O presidente Barack Obama administra uma transição delicada no uso internacional do poder americano. Esse poder continua a ser dominante, mas já não é determinante. No mundo de hoje, os EUA já aprenderam com o Iraque e o Afeganistão que a superioridade militar não garante a realização de objetivos. Ainda não houve vitórias no século 21.

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Obama é empirista. Ele estuda os problemas e aprende com a experiência. Concluiu, com razão, que uma terceira guerra no Oriente Médio em torno das ambições nucleares do Irã seria um desastre com ganhos possíveis limitados e danos possíveis ilimitados. Hoje, o principal elemento que se interpõe entre ele e tal guerra é a diplomacia reativada.

Nesse contexto, o acordo interino de seis meses de vigência fechado entre as grandes potências e o Irã constitui o fato diplomático mais importante desde o 11 de Setembro. As bases mudaram. A ânsia belicista dos feridos se esgotou em Washington.

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Negociado em grande medida entre os EUA e o Irã, o pacto assinala o fim da alienação traumatizada que prevalece desde que a Revolução Islâmica de 1979 trouxe a imagem do fanático islâmico barbado à psique americana.

A aceitação por Obama de um "programa de enriquecimento mutuamente definido" para o Irã em qualquer acordo de longo prazo e o compromisso assumido pelo Irã de que, "sob circunstância alguma", "jamais buscará ou desenvolverá quaisquer armas nucleares" constituem o tipo de concessões dolorosas através das quais é possível repensar as relações hostis. Mas esse acordo agora se encontra ameaçado.

O primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, o descreveu como um "erro histórico". O Congresso americano, de modo geral sob a influência de Netanyahu, não ficou muito atrás.

Eric Cantor, líder da maioria republicana na Câmara, exigiu que o Irã "desmonte irreversivelmente seu estoque de materiais nucleares e seja impossibilitado de levar o enriquecimento adiante". Um projeto de lei submetido ao Senado que pode impor mais sanções (e, desse modo, jogar o acordo por terra) também prevê o desmonte iraniano completo. É precisamente a posição de Israel e equivale a dizer que não há acordo possível.

Tendo gasto mais de US$ 100 bilhões, adquirido mais de 18 mil centrífugas e reunido um estoque de mais de 10 mil quilos de urânio de baixo grau de enriquecimento, o Irã não vai concordar em abrir mão completamente do enriquecimento. O objetivo precisa ser o de limitar a capacidade iraniana, sujeitá-la à inspeção internacional vigorosa e reduzir o enriquecimento a um nível em que o urânio só possa ser usado em um programa pacífico, civil.

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A alternativa a tal acordo será a guerra ou a convivência com um Irã nuclear (quer o país esteja armado com uma bomba, quer com a tecnologia e o urânio enriquecido necessários para fazer avanços em grande escala nesse sentido).

O presidente iraniano, Hassan Rowhani, foi a Davos e declarou: "Minha visão social, política e econômica é de moderação prudente." Não há motivo para aceitar o que ele disse sem questionamentos. O Irã já dissimulou. Acumulou um programa nuclear completamente desproporcional com qualquer aplicação civil concebível. Se o Irã não quis até agora construir uma bomba, pelo menos buscou dotar-se da tecnologia para isso. Portanto, Rowhani, que de fato parece moderado, precisa ser testado.

É essa a finalidade da segunda fase de negociações com vista a um acordo duradouro. Rejeitar Rowhani de antemão, como faz Netanyahu, é temeridade. Às vezes parece que não há nada que Israel, razoável e articulado, tema mais que contrapartes razoáveis e articuladas nos mundos persa ou árabe, quer sejam Rowhani ou o ex-primeiro-ministro palestino Salam Fayyad.

O esforço para chegar a um pacto duradouro com o Irã será árduo, especialmente se a guerra síria continuar a ferver (como certamente fará). O líder supremo iraniano, aiatolá Ali Khamenei, estará disposto a desmontar —mesmo que parcialmente— o núcleo antiamericano do éthos da República Islâmica? Obama, de olho nos livros de história, vai desafiar um Congresso e Israel que se negam a permitir qualquer enriquecimento iraniano?

Dois ex-secretários de Estado republicanos, Henry Kissinger e George Shultz, formularam o desafio no "Wall Street Journal": "A diplomacia americana agora tem três tarefas principais pela frente: definir um nível de capacidade nuclear iraniana limitado a finalidades civis plausíveis —e obter salvaguardas para assegurar que esse nível não seja ultrapassado—, deixar a porta aberta para a possibilidade de um relacionamento genuinamente construtivo com o Irã e traçar uma política para o Oriente Médio ajustada às novas circunstâncias."

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Seria uma grande conquista para o mundo e para uma potência americana que é dominante, mas não mais determinante.