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Arquipélago cubano concentra riqueza marítima

Pesquisa em área de proteção ao largo da costa sul de Cuba pode ajudar na formulação de estratégias de conservação em outras regiões | Todd Heisler/The New York Times
Pesquisa em área de proteção ao largo da costa sul de Cuba pode ajudar na formulação de estratégias de conservação em outras regiões (Foto: Todd Heisler/The New York Times)

O tubarão bico-fino, de 1,8 metro, saiu da água se debatendo. Rapidamente, Fabián Pina Amargós e sua tripulação o puxaram para o barco.

A equipe começou a trabalhar, imobilizando a boca e a cauda do animal, despejando água sobre ele para permitir que continuasse respirando e inserindo uma pequena etiqueta plástica amarela em um buraco perfurado em sua barbatana dorsal. Depois, a equipe o lançou de volta ao oceano.

Biólogo marinho e diretor do Centro de Investigaciones de Ecosistemas Costeros de Cuba (Ciec), Pina dedicou grande parte de sua carreira a pesquisar peixes e outras formas de vida marinha no arquipélago de Jardines de la Reina, a 80 quilômetros da costa sul de Cuba, região conhecida como as Galápagos do Caribe.

Pina fez sua primeira pesquisa oceânica em Jardines de la Reina depois que o governo cubano estabeleceu uma reserva marinha de 950 km2 na área, em 1996, restringindo o turismo e proibindo a pesca, exceto a de lagostas, parte importante da economia cubana. Mais tarde, as pesquisas do Ciec impulsionaram a criação, em 2010, de uma área de proteção de 2.150 km2 que incluía a reserva de 1996 .

Pina tem uma longa lista de questões com as quais gostaria de trabalhar. Por exemplo, ele está ansioso para aprender mais sobre a biologia, o padrão de deslocamento e os hábitos dos tubarões e das garoupas-gigantes, grandes e importantes predadores para os recifes de coral. Além disso, ele espera um dia compreender por que os recifes de Jardines de la Reina resistiram enquanto outros do planeta sucumbiram à pesca excessiva, à poluição, ao desenvolvimento costeiro e aos efeitos da mudança no clima.

Cientistas como Pina mal começaram a explorar e documentar a riqueza da vida aquática nas águas do arquipélago e do golfo de Ana Maria, ao norte. Ainda são desconhecidos, por exemplo, o número de espécies existentes nesses locais, o tamanho das populações, como elas se movimentam de uma a outra área, onde elas fazem suas desovas e onde seus filhotes nascem.

São dados essenciais, dizem os cientistas, para desenvolver estratégias de conservação da fauna marinha em um país no qual a pesca predatória causou dificuldades consideráveis. Além disso, o que os cientistas aprenderam com o Jardines de la Reina pode ajudar a resgatar e a proteger recifes em outras regiões.

Pina teve sorte, recebendo verbas e equipamentos de fundações como o Pew Charitable Trust e organizações ambientais como o Environmental Defense Fund. Porém, conduzir pesquisas marítimas em Cuba não é fácil. O país só tem duas embarcações de pesquisa importantes: o Itajara, de nove metros, e outro barco pertencente à Universidade de Havana.

Microscópios, equipamentos de pesca —como redes e ganchos—, refrigeradores para armazenagem, câmeras e sistemas de GPS são escassos. Mesmo necessidades corriqueiras, como cordas, passam por racionamento e requerem reparos constantes.

“O bloqueio, aquilo que vocês chamam de embargo, teve imenso impacto, especialmente sobre a ciência ambiental”, afirma Pina. Ele espera que a retomada das relações entre Cuba e os EUA estimule a colaboração científica, passo crítico para dois países cujos ecossistemas têm estreita conexão —os sucessos ou fracassos ambientais de um afetam a saúde e a produtividade do outro.

“Nossos dois países são conectados pela água, e os peixes e outros organismos se movimentam livremente por ela”, disse Jorge Angulo-Valdés, cientista no Centro de Pesquisa Marinha da Universidade de Havana. “Eles não precisam de vistos”.

“Quando você tem duas áreas a 145 quilômetros de distância, não é só possível como provável que número considerável de ovas e larvas se movimentem entre os recifes de Cuba e os dos EUA”, diz Jake Kritzer, especialista em questões oceânicas e de fauna marinha no Environmental Defense Fund, se referindo à distância que separa Miami de Cuba.

“Aquilo que fizermos para administrar a população de peixes nos recifes cubanos poderá ter efeitos sobre a abundância de diferentes populações nos recifes dos EUA, e vice-versa.”

Os visitantes de Jardines de la Reina se impressionam com o grande número de tubarões dali. Os animais ocasionalmente se aproximam dos mergulhadores para olhá-los de mais perto.

Em dois dos muitos pontos de mergulho do arquipélago, os tubarões são alimentados para garantir que seu número continue alto, mas, para os cientistas, a presença deles indica a robustez do recife. Pesquisas vinculam a saúde dos recifes à sua habitação por peixes de grande porte. A ausência de tubarões e de outros grandes predadores é muitas vezes um sinal de declínio.

“Se você gosta de recifes de coral, precisa gostar de tubarões”, disse David Guggenheim, cientista marinho. “Sem eles, o recife pode ser tomado por algas e sufocado”.

A resistência do Jardines de la Reina é evidente. As águas da reserva abrigam dez vezes mais tubarões do que a zona externa, diz Pina, e garoupas-gigantes, raras em outras áreas, são vistas com frequência por ali.

O isolamento, segundo cientistas, provavelmente responde por parte da força do recife. A genética também pode ter seu papel.

No entanto, o local nem sempre foi saudável. Ele se recuperou e prosperou a partir do estabelecimento da reserva marinha em 1996. Pina e seus colegas constataram que as populações de peixes cresceram em média 30% desde a criação do santuário.

Ainda assim, a reserva sozinha não basta para garantir a proteção dos predadores de grande porte, que são capazes de percorrer longas distâncias, que vão além das áreas protegidas. Ainda que a pesca seja proibida na reserva marinha de 1996, ela ainda é autorizada no restante da área criada em 2010.

Pesquisas sobre o tamanho, o número e a localização dos tubarões poderão no futuro ajudar Cuba a desenvolver estratégias para reduzir a pesca excessiva.

O país está desenvolvendo um plano nacional para os tubarões —que, com outros peixes de grande porte, impulsionam o turismo na região. O setor é importante para a reserva marinha e para a economia cubana. O Jardines de la Reina está entre os 50 principais pontos de mergulho do planeta, e 60% dos mergulhadores mencionam seus tubarões como principal atração, diz Pina. Isso, segundo o pesquisador, é um incentivo para manter a proibição à pesca em vigor.

As garoupas-gigantes, que podem pesar até 450 quilos, também chamam a atenção. “Todo mundo gosta de grandes animais”, disse Pina, “e a garoupa-gigante é como o elefante do mar”.

No entanto, o turismo traz suas próprias ameaças. No ano passado, menos de 3.000 mergulhadores e pescadores recreativos visitaram Jardines de la Reina, mas esse número tende a aumentar rapidamente.

A capacidade de fiscalização cubana é limitada, e um recife de coral é um ecossistema sensível, facilmente danificado pelas âncoras dos barcos visitantes ou por mergulhadores descuidados.

Se 10 mil ou, quem sabe, um milhão de visitantes chegarem à reserva marinha, disse Pina, “o efeito deles sobre a natureza será imenso”.

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