Ouça este conteúdo
A ditadura da Venezuela está reativando “a modalidade mais violenta de repressão”, com uma nova onda de detenções de opositores acusados de supostas conspirações como a chamada Operação Pulseira Branca, alertou nesta quarta-feira (20) a Missão Internacional Independente da ONU para a Venezuela.
A presidente da missão, a portuguesa Marta Valiñas, apresentou um novo relatório ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas sobre os abusos cometidos pelo regime de Nicolás Maduro na Venezuela desde 2023, no qual destacou que “as autoridades invocam conspirações reais ou fictícias para intimidar, deter e processar pessoas que se opõem ou criticam o governo”.
Neste período, indicou, houve uma transição de uma fase menos repressora da oposição, em que o regime de Nicolás Maduro se limitou a criar “um clima de medo e intimidação”, para um período mais violento, “que é ativado para silenciar as vozes da oposição a qualquer preço”.
Valiñas destacou neste sentido que, em janeiro, Maduro pediu para “ativar a Fúria Bolivariana”, após alegar que no ano anterior haviam sido frustradas quatro conspirações para assassiná-lo ou organizar golpes de Estado, e que a Procuradoria-Geral da República disse então ter conhecimento da mencionada Operação Pulseira Branca, uma das supostas conspirações para acabar com a vida do ditador venezuelano.
No contexto da luta contra esta última conspiração, 33 soldados foram despromovidos e expulsos e vários críticos do regime foram detidos.
Entre eles, recordou a missão da ONU, estão líderes de campanha do partido Vamos Venezuela - da líder da oposição María Corina Machado - e defensores dos direitos humanos, como Tamara Suju, Sebastiana Barráez e Rocío San Miguel.
Valiñas destacou que San Miguel, detida em 9 de fevereiro no aeroporto de Maiquetía sem ordem judicial, ficou desaparecida por cinco dias “até que as autoridades informaram que ela estava sendo mantida em El Helicoide, um dos centros de tortura documentados pela missão”.
Destacou também que no mês passado, pouco depois de tanto a missão que preside como o Escritório da ONU para os Direitos Humanos manifestarem sua preocupação com Rocío San Miguel, o regime venezuelano suspendeu as atividades da missão técnica do referido escritório e deu a seus funcionários um prazo de 72 horas para sair do país.
A chefe da missão, completada pelo chileno Francisco Cox e pela argentina Patricia Tappatá, acrescentou que, juntamente com San Miguel, documentaram casos de outras 18 mulheres que permanecem detidas sob a acusação de estarem associadas ou envolvidas em “conspirações” para derrubar o governo.
Missão questiona eleições na Venezuela
Marta Valiñas também lembrou que nos seis meses analisados pela missão foi assinado em Barbados um acordo entre ditadura e oposição para que esta pudesse participar nas eleições de 28 de julho deste ano, mas as ações subsequentes revelaram as dificuldades na sua implementação.
A presidente da missão deu como exemplo a suspensão, por parte do Supremo Tribunal de Justiça, das primárias da oposição de 22 de outubro do ano passado, vencidas por ampla maioria por María Corina Machado, e a ratificação pela mesma corte da sua inabilitação política por 15 anos, em 26 de janeiro.
“Estas ações evidenciam as graves dificuldades que existem para garantir que as próximas eleições presidenciais sejam realizadas de acordo com o direito de participação nos assuntos públicos, previsto no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos”, destacou Valiñas.
Também chamou a atenção para os mandados de prisão contra 14 pessoas, incluindo destacados líderes da oposição, como Juan Guaidó e Leopoldo López, por sua suposta ligação com uma conspiração contra o referendo consultivo sobre a Guiana Essequiba, realizado em 3 de dezembro.
Ditadura da Venezuela responde
Em resposta, a delegação venezuelana perante o Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra rejeitou mais uma vez as conclusões da missão e até mesmo a legitimidade da mesma, criada em 2019 pelo próprio conselho para investigar abusos de direitos humanos no país.
“Os Estados Unidos, o maior violador de direitos de toda a história, a União Europeia e o fracassado Grupo de Lima desenharam este mecanismo [a missão] com o propósito de aplicar a máxima pressão sobre a Venezuela, manipulando os instrumentos e propósitos deste Conselho”, disse um representante da delegação.
“Pretendem revestir como verdades absolutas todas as atrocidades fabricadas contra a Venezuela, sem verificação ou prova sustentável”, acrescentou, se referindo ao trabalho de uma missão que, segundo ele, “apela a fontes anônimas e até inventadas”.
Depois, em um comunicado, o governo venezuelano rejeitou, “de maneira contundente”, as declarações “emitidas pela falsa e vergonhosa” missão na apresentação do novo relatório, com o qual, segundo Caracas, o mundo “testemunhou hoje uma das páginas mais vergonhosas em termos de direitos humanos”.
O regime de Nicolás Maduro acusou a missão de emitir “juízos tendenciosos para fins meramente políticos” e de ser “cúmplice de setores extremistas que promoveram sanções desumanas contra a Venezuela” e que, “repetidamente, fizeram planos para assassinar” Maduro e “causar caos e destruição ao seu povo”.
A ditadura chavista pediu ao Conselho de Direitos Humanos da ONU que “rejeite qualquer argumento fraudado da referida missão, que não pôs os pés” no país e “utiliza métodos pouco profissionais para apresentar um panfleto partidário que deve ser rejeitado categoricamente”.
“A Venezuela não aceita e não aceitará nenhuma medida que surja desta afronta, apresentada a um Conselho que nada fez para travar o genocídio do povo palestino”, afirmou o regime, que alegou compromisso com a “promoção, respeito e proteção” dos direitos humanos “como um valor supremo”.