da engenharia à genética.
Os cientistas possuem certo crédito humanitário por terem, durante a curta existência desse campo, programado bactérias e leveduras geneticamente para produzir combustíveis verdes para jatos (atualmente sendo submetidos a testes por fabricantes de aviões de grande porte) e medicamentos contra a malária (cujo lançamento no mercado está previsto para 2013).
Trata-se de um começo auspicioso para uma ciência que prenuncia revolucionar a forma como fazemos as coisas. No futuro, poderemos fazer com que as células se juntem para constituir objetos muito mais complexos, como baterias de telefone celular, ou se comportem como minúsculos computadores programáveis. Tal promessa, entretanto, apresenta também riscos.
As técnicas que fazem da biologia sintética uma ferramenta tão poderosa para inovar de modo positivo podem ser usadas também para destruir. A nova pesquisa dos militares em busca de explosivos biologicamente modificados ameaça reinaugurar um ramo de pesquisa que foi deixado de lado por 37 anos: a biotecnologia desenvolvida em função da guerra.
No mês passado, os governos que ratificaram a Convenção das Armas Biológicas e Tóxicas o acordo internacional que baniu as armas biológicas reuniram-se em Genebra para rever e atualizar o acordo. Como esperado, eles discutiram as redes terroristas e criticaram os países malfeitores acometidos pela doença do armamentismo. Mas eles também falaram das ciências emergentes e de como elas poderiam ser usadas para criar novas ameaças.
Como as conferências que revisam a Convenção de Armas Biológicas (BWC) ocorrem apenas uma vez a cada cinco anos, essa ainda foi a segunda vez que a biologia sintética foi debatida como tópico.
Ao reconhecer o rápido progresso científico que está em curso, os participantes concordaram em reunir especialistas anualmente para monitorar os novos desenvolvimentos tecnológicos em relação à convenção.
Foguetes
Enquanto alguns setores do governo têm se mostrado cautelosos, o Ministério da Defesa dos Estados Unidos tem sido mais assertivo ao apresentar suas intenções. Um edital de pesquisa desse ministério, por exemplo, solicita que biólogos sintéticos criem explosivos e combustíveis mais ecológicos para foguetes. Na "declaração de necessidade" de tal edital, o Programa Estratégico de Pesquisa e Desenvolvimento Ambiental (SERDP), que procura tornar o serviço militar mais ecológico, argumenta que o uso de micróbios poderia eliminar os solventes de metais pesados e tóxicos na produção de explosivos convencionais.
Aparentemente, o projeto de criar armas de guerra mais ecológicas parece algo benigno, até mesmo benéfico, mesmo que um pouco incongruente. Mas a medida extrapola os limites definidos pela BWC em 1975 e reafirmados pelo governo dos EUA muitas vezes desde então.
O Artigo 1.º da BWC afirma que os signatários não devem produzir ou possuir agentes microbianos ou outros agentes biológicos "que não têm justificativa para propósitos profiláticos, cautelares ou pacíficos". Como os explosivos produzidos à base de micróbios em si não seriam armas, eles não aparentam violar a convenção. Dito isso, como parte da cadeia de produção e meio para confeccionar componentes de armas, eles também não se qualificariam como tendo "fins pacíficos".