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A campanha para as eleições locais e regionais realizadas no domingo passado (21) na Venezuela foi marcada pela “extensa utilização de recursos estatais”, segundo informou nesta terça-feira (23) a chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE-UE), Isabel Santos.
“A campanha foi marcada pela extensa utilização de recursos estatais, apesar de o marco legal estabelecer poderes de sanção para o financiamento e publicidade da campanha”, disse Santos em entrevista coletiva em Caracas.
O relatório preliminar da MOE-UE apresentado pela eurodeputada portuguesa afirma que houve “entrega de bens como embalagens de alimentos, botijões de gás e bombas de água”, o que afetou “a igualdade de condições”.
“A campanha do partido no poder foi predominante em todo o país e teve uma base mobilizada e, em alguns casos, com a participação de funcionários públicos”, ressalta o documento.
Santos destacou que, apesar de o marco legal estabelecer poderes de sanção para o financiamento de campanhas e publicidade ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE), “não houve sanções por violações”.
Por esta razão, e sem querer “antecipar as recomendações do relatório final”, considerou que isto “demonstra que o CNE precisa de ser reforçado nos seus poderes sancionatórios”.
O relatório indica que “a cobertura do partido governista”, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), “era dominante e desproporcionalmente favorável na televisão estatal e muito significativa nas estações de rádio e televisão privadas monitoradas”.
“Além da cobertura desequilibrada, a presença constante do vice-presidente do PSUV (Diosdado Cabello) nos veículos de comunicação estatais, nos quais dirigiu ataques ferozes contra adversários políticos e até mesmo contra um reitor do CNE, vai contra os padrões internacionais de cobertura imparcial dos veículos de comunicação estatais”, acrescenta.
Cabello comanda um programa semanal no canal estatal Venezolana de Televisión (VTV), “Con el mazo dando”, no qual frequentemente faz ataques a adversários, ongs e ativistas.
Primeira missão em 15 anos
Santos enfatizou que esta é a primeira missão de observação enviada pela UE à Venezuela em 15 anos e que “tem sido possível graças ao convite do CNE”.
“Compreendo que isto também tem sido o resultado de um processo de diálogo entre os atores políticos venezuelanos. Todos os atores”, explicou.
Ela disse que o relatório preliminar apresentado nesta terça-feira “não pode ser utilizado para fins políticos”, pois “é uma abordagem técnica ao contexto eleitoral e ao momento eleitoral”, além de “um instrumento útil para melhorar” futuras eleições.
A eurodeputada explicou que durante o dia das eleições, os observadores da UE estiveram presentes nos 23 estados da Venezuela e em Caracas, que tem o seu próprio regime, e que visitaram 665 centros de votação, cobrindo mais de 1.318 mesas.
Finalmente, o relatório preliminar afirma que “a falta de independência judicial e o desrespeito pelo Estado de direito afetaram negativamente a igualdade das condições de concorrência e a equidade e transparência das eleições”.
“Nestas eleições, a suspensão do direito dos candidatos afetou principalmente o Partido Comunista da Venezuela (PCV) e os partidos dissidentes da coalizão governamental”, conclui.
De acordo com o estudo, “o processo eleitoral mostrou a persistência de deficiências estruturais, embora as condições eleitorais tenham melhorado em comparação com as três eleições nacionais anteriores”.
Estas deficiências incluem decisões do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) de intervir em vários dos principais partidos da oposição, cujas siglas, cores e nomes foram entregues a militantes expulsos pelos ex-companheiros e acusados de corrupção.