Em um duro discurso contra o ditador Nicolás Maduro, o vice-presidente Hamilton Mourão classificou, nesta segunda-feira (25), o governo chavista como um regime de “privilégios, discriminação e violência, que não respeita o estado de direito”.
Mourão disse ainda que Maduro está à frente de um governo “criminoso” e que o bloqueio à entrada de ajuda humanitária na Venezuela, neste fim de semana, foi uma “violação dos direitos humanos”.
O vice-presidente falou em Bogotá, na Colômbia, onde é realizada a reunião do Grupo de Lima, fórum formado por países das Américas que reconhecem o líder opositor Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela.
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Durante seu pronunciamento, feito todo em espanhol, Mourão rechaçou qualquer apoio do Brasil a uma intervenção militar na Venezuela, como o governo dos Estados Unidos sugeriu em mais de uma ocasião.
Tanto o presidente Donald Trump quanto seu vice, Mike Pence, que participou da reunião em Bogotá, têm afirmado que “todas as opções estão sobre a mesa” no esforço de remover Maduro do poder.
Mourão disse que o governo de Maduro “é uma ameaça” que deve ser enfrentada com a convocação de eleições pela Assembleia Nacional (órgão legislativo controlado pela oposição que funciona em desacato ao chavismo). De acordo com o vice, esse pleito deve contar com a fiscalização de entidades internacionais, como a OEA (Organização dos Estados Americanos).
Pelo Twitter, nesta segunda-feira, Mourão disse que o ingresso de forças armadas estrangeiras em território brasileiro "depende de aprovação do Congresso Nacional e não há intenção de apoio do governo de Jair Bolsonaro para tal possibilidade".
Após a reunião em Bogotá, em entrevista à GloboNews, Mourão falou sobre a busca por uma saída pacífica para a crise da Venezuela. "Seria ruim trazer clima da guerra fria para dentro do continente", disse Mourão ao ser questionado sobre "atores estranhos" novos na região, como a Rússia. "São os outros países, as grandes potências, que têm interesse na Venezuela", disse ele.
Ainda na entrevista, Mourão foi questionado sobre um paralelo em relação ao diálogo entre Donald Trump e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-um, que se encontram esta semana, e a Venezuela. "O diálogo EUA e Coreia do Norte está muito centrado na questão nuclear, uma vez que a Coreia é uma potência nuclear", disse ele, ressaltando que tem dúvidas se Maduro teria interesse em falar com Trump e vice-versa.
“Sem medidas extremas”
O Grupo de Lima é formado por 14 países, dos quais apenas o México não reconhece Guaidó como presidente interino da Venezuela.
Em mais uma sinalização de que o Brasil se opõe a uma operação militarizada na Venezuela, Mourão disse que “é preciso devolver a Venezuela ao convívio democrático, sem medidas extremas”.
O vice-presidente defendeu o emprego de sanções contra o regime chavista. Ele disse que essas sanções precisam ser buscadas nos fóruns internacionais, como a ONU (Organização das Nações Unidas).
Pouco antes da fala de Mourão, Mike Pence anunciou que os EUA vão endurecer ainda mais as penalidades contra altas autoridades da Venezuela e pediu que os países congelem as ações da petroleira PDVSA. Pence também defendeu que as nações aliadas transfiram os ativos do governo venezuelano para Guaidó e restrinjam a emissão de vistos para pessoas próximas a Maduro.
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Em mais uma ofensiva contra Maduro, Mourão criticou a militarização da Venezuela nos últimos anos. “Contrariando a tendência da América do Sul, a Venezuela, sem ter recebido nenhuma ameaça à sua soberania, militarizou parte da sua população com meio de milícias ideologizadas e, desde 2009, adquire equipamentos militares com grande capacidade ofensiva”, declarou o vice.
Ele atacou ainda o regime chavista por ter “atraído atores estranhos à região”, numa referência velada à China e à Rússia. Ele disse que os “grandes patrocinadores do regime são países que têm governos autoritários e totalitários”.
Repressão “vem de paramilitares”
Apenas paramilitares e milícias estão agindo na repressão de civis na Venezuela, e isso indica que os militares venezuelanos não estão dispostos a apoiar a violência, afirmou o chanceler Ernesto Araújo em entrevista nesta segunda-feira, em Bogotá.
O ministro acompanha o vice-presidente, Hamilton Mourão, na reunião do Grupo de Lima para discutir a crise venezuelana.
“Toda a repressão mais brutal que está havendo perto das fronteiras com Colômbia e Brasil vem de grupos paramilitares, milícias, e não do Exército”, disse Araújo a jornalistas. “Isso é um indicativo de que não há disposição das Forças Armadas da Venezuela de amparar essa repressão”.
De acordo com o ministro, o processo de deserções de militares venezuelanos só está começando.
“Já há mais de 100 membros das forças venezuelanas que passaram para o lado de Guaidó, isso será um passo fundamental”, disse, referindo-se ao autoproclamado presidente interino Juan Guaidó, reconhecido pelo Brasil e outros países.
“É um processo que está começando, e toda a pressão diplomática que estamos fazendo vai incentivar que cada vez mais membros das Forças Armadas passem para o lado do Guaidó”.
Os militares brasileiros consideram fundamental que haja uma massa crítica de oficiais desertando para desestabilizar o regime, mais isso ainda não está ocorrendo.
Declaração conjunta
Em declaração divulgada ao final do encontro desta segunda, o Grupo de Lima condenou as ações do regime de Maduro, que “sem considerar o sofrimento da população e os insistentes chamados da comunidade internacional, impediu a entrada de artigos de primeira necessidade e de assistência internacional”, no dia 23.
O Grupo decidiu solicitar ao Tribunal Penal Internacional que leve em consideração “a grave situação humanitária da Venezuela, a violência criminal do regime de Nicolás Maduro contra a população civil e a negação do acesso à assistência internacional, que constituem um crime de lesa-humanidade”, no curso dos procedimentos relacionados à solicitação apresentada em setembro por Argentina, Canadá, Colômbia, Chile, Paraguai e Peru.
Na época, os países assinaram uma carta denunciando o regime de Nicolás Maduro por crimes contra a humanidade e pedindo uma ação da procuradoria do Tribunal Penal Internacional. Em seguida, a ação recebeu o apoio de Costa Rica, França e Alemanha.
Os onze países que participaram do encontro desta segunda-feira também reiteraram o chamado aos membros da Força Armada Nacional a reconhecer Juan Guaidó como presidente encarregado do país.
Saída pacífica
A União Europeia (UE) reiterou nesta segunda-feira seu chamado para que se evite uma intervenção militar na Venezuela e seu compromisso com uma saída "pacífica, política e democrática" para a crise, afirmou a porta-voz da diplomacia europeia.
"Devemos evitar uma intervenção militar", disse Maja Kocijancic. "Precisamos de uma solução pacífica, política e democrática para a crise, que exclua a violência", acrescentou a porta-voz de Federica Mogherini, chefe da diplomacia europeia. "O que a UE quer é a realização de eleições presidenciais livres, transparentes e confiáveis, de acordo com a Constituição venezuelana."
Sobre a missão técnica do grupo de contato que visitou Caracas na semana passada, Maja afirmou que foi possível "falar com todos os atores políticos relevantes", incluindo representantes de vários espectros políticos e também da sociedade civil e de agências da ONU.
"Conversaram sobre as etapas necessárias para a solução da crise, para as eleições e para a ajuda humanitária, respeitando os princípios dessa assistência humanitária", explicou. Ela também disse que na quinta-feira será realizada uma reunião em Bruxelas para definir os próximos passos do grupo de contato.
Sanções americanas
O governo dos Estados Unidos anunciou nesta segunda-feira sanções contra quatro governadores de estados venezuelanos ligados ao governo de Nicolás Maduro, pela obstrução da entrega de ajuda humanitária.
Por nota, o Departamento de Estado disse que "o ilegítimo regime de Maduro impediu que a ajuda humanitária, desesperadamente necessária, entrasse na Venezuela e se envolveu em corrupção em detrimento do povo venezuelano, em alguns casos envolvendo violações de direitos humanos".
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Os governadores sancionados são Omar Prieto (do estado de Zulia), Rafael Lacava (Carabobo), Ramon Carrizalez (Apure) e Jorge Garcia Carneiro (Vargas).
Na nota, o governo dos EUA "reafirma nosso chamado aos funcionários venezuelanos e forças de segurança para permitir que a comida e os remédios entrem e sejam distribuídos pelo país".
"As sanções dos Estados Unidos não precisam ser permanentes, elas pretendem mudar comportamentos", diz o Departamento de Estado. O anúncio ocorre depois da tentativa de entrega humanitária organizada pela oposição neste sábado (23), que foi contida pelas forças de Maduro nas fronteiras com a Colômbia e o Brasil.