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Luta

É, novamente, uma vida dura para uma mulher

Charlotte Gainsbourg em ‘‘Anticristo’’ de Lars von Trier | ifc films
Charlotte Gainsbourg em ‘‘Anticristo’’ de Lars von Trier (Foto: ifc films)

Há quinze anos, Catherine Deneuve escrevia em seu diário sobre a filmagem do musical não ortodoxo "Dançando no Escuro" (2000) com Björk e o diretor Lars von Trier. Apesar das firmes diferenças criativas e do stress psicológico por todos os lados, Björk viu a sua estreia como protagonista, como uma mãe solteira ficando cega e que enfrenta a pena de morte, no final. E Deneuve não conseguiu entender por quê.

"Estou muito surpresa; eu sei, porque ela me contou que ela está sofrendo muito e que Lars constantemente a tem pressionado além dos limites", Deneuve escreveu no seu diário do set de filmagem, cujo trecho apareceu em seu livro de 2005 "Close Up and Personal" (Íntimo e Pessoal", em tradução livre, sem título no Brasil). "Por que ela nunca disse ‘Não’, ou ‘Chega?’"

Não é uma reação incomum aos últimos filmes de Lars Von Trier. Uma típica heroína de Von Trier pode ser violentada por um barco inteiro de marinheiros (Emily Watson em "Ondas do Destino"); acorrentada e estuprada pelos habitantes de uma cidade alegórica (Nicole Kidman em "Dogville"); ou ela pode mutilar a sua própria genitália e a de outras’ (Charlotte Gainsbourg em "Anticristo").

Acusações de misoginia são comuns nas discussões dos filmes de Lars von Trier. Entretanto, algumas pessoas adotaram uma visão contextual. Na revista online Slate, a crítica Jessica Winter analisou os argumentos (inclusive a ideia de que ele é simplesmente um misantropo), concluindo que a "sua graça salvadora era que ele nunca conseguiu dar um papel padrão a uma atriz como ‘esposa’ ou ‘namorada’ mesmo que a sua vida dependesse disso". As suas estrelas parecem concordar.

"Ninfomaníaca", que está sendo lançado em dois "volumes", é o último dos extremos do que se assemelha ao martírio da experiência humana de Lars von Trier. Uma biografia na forma de conto sexual, alternadamente sardônico e gélido, ela é narrada pela pessoa, Joe (Gainsbourg), que é vista primeiramente deitada ensanguentada e confusa em um beco. Ela conta a sua história em longas conversas com Seligman, o homem que a encontrou (Stellan Skarsgard). Suas aventuras vão de ousadas escapadas sexuais na adolescência em trens até dias e noites cheias fazendo malabarismo com múltiplos parceiros até o ponto deprimente de não conseguir sentir prazer em atos normais.

É o terceiro filme de Gainsbourg com Lars von Trier. "É como se ele entendesse tudo a meu respeito", ela contou.

Tirando as descrições explícitas, "Ninfomaníaca" nem mesmo é o filme mais cheio de tabus de Lars von Trier. Para alguns, esse título ainda pertence a "Os Idiotas" (1998), um filme que Gainsbourg separou para elogiar. O filme apresentava pessoas fingindo serem deficientes mentais.

Para Kidman, estrela de "Dogville", um filme diferente de Lars von Trier a atraiu. "A razão pela qual eu queria trabalhar com Lars foi porque eu tive uma reação tão visceral ao filme ‘Ondas do Destino’", ela escreveu em um e-mail de Marrocos, onde ela está gravando um filme de Werner Herzog. "Levantei-me após ver o filme e para ir jantar, mas em vez disso eu tive de ir para a cama na posição fetal chorando. Foi quando eu soube que tinha de trabalhar com ele".

Gainsbourg, que tinha acabado de filmar um projeto de Wim Wenders em Montreal, disse que ela alegremente trabalharia com Lars von Trier novamente.

A sua única hesitação falava talvez sobre a atração inerente dos limites extremos que os seus filmes alcançam.

"Eu adoraria, mas não tenho certeza de que ele me convidaria novamente", disse. "Acho que ele já viu tudo. Dei o máximo que pude toda vez".

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