| Foto: Mark Pernice/The New York Times

Em junho, quando o bilionário Johann Rupert fez um discurso na “cúpula do luxo” organizada pelo Financial Times em Mônaco, parecia mais um teórico marxista do que alguém que fez fortuna vendendo diamantes Cartier e canetas Montblanc. Falando para um público de executivos de empresas como Fendi e Ferrari, Rupert afirmou que não era correto — e nem mesmo producente — os ultrarricos se locupletarem com os recursos do mundo.

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“Além de injusto, é insustentável”, afirmou. Políticos populistas e intelectuais liberais vêm criticando a desigualdade há tempos, mas agora a questão passou a ser abordada por um grupo, no mínimo, improvável: um seleto grupo de bilionários.

Em março, o investidor Paul Tudor Jones II, cuja fortuna pessoal está calculada em torno de US$5 bilhões, disse em uma conferência TED que, historicamente, as desigualdades extremas de renda foram resolvidas de três maneiras: com impostos, guerras e revolução.

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Alguns meses antes, o magnata do ramo imobiliário Jeff Greene, sugeriu que os ultrarricos deveriam pagar mais impostos para restaurar o que chamou de “economia inclusiva de sua infância”.

E Nick Hanauer, bilionário da tecnologia de Seattle, se meteu em polêmica ao falar aos “zilionários” do planeta, no ano passado, para o site Politico: “Tenho um recado aos meus colegas ricaços, aqueles que, como eu, vivem em um mundinho protegido: ‘Acorde, pessoal. Isso tudo não vai durar’”.

O que está acontecendo? Será que todos esses bambambãs estão mesmo dispostos a nivelar as coisas? Ou, quem sabe, seja só um fenômeno estatístico irrisório, já que a maioria dos 1.800 bilionários do mundo não quer saber de promover mudanças econômicas?

Segundo Chrystia Freeland, autora do livro “Plutocrats: The Rise of the New Global Super Rich and the Fall of Everyone Else” (“Plutocratas: A Ascensão dos Novos Superricos e a Queda Do Resto do Mundo”) de 2012, o fenômeno de conscientização social dos mais ricos é significativo. “Depois da publicação do meu livro, alguns deles chegaram até a me procurar, em particular, para admitir que o sistema não está dando muito certo”, diz ela.

Chrystia, que também é membro do Partido Liberal no Parlamento Canadense, falou sobre a chamada Conferência sobre o Capitalismo Inclusivo, organizada em Londres, no ano passado, por Lynn Forester de Rothschild, membro do tradicional clã de banqueiros. O objetivo do encontro era reorientar os superricos em relação a projetos voltados para a população.

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Financistas como Warren E. Buffett já trilharam esse caminho, com grande alarde, mas agora que outros passaram a fazer o mesmo mudou o tom da conversa, afirma Darrell M. West, do Instituto Brookings de Washington.

“Quando gente humilde reclama da desigualdade, ninguém liga porque é considerado luta de classes, mas quando a voz é dos bilionários, o problema é redefinido”, diz ele.

O que não significa que os ricaços tenham motivos puramente altruístas. “Há críticas intensas a essas diferenças e alguns superricos se sentiram na obrigação de se manifestar”, prossegue.

E acrescenta: “Há uma percepção entre os bilionários de que seria benéfico a eles próprios pelo menos permitir que parte de suas fortunas circule por aí”.

É claro que pode ser muito possível que alguns desses biliardários estejam fazendo politicagem. “Não me surpreendo em ouvir esse discurso dos mais ricos, mas falar é fácil. Esse pessoal sabe exatamente como manipular o poder, então até que alguma coisa aconteça de verdade, tudo não passa só de discurso vazio”, afirma Dennis Kelleher da Better Markets, que defende a reforma financeira.

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Para William D. Cohan, ex-corretor de Wall Street, a maioria dos bilionários pode resolver a questão da desigualdade doando parte de suas fortunas, mas não querem mudanças no sistema econômico. “Caridade podem até fazer, mas igualizar as coisas? Não mesmo”.

E, no entanto, os extremamente ricos correm um risco permanente ao manter o atual estado de coisas, pois os miseráveis podem um dia perder a paciência e virar a mesa.

“Há um perigo muito real de ser repetirem coisinhas pequenas como a chamada Revolução Francesa”, ironiza Cohan.