Talvez a Apple seja a única empresa de tecnologia no planeta que ousa se comparar a Picasso.
Em uma aula no programa de treinamento interno da empresa, a chamada Universidade Apple, o instrutor comparou as 11 litografias da série "O Touro", de Picasso, à maneira com que a Apple cria seus smartphones e outros dispositivos. Sua intenção era salientar que os designers da Apple buscam o máximo de simplicidade, assim como Picasso eliminava detalhes para criar uma obra de arte.
Steven P. Jobs fundou a Universidade Apple como um meio para inculcar nos funcionários a cultura de negócios da Apple e instruí-los sobre sua história, sobretudo como a empresa cresceu.
Os cursos não são obrigatórios, apenas recomendados, porém têm alta demanda por parte de novos funcionários.
Em geral, os funcionários da Apple não devem falar publicamente sobre a empresa, nem sequer nas aulas. No entanto, três funcionários que frequentaram as aulas concordaram em falar sob condição de manter o anonimato. Eles disseram que o programa, iniciado em 2008, é uma reflexão sobre a Apple e a imagem que ela apresenta ao mundo. Como qualquer produto da Apple, ele é meticulosamente planejado.
"Até o papel higiênico nos banheiros é formidável", disse um dos funcionários.
Os quadros fixos em tempo integral da universidade, incluindo instrutores, redatores e editores, criam os cursos e os ministram.
Alguns de seus membros vieram de universidades como Yale, Harvard, Stanford, MIT e da Universidade da Califórnia.
Alguns cursos abrangem estudos de casos sobre decisões de negócios da Apple, relatou um dos funcionários, incluindo aquele para tornar softwares do iPod e do iTunes compatíveis com o sistema operacional Windows da Microsoft. Isso levou ao crescimento explosivo do tocador de música e da iTunes Store.
Randy Nelson, que antes trabalhava no estúdio de animação Pixar, cofundado por Jobs, é um dos professores de "Communicating at Apple" (comunicação na Apple). Esse curso enfoca a comunicação clara não só para produzir produtos de uso intuitivo, mas também para partilhar ideias com colegas e divulgar produtos.
Em uma versão da aula no ano passado, Nelson mostrou um slide da série de 11 litografias sobre tauromaquia que Picasso criou em cerca de um mês, a partir do final de 1945. Nos estágios iniciais, o touro tem focinho, quartos dianteiros e patas, mas com as iterações esses detalhes são eliminados. A última imagem é uma figura quase abstrata e, ao mesmo tempo, de um touro inconfundível.
"Você faz uma série de iterações até simplesmente transmitir sua mensagem da maneira mais concisa, e isso se aplica à marca da Apple e a tudo o que fazemos", recordou um ex-aluno.
Em "What Makes Apple, Apple" (o que diferencia a Apple), outro curso ministrado por Nelson, ele mostrou um slide do controle remoto com 78 botões para a Google TV, disse um funcionário. Depois, mostrou uma foto do controle remoto da Apple TV, uma peça fina de metal com apenas três botões.
Como os designers da Apple decidiram que três botões eram o ideal? Eles tiveram a ideia inicial e a debateram até chegar ao que realmente era necessário um botão para iniciar um vídeo e dar pausa, um botão para selecionar algo para assistir e outro para acessar o menu principal.
O controle remoto da Google TV serve de contraexemplo. Segundo Nelson, ele tinha tantos botões porque todos os engenheiros e designers que trabalharam no projeto incluíram tudo o que queriam.
Ben Bajarin, analista de tecnologia para consumo de massa na Creative Strategies, disse que a Universidade Apple ganharia mais importância à medida que a Apple continuasse a crescer.
Bajarin deu a seguinte opinião: "Quando se estuda casos da Apple nas décadas anteriores a essa, fica bem evidente sua cultura singular, pois as pessoas que trabalham na empresa acreditam estar fazendo os melhores produtos, que mudam a vida das pessoas para melhor".
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