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Análise

Europa adota políticas que reduzem os direitos trabalhistas

Em 2008, 1,9 milhão de trabalhadores portugueses do setor privado estavam cobertos por acordos coletivos. No ano passado, esse número havia despencado para 300 mil.

A Espanha diminuiu as restrições a dispensas coletivas e sem justa causa e estendeu os limites do trabalho temporário, permitindo que as empresas contratem trabalhadores com acordos temporários de até quatro anos de duração. A Irlanda e Portugal congelaram os salários mínimos, ao passo que a Grécia fez cortes de até 25 por cento.

Presos ao euro e, portanto, incapazes de desvalorizar a própria moeda como forma de ajudar a tornar os produtos nacionais mais baratos no mercado de exportação, muitos países começaram a desmantelar rapidamente as proteções trabalhistas como forma de reduzir os custos com funcionários.

A lógica – articulada por Angela Merkel, da Alemanha, e pela Comissão Europeia – é a de que essa é a única estratégia capaz de restaurar a competitividade, aumentar o emprego e recuperar a solvência nacional.

"A velocidade das mudanças tem sido vertiginosa", afirmou Raymond Torres, economista-chefe da Organização Internacional do Trabalho, em Genebra. "Até onde posso dizer, essas são as mudanças mais profundas desde o fim da Segunda Guerra Mundial."

Embora a maior parte do debate em relação à forma como a Europa reagiu à crise financeira se concentre na austeridade orçamentária que toma conta do continente, a erosão comparativamente menos divulgada das proteções trabalhistas provavelmente terá um impacto igualmente grande e durável no contrato social europeu.

"O efeito foi desastroso para a coesão social e para a igualdade social", argumentou Jean-Paul Fitoussi, do Institut d’Études Politiques de Paris. "O bem-estar social faliu em toda a Europa e um dos sintomas é a ascensão de partidos políticos extremistas."

A estratégia europeia oferece uma amostra dos papéis representados pela maior parte das instituições do mercado de trabalho – dos sindicatos ao salário mínimo – na moderação do crescimento das desigualdades sociais; uma das marcas registradas de nossa era.

Agora devemos nos perguntar se a igualdade relativa será capaz de se manter como uma das instituições trabalhistas que protegeu durante décadas o padrão de vida dos trabalhadores europeus, dando lugar a uma abordagem menos regulamentada ao estilo norte-americano, na qual os governos praticamente não interferem no mercado de trabalho e os trabalhadores organizados têm pouca voz.

Até o momento, as evidências sugerem que a resposta seja negativa. O fim dos sindicatos em Portugal "fará as diferenças salariais aumentarem drasticamente", afirmou David Card, economista do trabalho na Universidade da Califórnia em Berkeley.

É possível que a evidência mais convincente de que o novo caminho trilhado pela Europa irá levar o continente a aprofundar as desigualdades venha do país que adotou essa abordagem antes dos demais e terminou o processo como um caso de sucesso: a própria Alemanha.

A reforma do mercado de trabalho começou depois da reunificação alemã no início dos anos 1990, quando as fábricas da antiga Alemanha Oriental descobriram que seriam incapazes de competir com os salários oferecidos pelo Ocidente, e começaram a abandonar em massa os acordos que haviam sido negociados entre a indústria e os grandes sindicatos. As empresas da Alemanha Ocidental logo adotaram a mesma estratégia e a parcela de trabalhadores protegidos por acordos coletivos caiu drasticamente.

No início dos anos 2000, iniciativas para melhorar a competitividade diminuíram ainda mais as proteções trabalhistas, dando início a um rápido crescimento dos "miniempregos" de curto prazo e com salários baixos que atualmente correspondem a mais de um quinto do total de vagas de trabalho na Alemanha.

Nos dias de hoje, a Alemanha é vista como um grande exemplo das virtudes dessas iniciativas reformistas. O país se tornou uma enorme economia exportadora com índices de desemprego, segundo a agência de estatísticas Eurostat, de apenas 5,2 por cento. Porém, olhando de perto, fica claro que nem todos os alemães se beneficiaram com o sucesso do país.

Em 1991, os 10 por cento mais ricos da Alemanha respondiam por 26 por cento da renda nacional sem os descontos com impostos, de acordo com um relatório do Instituto de Políticas Macroeconômicas, em Düsseldorf. Em 2010, eles já respondiam por 31 por cento.

Ao longo do mesmo período, a parcela da renda nacional nas mãos da metade mais pobre caiu de 22 para 17 por cento.

O crescimento da Alemanha contou com uma economia global em franca expansão, faminta por seus bens de exportação. Mas agora, o mundo está muito diferente.

Mesmo que a estratégia final visasse a diminuir a taxa de desemprego, o que mais aconteceria na Europa?

O economista alemão Andrew Watt teme que o processo de desregulamentação passe de um país fraco para o outro, à medida que todos se envolvem em uma luta inútil para criar empregos, competindo uns contra os outros pela parcela de um mercado com demandas insuficientes.

"Seja qual for o país mais fraco no momento que for forçado a fazer grandes cortes", afirmou, "será muito difícil recuperar o poder de barganha coletiva uma vez que as estruturas do Estado de bem-estar social forem completamente destruídas".

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