O extremo norte dos EUA zela por sua imagem de natureza virgem e vasta paisagem.
No entanto, as cerca de 600 instalações militares em todo o Estado do Alasca —algumas datam da Segunda Guerra Mundial, outras foram construídas durante a Guerra Fria— contam uma história diferente.
Bases e postos de escuta espalhados por todo o Estado usaram ou armazenaram solventes e pesticidas, agentes de guerra química e munição não explodida —e alguns nunca foram limpos.
Um desses locais, uma estação de radar de 2.000 hectares chamada Northeast Cape, estava cheio de componentes elétricos contendo bifenilos policlorados, conhecidos como PCBs, que mais tarde foram relacionados ao câncer. Pequenos peixes que vivem no rio próximo ao local, que são comidos por aves e peixes maiores que os moradores da ilha usam como alimento, estão carregados de PCBs, segundo estudos. Os níveis de PCB nos moradores são várias vezes mais altos que na maior parte dos EUA.
O que aconteceu na época era segredo. “Eles trouxeram todos aqueles barris e os enterraram”, disse Eugene Toolie, 77, morador que estava lá nos anos 1970 durante a desmobilização da base.
No entanto, em lugares como esta ilha no mar de Bering, com uma população de apenas 1.500 pessoas, as dificuldades de residentes como Vi Waghiyi estão tão escondidas hoje quanto na época em que as tropas do antigo Comando de Defesa Aérea desembarcaram nos anos 1950.
“Nós éramos os olhos e ouvidos do mundo, e nos orgulhamos disso, mas hoje estamos em crise”, disse a senhora Waghiyi, 56. Cinco pessoas de sua família foram diagnosticadas com câncer.
Pesquisadores e residentes não culpam os militares por tudo. Como em outras comunidades nativas americanas, o uso de álcool e tabaco e o acesso limitado ao atendimento médico complicam o quadro. Além disso, alimentos como leões-marinhos e baleias também expõem os moradores a substâncias tóxicas, porque esses animais comem peixes e plantas contaminados com poluentes que vazaram em outros locais.
Nos últimos anos, o Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA gastou mais de US$ 110 milhões para limpar o Northeast Cape. Mas seus efeitos continuam lá.
De certa maneira, uma equipe de cientistas que veio em junho estudar a poluição investiga segredos ocultos à plena vista: os peixes que abundam no rio perto da antiga base. Se os peixes tiverem se adaptado geneticamente aos produtos tóxicos, poderia haver aí uma lição para a população?
Enquanto os pesquisadores prosseguem em seu trabalho, as substâncias tóxicas continuam chegando. Por meio de um truque perverso da corrente de jato global, a jet stream, locais em todo o extremo norte, como São Lourenço, também são depósitos de poluentes aéreos vindos de áreas industriais do mundo todo. “Não há uma imagem clara”, disse David O. Carpenter, da Universidade Estadual de Nova York em Albany, que está realizando um projeto de pesquisa de saúde em São Lourenço. “Mais difícil ainda é descobrir o que podemos fazer a respeito.”
A única certeza, disse Waghiyi, é que eles terão de enfrentar opções difíceis. Se as substâncias químicas que causam câncer de fato vêm do mar, disse, então a dieta que sustentou as pessoas aqui por milhares de anos não é mais viável. “Nossos alimentos tradicionais estão matando as pessoas. Mas, sem nossos alimentos, nós morremos como cultura.”