Ainda é raro um jornal cubano sugerir que o Partido Comunista cometeu um erro. Ou o principal ideólogo do partido renunciar ao sigilo governamental. Ou um astro da música, apresentando-se em um show oficial, pedir liberdade para votar e para fumar maconha.
Mas esses gestos de abertura estão se tornando mais comuns.
"Há mais espaço para o debate", disse Armando Chaguaceda, cientista político e blogueiro cubano que vive no México. "As pessoas estão mais francas e abertas."
Grande parte disso se explica pelo estilo do presidente Raúl Castro, segundo Carlos Alberto Pérez, que se descreve como um blogueiro "revolucionário". Desde que Castro sucedeu a seu irmão, Fidel, em 2006, ele convidou os cubanos a dar suas opiniões sobre a economia e pediu que a mídia dirigida pelo Estado fosse mais incisiva.
"A população de Cuba quer discutir, debater, ouvir e ser ouvida", disse Pérez, cujo site aborda questões que vão da dificuldade de conseguir cremar um corpo ao transporte público.
Em setembro, a Conferência dos Bispos Católicos fez um apelo ousado, embora oblíquo, por um sistema mais democrático, pedindo em uma carta pastoral uma "atualização" do modelo político e dizendo que Cuba deveria ser uma sociedade "plural".
Enquanto isso, a internet apesar de estar fora do alcance da maioria dos cubanos rompeu o monopólio da informação pelo Estado e permitiu um espectro de opiniões. Blogueiros escreveram sobre a má administração econômica, a timidez das mudanças, a corrupção, a burocracia e a passividade da mídia controlada pelo Estado.
Ainda há limites. Enquanto o governo prega franqueza, continua esmagando a oposição, e os que pisam na tênue linha entre crítica leal e dissidência correm o risco de ostracismo, perda do emprego, assédio ou cadeia.
A Comissão de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional de Cuba, um grupo independente, disse que houve 761 prisões temporárias de dissidentes em novembro, um dos números mais altos dos últimos dois anos. Em outubro, cinco jornalistas independentes foram detidos durante vários dias pelo governo cubano, segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras.
"É ambíguo", disse Chaguaceda, o cientista político. "Depende de quem você é, como você diz as coisas e onde você as diz."
No meio de um show televisionado em setembro, o cantor Robertico Carcassés surpreendeu o país ao pedir o direito de eleger o presidente, a legalização da maconha e a liberdade de informação.
Ainda mais chocante foi a reação das autoridades: depois de impedir Carcassés de se apresentar em locais de propriedade do Estado, o que significa a maioria deles, elas recuaram após Silvio Rodríguez, um famoso cantor revolucionário, defender o direito de seu colega de se expressar.
A mídia estatal adotou o que chama de "batalha contra o sigilo" e fez esforços para animar sua cobertura. Em setembro, o jornalismo televisivo estatal lançou um segmento, "Cuba Diz", em que os cubanos são entrevistados na rua sobre questões que incluem alcoolismo, problemas habitacionais e o alto preço das frutas e dos legumes.
Em outubro, o coronel Rolando Alfonso Borges, chefe de ideologia do Partido Comunista, disse a jornalistas que o partido rejeita o sigilo. No mês passado, Miguel Díaz Canel Bermúdez, primeiro vice-presidente do Conselho de Estado, reuniu-se com jornalistas nas províncias para lhes pedir que sejam mais polêmicos.
O jornal oficial do partido, "Granma", escreveu em novembro que a opinião pública parecia ser contra a recente proibição aos cinemas 3D particulares.
Os blogs conquistaram leitores de alto nível. O blog de tom reformista La Joven Cuba ficou bloqueado durante vários meses no ano passado depois que publicou artigos críticos.
Hoje em dia, porém, "encontramos com autoridades e elas nos dizem Oh, acabei de ler seu artigo", disse Harold Cárdenas Lema, 28, um dos fundadores do blog.
Alguns criticam as reformas como decorativas ou uma tática para atrair a dissidência interna.
Arturo López Levy, ex-analista de inteligência do governo cubano, diz que a pressão por uma mídia oficial mais crítica é, em parte, uma tentativa de controlar um debate que já acontece na mídia social e em outros lugares.
"Diante do desafio de um ambiente mais aberto, o governo prefere canalizar queixas e debates em seus próprios mecanismos", disse ele.
López Levy comparou a tarefa de pressionar por mudanças a partir de Cuba ao castigo de Sísifo, de rolar uma pedra montanha acima para vê-la rolar de volta à base. "Mas às vezes a pedra cai em uma posição diferente", admitiu.