Uma mulher na Cidade do Cabo opera seu restaurante à luz de velas durante um apagão| Foto: Nic Bothma/EPA

No estacionamento escuro e frio de um shopping center, uma família de classe média tomava um lanche em um passeio de sexta-feira. Depois de encontrar sua lanchonete preferida fechada por causa de um corte de eletricidade, Buhle Ngwenya, com seus dois filhos e dois sobrinhos, decidiu comer empadas de carne em uma das poucas lojas abertas no shopping.

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“É como a morte, essa divisão de potência”, disse Ngwenya, 45, referindo-se aos apagões impostos pela companhia de energia elétrica da África do Sul para evitar o colapso da rede.

Apesar de uma década de forte expansão econômica, a África subsaariana ainda está muito atrasada em sua capacidade de gerar eletricidade, algo fundamental para seu futuro.

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O Banco Mundial estima que somente os apagões cortam o PIB dos países subsaarianos em 2,1%. A capacidade de geração elétrica da região é menor que a da Coreia do Sul, e um quarto dela é improdutiva a qualquer momento por causa da infraestrutura envelhecida do continente.

A situação causa revolta entre os eleitores. Especialistas dizem que a nomeação de autoridades com ligações políticas e pouca experiência no setor para a companhia estatal sul-africana, Eskom, levou a erros administrativos.

A África do Sul, que possui a única usina de energia nuclear do continente, tem aproximadamente a metade da capacidade de geração da África subsaariana, cerca de 44 gigawatts. Os cortes de energia contribuíram para uma recente queda no crescimento econômico e um aumento do desemprego no país, que chega a 26,4%, o pior nível em cerca de 12 anos.

Na Nigéria, a maior economia do continente, a rede elétrica fornece tão pouca energia que o país funciona principalmente com geradores particulares. Quando houve escassez de combustível, nesta primavera, uma crise nacional se seguiu, interrompendo o serviço de telefonia celular, fechando temporariamente agências bancárias e deixando aviões estacionados.

A demanda por eletricidade na África tornou-se uma questão internacional. A China tomou a dianteira no financiamento de muitos projetos de eletricidade em todo o continente. Companhias da Ásia, dos Estados Unidos e da Europa também estão fornecendo eletricidade para um número crescente de países. No entanto, ainda levará décadas para que a África subsaariana tenha acesso universal à energia elétrica.

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Os líderes nigerianos prometeram uma oferta de eletricidade estável desde o fim do regime militar em 1999, gastando cerca de US$ 20 bilhões e desmontando a Autoridade Nacional de Energia Elétrica, conhecida pela sigla NEPA [em inglês] e amplamente chamada de “Never Expect Power Always” [nunca espere eletricidade sempre].

A capacidade de geração do país permaneceu virtualmente a mesma, cerca de 6 gigawatts para um país de 170 milhões de habitantes. Os Estados Unidos, com 320 milhões, tem uma capacidade de mais de mil gigawatts.

A maior parte dos US$ 20 bilhões gastos para reformar o setor elétrico teria ido para os bolsos de autoridades corruptas, segundo Akpan H. Ekpo, do Instituto Africano-Ocidental para Administração Financeira e Econômica, em Lagos, a capital comercial da Nigéria. “Em alguns bairros de classe média em Lagos, as pessoas têm sorte quando conseguem 30 minutos de energia por dia.”

Na África do Sul, nos últimos anos do apartheid, a eletricidade era confiável, mas alcançava apenas um terço das residências do país, poucas delas de famílias negras. Sob o Congresso Nacional Africano, cujos líderes governaram desde então, 85% dos lares hoje têm eletricidade, realização notável sob qualquer critério.

Porém, especialistas em energia dizem que essas famílias, muitas delas de baixa renda, consomem pouca eletricidade. Os apagões, segundo eles, são consequência das frequentes rupturas nas usinas envelhecidas e, de modo mais crítico, do atraso na construção de duas novas instalações.

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Já em 1998, um relatório do governo advertiu que, sem mais capacidade, o país enfrentaria séria escassez de eletricidade em 2007.

Um ano depois, a África do Sul sofreu seus primeiros grandes apagões. Esses afetaram todo mundo, incluindo as gigantes companhias de mineração, pequenas empresas e indivíduos.

No topo da lista de downloads de aplicativos na África do Sul, estão os que alertam os usuários de smartphones para o início iminente ou o risco de um corte em seu bairro, conforme aumenta a divisão de potência por todo o país.

Para Ngwenya, que comia empadas com a família no estacionamento do shopping, a situação não tem a ver apenas com eletricidade. Ela acusou o Congresso Nacional Africano, partido que libertou a África do Sul e conduziu seu rumo desde então. “Eu sempre apoiei o CNA”, disse. “Mas, quando se trata de divisão de potência, não sei. Não é normal chegar a um shopping carregando uma lanterna, como aquele homem aí”, disse, apontando para outro consumidor mergulhado na escuridão.