O filho mais velho de Elizabeth II, a monarca que morreu nesta quinta-feira (8), deve ser proclamado rei Charles III no sábado (10) e terá logo no início do seu reinado dois desafios principais: o declínio do apoio à monarquia no Reino Unido entre a população jovem e a manutenção da própria unidade nacional.
Embora o posto de monarca no país seja praticamente cerimonial, o economista Igor Macedo de Lucena, doutorando em relações internacionais na Universidade de Lisboa e membro da Chatham House – The Royal Institute of International Affairs e da Associação Portuguesa de Ciência Política, lembra que a mãe de Charles III soube trabalhar com o primeiro-ministro do início de seu reinado, Winston Churchill, para unir o povo britânico e superar as adversidades do pós-guerra.
“O Reino Unido está passando por um momento de greves, de aumento da inflação, sofre os reflexos de uma guerra, o que vai exigir que decisões sejam tomadas pela nova primeira-ministra [Liz Truss] e com o rei Charles III no trono. Os desafios que são colocados hoje são tão grandes quanto os que Elizabeth II enfrentou”, destaca Lucena.
Além dos problemas econômicos, o Reino Unido enfrenta o risco de uma quebra da unidade nacional: a Escócia quer realizar outro plebiscito de independência em 2023, o que, para Lucena, “poderia abrir espaço para uma reunificação das Irlandas”.
Wilson Maske, professor de história da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), acredita que Charles III seguiria sendo monarca inglês e escocês mesmo que seja aprovada a separação.
“Se a Escócia se tornar independente, voltará uma situação anterior, do reinado de Charles I (1625-1649, julgado, condenado e executado por traição), em que ele era rei simultaneamente da Escócia e da Inglaterra”, explica.
“Não sei que arranjo se daria a essa questão, mas os britânicos têm muita habilidade para resolver esses assuntos em termos aceitáveis, porque devido ao sistema parlamentarista muito sólido, desde que se estabeleceu a monarquia limitada com o Parlamento, em 1688, a Inglaterra não teve mais revoluções, e não por não haver situações de crise social que poderiam levar a isso, mas sim porque o regime parlamentarista criou situações que possibilitaram reformas. Os problemas atuais não ameaçam o Reino Unido e a monarquia, que já enfrentaram momentos mais difíceis, como a Segunda Guerra Mundial”, argumenta.
Embora resolver atribulações políticas e econômicas não seja responsabilidade do monarca do Reino Unido, Maske projeta que um eventual desgaste de Charles III diante dessas questões “vai depender de como ele vai se comportar sobre esses temas”. “Se ele se mantiver obediente a decisões de governo, como a mãe dele fez, não devem influenciar muito”, justifica.
Carisma
Igor Macedo de Lucena acredita que, assim como sua mãe, Charles III não deve interferir em decisões políticas, apesar de seu passado de opinar em questões sociais e ambientais. “Ele sempre teve uma visão política muito grande, mas nos últimos tempos, deixou de opinar por saber que em breve se tornaria rei”, relata.
Elizabeth II era uma figura popular, mas ultimamente nem seu carisma estava sendo suficiente para reverter o desgaste da monarquia junto aos jovens britânicos.
Uma pesquisa do instituto YouGov do ano passado mostrou que 41% dos jovens de 18 a 24 anos achavam que o país deveria ter um chefe de Estado eleito, enquanto apenas 31% gostariam de ver a continuidade da monarquia. Em 2019, 46% da população nessa faixa etária era a favor da monarquia e somente 26% preferia que o Reino Unido tivesse um chefe de Estado eleito.
Charles III terá dificuldades para reverter essa queda: uma pesquisa realizada em julho de 2013, após o nascimento do príncipe George – então terceiro na linha de sucessão -, indicou que os membros da realeza mais populares depois da rainha Elizabeth II eram o príncipe William, sua esposa, Kate, e o príncipe Harry.
Nesta quinta-feira, muitas pessoas nas redes sociais (em grande parte em tom jocoso, é claro) já faziam “campanha” para que William assumisse o trono no lugar do pai. Para Lucena, Charles III não será ajudado pelo fato de que a rainha consorte será Camilla Parker Bowles, com quem o então príncipe teve um caso quando ainda era casado com a princesa Diana e que depois se tornou sua esposa – a opinião pública britânica ficou ao lado da “princesa do povo” quando seu casamento com o herdeiro do trono acabou.
“Em um momento de grande estresse futuro, Charles pode até mesmo ser obrigado a sair de cena e passar a coroa para o filho. Ele não é uma figura carismática e não representa uma renovação da coroa, como representa William”, argumenta o analista.
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