Nem bem a tinta do acordo assinado com o Irã tinha secado e políticos e executivos europeus já se puseram a caminho do aeroporto para retomar o comércio com um mercado descrito em termos quase frenéticos como “El Dorado”, uma verdadeira bonança.
Só que a provável abertura do Irã implica também em grandes riscos para as empresas e torna ainda mais complicada, em termos diplomáticos, uma nova retirada caso o país decida optar pelo armamento nuclear.
Talvez mais importante ainda seja o fato de os EUA, praticamente só, não se manifestar em termos econômicos. O acordo pouco faz para suspender a série de sanções norte-americanas impostas pelo fato de Washington classificar o Irã como patrocinador do terrorismo e violador de direitos humanos.
Os europeus, bem mais condescendentes, aumentam as chances de divergência entre os EUA e seus aliados em relação aos níveis de investimentos no Irã, o que os faria hesitar em reimpor sanções se o acordo for violado.
“Não é todo dia que surge um mercado grande como esse, com potencial enorme e uma classe média emergente”, reconhece Philip Gordon, que foi coordenador para o Oriente Médio da Casa Branca nos últimos dois anos e agora faz parte do Conselho de Relações Exteriores.
Mas alerta: “Os países vão ter que respirar fundo antes de voltar ao Irã.”
Nenhuma sanção foi suspensa ainda, o que deve acontecer somente daqui a seis meses – mas os europeus decidiram que há mais prós do que contras e não perderam tempo, já preparando o terreno para a reabertura de um mercado raro de 75 milhões de pessoas que sempre foi muito valorizado antes de a Europa se unir às sanções contra o Irã, em 2012.
Em 2011, por exemplo, a União Europeia importou 17 bilhões de euros, ou US$18,7 bilhões, em produtos iranianos e exportou 10,5 bilhões segundo o Diretório Geral de Comércio do bloco.
“Os europeus fizeram a lição de casa. Politicamente, não houve congelamento diplomático entre os países europeus e o Irã”, afirma Ellie Geranmayeh, do Conselho Europeu de Relações Exteriores.
“Há 35 anos temos uma base de contato naquele país. Ninguém reinventou a roda”, acrescentou, irônica.
Algumas sanções norte-americanas serão suspensas por causa do acordo nuclear, sim, mas as mais importantes são conhecidas como “secundárias”, isto é, as penalidades impostas às entidades estrangeiras que fizerem negócios com o Irã.
Essas são usadas para multar os bancos, incluindo o BNP Paribas, instituição francesa que teve que pagar US$8,9 bilhões, em junho de 2014, por conduzir transações consideradas proibidas com o Irã, o Sudão e Cuba.
Fereydoun Khavand, professor francês-iraniano de Economia e Direito da L’Université Paris Descartes, diz que a prioridade dos iranianos é modernizar sua indústria petrolífera, usando para isso até US$185 bilhões em novos investimentos.
Outros setores de desenvolvimento são o petroquímico e o turismo. De acordo com vários especialistas, o Irã já está negociando com a Accor, cadeia de hotéis francesa, entre outras, a construção de novas filiais.
A Peugeot, uma das principais montadoras da França, confirmou as discussões adiantadas com uma parceira da época pré-sanção: a iraniana Khodro, para a produção de carros com transferência de tecnologia francesa. Antes das restrições econômicas, o Irã era o segundo maior mercado internacional da companhia.
A SEB, fabricante de eletrodomésticos francesa, há um ano está engajada em negociações e só espera a confirmação do acordo, explica o vice-presidente executivo Frédéric Verwaerde.
A companhia, ativa no Irã desde a década de 50, chegou a render 50 milhões de euros anuais naquele país, antes das sanções. “O Irã pode chegar ao tamanho da Turquia ou da Espanha como mercado de produtos domésticos”, observa ele, acrescentando que sua classe média, relativamente grande, é composta por mulheres de escolaridade alta que querem marcas europeias de alta qualidade e têm como tradição receber convidados.
Na Alemanha, a petroquímica BASF e a gigante industrial Siemens – que ajudou a construir uma das primeiras ferrovias iranianas, nos anos 20 e 30 – já pensam em voltar. O mesmo vale para a ThyssenKrupp, conglomerado alemão de aço e maquinário que tinha feito negócios durante trinta anos antes de as sanções entrarem em vigor.
Petrolíferas como Total, Royal Dutch Shell e British Petroleum também querem voltar, mas estão avaliando se o potencial de ganho supera as incertezas futuras, como explica Harry Tchilinguirian, executivo do BNP Paribas.
“O que se vê no momento é a diplomacia corporativa petrolífera, o que não significa uma decisão imediata”, afirma.
Colaboraram Elisabetta Povoledo, Katarina Johannsen e Elian Peltier