O presidente da Bolívia, Evo Morales, se disse surpreso nesta segunda-feira (31) com o volume do narcotráfico em seu país, e acusou os Estados Unidos de suposto favorecimento aos responsáveis.
A declaração foi feita na véspera da primeira visita oficial a La Paz do secretário adjunto de Estado dos Estados Unidos para o Hemisfério Ocidental, Arturo Valenzuela, num momento de reaproximação entre os norte-americanos e o governo de Morales.
"Não achava que era tão grande o narcotráfico, não achava que o narcotráfico tinha tal poder econômico (...), sinto que se infiltra nos poderes, nas estruturas dos Estados, não só na Bolívia, mas em todo o mundo", disse Morales em discurso num ato militar.
"Vejo que há muita cumplicidade de algumas instituições, de membros da Justiça boliviana, mas também de alguns membros da polícia. Por que essa forma de comprar nossos membros do Estado? Cheguei à conclusão de que é muita 'plata' (dinheiro), o narcotráfico manipula muita 'plata'."
Morales e alguns de seus principais colaboradores costumavam elogiar reiteradamente as políticas de controle antidrogas do país, e asseguravam que a Bolívia - terceiro maior produtor mundial de cocaína, atrás de Colômbia e Peru - não tinha grandes máfias de narcotraficantes.
O presidente citou o vaivém de prisões e libertações do traficante William Rosales, que está desaparecido.
"Quem o libera, um juiz e promotores que recebem apoio econômico ou salários dos Estados Unidos", afirmou Morales, que no fim de 2008 expulsou da Bolívia os agentes do DEA (departamentos antidrogas dos EUA) sob a acusação de ingerência política.
Também em 2008, ele expulsou o embaixador dos EUA, o que iniciou um ciclo de distanciamento diplomático entre EUA e Bolívia, o que a visita de Valenzuela tenta reverter.
No seu discurso, Morales pediu envolvimento dos militares para "nacionalizar" a luta contra o narcotráfico, mas disse que EUA e Europa também têm muito o que fazer por serem o maior destino da droga.
Há na Bolívia cerca de 30 mil hectares de cultivos de coca, sendo metade destinada ao mercado legal. Segundo relatórios recentes, a Bolívia seria cada vez mais uma rota para a cocaína fabricada no Peru e consumida no Brasil e na Europa.
Na semana passada, o pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, afirmou que a Bolívia é cúmplice na entrada de cocaína no Brasil. Segundo o ex-governador de São Paulo, de 80 a 90 por cento da cocaína consumida internamente tem como origem o país vizinho.
"Você acha que poderia entrar toda esta cocaína no Brasil sem que o governo boliviano fizesse pelo menos corpo mole? Acho que não", disse Serra a jornalistas no Rio de Janeiro.