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Mulheres de Mianmar garantem que a pasta da árvore thanakha acaba com a acne e reduz os danos do sol | Justin Mott para The New York Times
Mulheres de Mianmar garantem que a pasta da árvore thanakha acaba com a acne e reduz os danos do sol| Foto: Justin Mott para The New York Times

Embora a camelô Than Than Aye tenha 50 anos, praticamente não tem rugas. O segredo? Uma pasta amarelada feita da casca de árvore moída que ela aplica nas bochechas, nariz e no pescoço após o banho da manhã e antes de ir para a cama, à noite.

Conhecido como thanakha e famoso por proteger e embelezar a pele, o creme está no rosto de todas as birmanesas assim como os sarongues coloridos, ou lungies, se encontram amarrados às suas cinturas.

"A vida inteira usei thanakha e vou continuar até morrer", diz Than Than Aye, ao lado do carrinho lotado de esmaltes, pentes e produtos de beleza que leva para vender em uma feira bem movimentada. Ritual e remédio, o preparado refresca a pele, protege contra os danos causados pelo sol e acaba com a acne; além disso, muitos dizem que, se ingerido, abaixa a febre e faz sumir a dor de cabeça.

No entanto, ele está sendo ameaçado por uma nova força: as multinacionais de cosméticos, com campanhas publicitárias sedutoras para hidratar, empoar e besuntar os rostos das mulheres dessa nação. Than Than Aye admite que os produtos de beleza coloridos e chamativos que vende são parte do problema. "As jovens agora usam maquiagem quando saem. Todas essas marcas de cosméticos mudaram sua maneira de pensar".

Nos três anos desde que Mianmar começou a experimentar o gostinho da democracia, depois de décadas de isolamento nas mãos da junta militar, as tendências consumistas já estão mudando facetas antigas do dia-a-dia do país. Os outdoors, por exemplo, começaram a brotar junto com o frenesi de projetos de construção — e muitos exibem modelos brancas segurando frascos de loções que prometem uma pele de "tom pálido aristocrático".

"Muitas garotas acham que o thanakha é pouco sofisticado, faz com que pareçam caipiras", explica Sandi Oo, de 24 anos, atrás do balcão de vidro da loja de departamentos Ocean daqui. A atendente, aliás, de base, batom rosa e rímel brilhante, é uma verdadeira propaganda ambulante dos cosméticos exibidos nas prateleiras à sua volta. E explicou que as vendedoras da loja são multadas se usarem thanakha — o que não a impede de fazê-lo assim que chega em casa, como o resto da equipe. "Sinceramente? É muito melhor que as coisas que vendemos".

Embora seja comum em Mianmar, ou antiga Birmânia, a substância é ainda mais apreciada em Mandalay, a antiga capital que hoje abriga uma diversidade de etnias e religiões. Apesar dos confrontos recentes entre os budistas locais e as comunidades muçulmanas, o thanakha é usado ali por pessoas de todas as crenças, e é motivo incontestável de orgulho cultural. A demanda originou uma pseudo-indústria, principalmente na periferia de Sagaing, centro de aprendizado budista a 20 km de Mandalay.

Myat Thu, de 33 anos, e sua família cuidam de mais de cem árvores que plantaram perto de suas casas — e embora seus troncos mal passem dos 15 cm de circunferência, elas têm mais de vinte anos de idade. É um investimento de longo prazo, pois cada árvore é vendida por menos de US$50. "É muito tempo para esperar", comenta Myat Thu. Enquanto isso, a família vive comprando a madeira das grandes fazendas, no atacado, para revender.

Talvez para concorrer com as últimas tendências em cuidado com a pele, alguns fabricantes vendem o thanakha como um pó pronto, mas muita gente teme os efeitos colaterais dessa opção. No ano passado, duas crianças pequenas em Kansas City, no Missouri, cidade que abriga uma população birmanesa considerável, sofreram intoxicação por chumbo devido ao thanakha contaminado. Os pesquisadores ainda não descobriram prova científica de que o produto é tão benéfico como se alega.

Apesar disso, muitas jovens o combinam com noções ocidentais de estilo pessoal. No trabalho, Khin Mi Mi Kyaw, agente de turismo, 25, usa uma camada nas bochechas e na testa — o que lhe dá um ar moderno combinando com o piercing na sobrancelha, as mechas loiras e a flor delicada tatuada no punho esquerdo. "Para nós, birmanesas, é uma tradição que além de proteger nos deixa bela. Por que não usar?", questiona.

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