Abdul Rashid Dostum segue as regras da hospitalidade afegã, chegando a alimentar 4 mil pessoas por dia. Seu cozinheiro, Abdul Manan.| Foto: Farshad Usyan/Getty Images

Há uma verdade incontestável na política afegã que reza que a influência se conquista de estômago em estômago.

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Reuniões eleitorais, comícios e protestos não atraem multidões se não houver a promessa de travessas imensas de pilaf – e quanto mais gorduroso, melhor. Os políticos podem até não cumprir as promessas de campanha, mas pelo menos seus correligionários foram alimentados.

A ascensão do vice-presidente Abdul Rashid Dostum ao alto escalão do governo nacional está longe de ser tradicional: acusações de crime de guerra o perseguem há décadas e seu passado como chefe guerreiro faz dele o ponto fraco da liderança nacional aos olhos de muita gente – mas, ao mesmo tempo em que vem crescendo o número de tecnocratas de estilo ocidental em Cabul hoje em dia, o General Dostum se mantém em voga como símbolo da hospitalidade afegã à moda antiga.

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No norte, região do país onde nasceu e vive, a política exige sempre um toque pessoal – além dos muitos panelões de arroz com carne. Com o passar dos anos, reunir centenas de convidados de uma só vez virou rotina.

Em 2014, enquanto o general fazia campanha ao lado de Ashraf Ghani em Jowzjan – sua província natal e centro de sua etnia uzbeque –, houve dias em que chegou a alimentar mais de quatro mil pessoas em seu palácio rosa de Sheberghan, como contam seus assessores.

“Tinha gente sentada no telhado, no quintal, no jardim. E usamos todas elas para cozinhar arroz para o pessoal”, conta Ghayeb Nazar, chefe de logística da cozinha de Dostum, apontando para dezenas de panelas imensas, que comportam 40 kg de arroz cada.

A cozinha é administrada por Abdul Manan. Uma vez que as reuniões eleitorais já passaram, ele pode relaxar um pouco: um almoço “comum” agora só exige 57 kg de arroz e 30 kg de carne. O clima, porém, se tornou mais tenso, pois o Talibã vem fazendo incursões no território do general, que prometeu reunir seus antigos chefes milicianos para combater o grupo.

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A última lista de convidados incluiu sua unidade, composta de quase 400 seguranças e comandantes que foram lhe render homenagens e mostrar respeito.

Manan leva uma hora só para servir a refeição – em pratos, tigelas e até baldes. Serve soldados, vizinhos necessitados que pedem aos filhos para buscar a comida e funcionários do partido.

Ao longo dos anos, a hospitalidade do general se estendeu também a convidados um tanto peculiares: em 2008, foi acusado de mandar seus assessores abduzirem um adversário político em Cabul e levá-lo à mansão que tinha acabado de construir. Ali o homem teria sido torturado, como parte de uma conspiração política, acusação que Dostum sempre negou.

Alguns de seus convidados mais interessantes foram alguns membros mais velhos do Talibã – e o general não ficou nem um pouco satisfeito por eles, mais tarde, terem criticado sua hospitalidade, reclamando de torturas e mortes.

“Eles engordaram aqui. E coloquei todos em quartos muito bons”, rebate Dostum.

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Embora os assessores se recusem a revelar quanto custa essa tradição de hospitalidade, fica claro que esse tipo de política se baseia em muito dinheiro. O general menciona os pagamentos à vista que os EUA lhe fizeram nas primeiras semanas da invasão.

“Eles me davam US$50 mil a cada quinze, vinte dias.”

“No total, o que recebi não passou de US$400 mil, mas chego a gastar isso em um dia”, afirma, rindo.