Manifestantes voltaram a se reunir na praça Tahrir nesta quarta-feira (3)| Foto: EFE/Mohammed Saber

Centenas de milhares de pessoas se espremem na Praça Tahrir com um desejo comum: a saída do presidente Mohamed Mursi. O protesto já não cabe na praça em si, e toma as ruas do centro do Cairo. Num ponto afastado da praça, em uma rua escura, uma confusão com dezenas de homens chama a atenção. Alguns vão em direção ao tumulto, enquanto outros se afastam, dizendo ser apenas uma briga normal. Não era.

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"Eu vi parte do rosto de uma mulher e o cabelo dela por alguns segundos antes dela ser novamente engolida pelo grupo. Era óbvio que ela estava tentando sair daí", disse Mohamed El-Khateeb, testemunha do ataque, voluntário do grupo Operação Anti Assédio Sexual (OpAntiSH, na sigla em inglês), organização que opera na Praça Tahrir para evitar casos de violência contra mulheres.

Outro grupo carregando bastões chega, atingindo a todos que estão na rua. O real motivo da confusão finalmente fica claro, diz El-Khateeb: uma mulher, jogada no chão. E um homem sobre ela. Grupos continuam se atacando, enquanto outros jovens tentam resgatá-la.

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O que aconteceu com a vítima é um mistério, mas esse foi apenas um dos 91 casos registrados de violência contra mulheres desde domingo (30), o que mancha a manifestação pacífica na Praça Tahrir, onde famílias inteiras se reuniram, incluindo idosos, mulheres e crianças. Num dos casos, a vítima precisou ser operada.

A iniciativa egípcia chamada Operação Anti-Assédio Sexual colocou à disposição das vítimas uma linha de telefone e confirmou que no domingo passado foi o dia que mais recebeu denúncias, com 46 agressões.

"A gravidade dos ataques varia de assédio e agressão sexual ao estupro de mulheres usando facas e objetos pontiagudos", disse, em nota, o OpAntiSH, que classificou a violência como "catastrófica". Nos últimos dois dias, mais relatos de ataques, que incluíram violência contra senhoras, mães com crianças e uma menina de 7 anos.

O assédio contra mulheres não é um problema novo no Egito, mas tornou-se epidemia nos últimos meses, e um fator presente nos protestos. Na Tahrir, a iluminação precária e a ausência de policiais facilitam a ação dos agressores, que também se beneficiam do tumulto dos protestos. Uma van também teria agido nos arredores da praça sequestrando mulheres.

Proteção em área reservada

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Na sexta-feira, uma repórter holandesa foi estuprada por diversos homens enquanto cobria o início dos protestos. Segundo a imprensa local, ela ficou hospitalizada por dois dias e teve de ser submetida a uma cirurgia por conta da gravidade dos ferimentos.

Grupos independentes estão tentando proteger as manifestantes em dias de protestos. Uma grande área em frente ao principal palco da Tahrir foi cercada para que mulheres protestassem e, em diversos pontos da praça, homens protegem regiões com cordas, onde somente manifestantes do sexo feminino podem entrar. Além disso, voluntários identificados fazem rondas, e números de telefones são divulgados para denúncias de ataques.

Os grupos também têm criticado o uso político dos casos de violência contra mulheres. "A Irmandade Muçulmana (governista) atingiu um novo (nível) baixo político por explorar politicamente os casos. A Presidência tem explorado os incidentes para ganho político na mídia", denunciou o OpAntiSH.

"A crescente gravidade de violência sexual contra mulheres manifestantes é um reflexo da violência sexual contra a mulher em geral... o que tem impacto negativo na participação feminina na esfera pública", afirmou o grupo.

Na terça-feira, uma marcha realizada só para mulheres no centro do Cairo reuniu milhares de manifestantes. Sinal de que, apesar da violência, elas também querem se fazer ouvir.

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