Nina Simone, em imagem de 1968, continua a ser relevante para a música e o ativismo político contemporâneos| Foto: Getty Images

A escritora feminista Germaine Greer disse certa vez: “Cada nova geração precisa descobrir Nina Simone. Ela é a prova de que o gênio feminino é real.”

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Só neste ano, Nina Simone serviu de inspiração para três filmes e um álbum de homenagem cheio de nomes famosos. Tudo isso acontece ao cabo de um ressurgimento que já dura uma década e que incluiu duas biografias, uma coletânea de poemas, várias peças e o sampling de sua comovente voz por diversos artistas de hip-hop.

Cinquenta anos após sua fase áurea em vida, Nina Simone está chegando ao topo.

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O documentário “What Happened, Miss Simone?”, dirigido por Liz Garbus e transmitido pelo Netflix, explora a fusão heterodoxa da voz profunda e rouca de Simone a diversos estilos musicais. assim como seu ativismo na luta pelos direitos civis.

Nina Simone ampliou os parâmetros das grandes artistas pop americanas. “Como é possível ser artista e não refletir os tempos em que se vive?” pergunta Nina no filme. Em “What Happened...”, Simone emerge como uma cantora cuja busca incansável pela liberdade musical e política é determinante da atração que ela exerce hoje.

Vários fatores explicam o ressurgimento da cantora. A denúncia lírica de Nina sobre a segregação racial a conecta com a contemporaneidade, por exemplo. Além disso, as pessoas que lhe eram mais próximas passaram a se sentir mais à vontade em contar sua história após sua morte, em 2003.

A cantora e atriz Lisa Simone Kelly, filha de Nina, compartilhou com Garbus diários, correspondências e gravações em áudio e vídeo de sua mãe.

Nos últimos dez anos, o mercado foi inundado por relançamentos de álbuns de Nina Simone e por entrevistas e canções até então inéditas. Porém, nos últimos 25 anos, também houve uma sequência espantosa de processos judiciais disputando os direitos sobre as gravações originais da cantora.

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A maior controvérsia em torno do legado da cantora envolve a cinebiografia “Nina”, de Cynthia Mort, prevista para chegar aos cinemas neste ano. Com Zoe Saldana no papel-título, o filme foi alvo de críticas pela escolha do elenco. A hostilidade foi intensificada após fotos vazadas da produção mostrarem Saldana com a pele artificialmente escurecida e com uma prótese nasal.

Nascida em 1933 com o nome Eunice Waymon, Nina cresceu na Carolina do Norte racialmente segregada. Aos três anos, já tocava hinos gospel ao piano, acompanhando o coral de sua igreja. Quando tinha oito, o patrão branco de sua mãe ofereceu pagar aulas de música clássica para ela. Nina estudou na escola Juilliard de música, em Nova York, por um ano, e depois tentou ir para o Instituto Curtis de Música, na Filadélfia, onde foi barrada.

Ela mudou seu nome para Nina Simone e começou a se apresentar em boates, adotando standards de jazz em seu repertório.

“I Loves You, Porgy”, de 1959, foi sua única canção a entrar para os Top 40 da parada de sucessos. Para beneficiar sua carreira musical, Nina voltou a viver em Nova York, onde fez amizade com os ativistas e escritores Lorraine Hansberry, James Baldwin, Langston Hughes e Malcom X.

Em 1964, ela compôs “Mississippi Goddam”, em resposta ao assassinato do líder dos direitos civis Medgar Evers e de quatro garotas afro-americanas em uma igreja de Birmingham, Alabama, um ano antes.

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Apesar de ter sido bissexual, seu romance mais duradouro foi o turbulento casamento com o ex-policial Andy Stroud, que durou 11 anos. Nina Simone sofria de “oscilações de humor” que apenas 20 anos mais tarde seriam diagnosticadas como transtorno bipolar. Nesse meio tempo, ela abandonou seu casamento e seu país, indo viver na Libéria, na Suíça e na França, onde morreu.

Sua voz andrógina, sua musicalidade que transcendia gêneros e sua consciência política aguçada atraem artistas gays, lésbicas, mulheres e negros de hoje que querem ser levados a sério por seu talento, seu ativismo ou as duas coisas.

“Nina nunca deixou de ser relevante, porque seu ativismo era único”, disse Garbus. “Mas por que ela voltou à tona agora?”

Respondendo à sua própria pergunta, a diretora observou que muito pouco mudou desde a época de Nina Simone. Um exemplo, segundo ela, são os protestos pelas morte de afro-americanos desarmados cometidas por policiais brancos.