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Açoreanos atendem chamado da ilha

Muitos açorianos que imigraram para a América do Norte voltam para a terra natal para participar da procissão e Santo Cristo dos Milagres, em Ponta Delgada | Patricia de Melo Moreira/The New York Times
Muitos açorianos que imigraram para a América do Norte voltam para a terra natal para participar da procissão e Santo Cristo dos Milagres, em Ponta Delgada (Foto: Patricia de Melo Moreira/The New York Times)

Antes da procissão religiosa que é realizada aqui, uma estátua de madeira do Santo Cristo dos Milagres ganhou uma capa nova, mas com um detalhe que não tem nada de português: os apliques no formato das folhas de bordo canadense que se misturavam ao bordado.

Mais do que apenas uma oferenda para a festa mais importante da ilha, o detalhe é um lembrete da influência e da distância da diáspora que partiu desse arquipélago no Atlântico e se concentrou nos EUA e no Canadá, cujos laços com a terra natal permanecem essenciais, mesmo depois de várias gerações.

Cerca de um milhão de norte-americanos nasceram nos Açores ou descendem de açorianos – ou seja, quatro vezes a população atual das ilhas. Todo ano, milhares de pessoas com laços na maior delas, São Miguel, retornam para um dia de festa em maio e para dar graças ao Cristo dos Milagres.

“Essa é a festa que simboliza as dificuldades das ilhas que deixaram para trás e a oportunidade de agradecer por terem conseguido completar a viagem”, diz Mario Silva, doador da capa, que foi o primeiro português a se tornar membro do Parlamento Canadense.

Os açoreanos deixaram o arquipélago em diferentes levas; no século XIX, os baleeiros da Nova Inglaterra começaram a recrutá-los para trabalhar em seus navios – e não demorou muito para que se contaminassem com a febre do ouro.

Em 1958, depois de uma erupção vulcânica em Faial, John F. Kennedy, na época senador, batalhou para que a Lei do Refugiado Açoreano entrasse em vigor, o que deu a oportunidade a milhares de pessoas de entrar nos EUA. O Canadá tinha aprovado uma legislação semelhante em 1953.

Para Daniel Da Ponte, senador estadual por Rhode Island, descendente de açoreanos, muitos imigrantes continuaram mais ligados às tradições das ilhas que os próprios ilhéus, como prova a devoção dos expatriados às festas religiosas mais importantes e a disposição em fazer viagens regulares aos Açores.

“Esse pessoal reza com uma disciplina que não se vê mais atualmente”, completa ele.

A liberação recente do tráfego aéreo em Portugal permitiu que a Ryanair e outras companhias aéreas de baixo custo fizessem crescer o volume de turistas europeus para as ilhas. Já cidades como Toronto, Montreal, Boston e Oakland há tempos têm voos diretos para os Açores. Os EUA têm uma base aérea em Terceira.

Frank Monteiro, ex-sargento da polícia canadense, conta que o pai, um carpinteiro, levou a família para o Canadá para evitar que os três filhos fossem convocados pelo Exército português para combater na África.

Monteiro diz que voltou para agradecer ao Cristo por se aposentar “inteiro, sem nenhuma marca de bala no corpo”.

Mesmo que a maioria dos imigrantes diga que a América do Norte lhes deu a chance de melhorar de vida, alguns reconhecem que a experiência que tinham não era suficiente.

“Saí da ilha mais porque quis ajudar o pessoal da família, nem tanto por mim mesma”, confessa Gloria Sousa, que se mudou, nos anos 60, com o marido, para New Bedford, em Massachusetts, e conseguiu um emprego “bem pesado” em uma confecção. “Não sabia o que era hora extra até ir para os EUA”.

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