Pintura a “A Paz”, do artista russo Alexei Sergienko, mostrando Trump e Putin, em exposição em galeria de São Petersburgo| Foto: EFE/EPA/ANATOLY MALTSEV
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Em março, em dois passos concretos para tentar cumprir a promessa de campanha de acabar com a guerra na Ucrânia, o presidente americano, Donald Trump, conseguiu arrancar da Rússia dois compromissos: um cessar-fogo de 30 dias nos ataques a infraestruturas de energia e uma pausa nos confrontos no Mar Negro.

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Esses esforços pareciam promissores, mas, como uma coisa é o que ditador Vladimir Putin fala e outra coisa bem diferente é o que ele faz, essas negociações travaram.

Na semana passada, no dia seguinte a uma conversa entre representantes russos e americanos na Arábia Saudita, na qual os dois lados combinaram a trégua no Mar Negro, o Kremlin soltou uma nota típica da sua diplomacia escorregadia.

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No comunicado, a Rússia disse que o cessar-fogo estaria condicionado à retirada de sanções contra o país. Também afirmou que a trégua em ataques a infraestruturas de energia entrou em vigor no dia 18, dia em que Putin e Trump conversaram sobre o assunto, apesar de a Ucrânia ter cobrado desde então um documento formal sobre o tema e os dois lados terem se acusado de desrespeito a esse compromisso.

“Eles [russos] já estão tentando distorcer os acordos e enganar nossos mediadores e o mundo inteiro”, disse o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, no dia em que a nota do Kremlin foi divulgada.

Três dias depois, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, disse que os Estados Unidos não poderiam providenciar sozinhos a retirada das sanções contra a Rússia exigida por Moscou.

“É uma série de sanções, incluindo sanções que não são americanas. Eles citaram algumas, elas nem são sanções americanas, então não poderíamos levantá-las nem se quiséssemos”, argumentou Rubio.

No fim de semana passado, Trump manifestou irritação com a atitude russa e ameaçou impor novas sanções a Moscou.

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“Se a Rússia e eu não conseguirmos fazer um acordo para parar o derramamento de sangue na Ucrânia, e se eu achar que foi culpa da Rússia, que pode não ser, mas se eu achar que foi culpa da Rússia, vou colocar tarifas secundárias sobre o petróleo, sobre todo o petróleo que sai da Rússia”, disse Trump em entrevista à NBC News no domingo (30).

“Seria assim, se você comprar petróleo da Rússia, não poderá fazer negócios nos Estados Unidos. Haverá uma tarifa de 25% sobre todo o petróleo, uma tarifa de 25 a 50 pontos percentuais sobre todo o petróleo [russo]”, acrescentou o presidente americano.

Para aumentar a irritação em Washington, nesta terça-feira (1º), Sergei Riabkov, conselheiro de política externa de Putin, disse que a Rússia não pode aceitar as propostas de paz americanas, porque não incluiriam as reivindicações de Moscou – desmilitarização da Ucrânia, compromisso de não entrada do país na Otan, reconhecimento dos territórios ocupados como sendo russos.

“Até onde conseguimos ver, não há lugar nelas [negociações] hoje para nossa principal demanda, ou seja, resolver os problemas relacionados às causas que geraram este conflito”, alegou Riabkov.

Nesta quarta-feira (2), surgiu outra notícia que indica que Putin não estaria de olho em paz tão cedo: a Rússia iniciou o seu maior recrutamento militar em 14 anos, com a convocação de 160 mil homens.

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Putin busca que EUA intermedeie concessões da Europa

Em entrevista à Gazeta do Povo, Victor Missiato, historiador do Instituto Presbiteriano Mackenzie, afirmou que os cessar-fogo combinados entre EUA e Rússia em março são “realmente muito frágeis” e não se cumpriram de imediato.

Embora tenham valor por abrir uma janela de diálogo, são “muito mais significativos em termos diplomáticos do que em termos efetivos”, ponderou.

“O não cumprimento [do cessar-fogo] ou o prolongamento desse conflito irrita demais Trump, que tem uma urgência muito grande em encerrar esses conflitos para colocar os seus interesses novamente num país com aproximadamente 150 milhões de pessoas, que estão deixando de consumir muitos dos produtos americanos”, afirmou Missiato.

Nesse sentido, apontou o analista, a exigência russa de retirada das sanções para negociar indica que Moscou não está necessariamente enrolando Trump, mas tentando fazer o presidente americano intermediar concessões da Europa, até pelo receio do Kremlin diante dos recentes projetos de mais investimentos em defesa anunciados por países do continente.

“Eu imagino que a Rússia irá prolongar os ataques até o momento em que ela se sentir mais segura em relação à posição da Europa no que diz respeito a um possível futuro acordo de paz ou à manutenção ou estabilização das relações político-militares na região”, projetou Missiato.

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“Porque, ao ver a Europa se sentir extremamente ameaçada pela Rússia e se recompor dentro de uma estratégia militar, a Rússia privilegia cada vez mais um novo tipo de acordo para além dos Estados Unidos”, acrescentou o analista.

“A Rússia tem outros objetivos, não só o final desse conflito. O conflito é a ponta do iceberg para os russos diante da sua presença na Europa oriental.”

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]