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ciência e tecnologia

Explorando árvores, uma célula por vez

Não é qualquer cientista que escolheria passar uma manhã de verão sobre um trêmulo andaime junto a um carvalho, a 12 metros de altura, olhando por um microscópio para perfurar uma folha com uma minúscula agulha de vidro cheia de óleo.

Mas Michael Knoblauch, um biólogo Universidade Estadual de Washington, especializado em células vegetais, está prestes a concluir 20 anos de esforço por provar uma hipótese sobre como os nutrientes são transportados nas plantas.

Ele também está no fim de um ano sabático, passado em grande parte na floresta Harvard, um campo de pesquisas de 1.400 hectares, em Massachusetts.

Provar tal hipótese seria bem mais do que um exercício acadêmico. Entender plenamente como as plantas funcionam —como os carboidratos produzidos nas folhas circulam— poderia levar a melhorias na produtividade agrícola ou na resistência a pragas e doenças.

Assim, lá estava ele num recente domingo, no topo da árvore, com seu filho Jan, 19. Enquanto o rapaz monitorava no laptop a imagem do microscópio, Knoblauch mexia num dispositivo com a agulha de vidro.

A ponta da agulha de vidro é delicada e pequena, e precisa ser fincada num tipo específico de célula. Apesar de o microscópio ficar instalado sobre um aparelho que detecta vibrações e as neutraliza, Knoblauch permanece o mais imóvel possível.

Ele e seu filho esperavam conseguir medir pelo menos uma vez a pressão dentro dos longos tubos de células vivas, chamados floemas, que recolhem os açúcares produzidos pela fotossíntese nas folhas e os distribuem para frutos e raízes através dos ramos e do tronco.

A agulha de vidro funciona como um calibrador de pneu: quando a parede celular é perfurada, a pressão da água no interior imediatamente comprime ligeiramente o óleo na agulha.

Knoblauch então usa as imagens de antes e depois para calcular a compressão e, assim, determinar a pressão.

O pesquisador passou mais de três anos em seu laboratório desenvolvendo as agulhas, que ele chama de picomedidores, pois contêm menos de cem picolitros de óleo (seriam necessários de 50 milhões de picomedidores para encher uma colher de chá).

E essa é uma das técnicas que concebeu para testar a hipótese segundo a qual o que impulsiona o fluxo de nutrientes no floema é o diferencial de pressão.

Essa hipótese foi desenvolvida em 1930 pelo fitofisiologista alemão Ernst Münch e é amplamente aceita porque faz sentido: os nutrientes devem fluir das áreas de maior pressão (as folhas, onde são adicionados os açúcares) para áreas de menor pressão (as raízes e frutas, onde os açúcares são retirados).

"Se você descobrir o que a planta faz para alocar seus recursos em um período de 24 horas, então você pode pensar em todos os tipos de mudanças na produtividade agrícola", disse o biólogo William Lucas, especialista em plantas, da Universidade da Califórnia, em Davis.

"O futuro em termos de população e de segurança alimentar reside em obtermos uma compreensão completa disso."

Durante décadas, houve muitas tentativas de testar a hipótese, mas a prova definitiva sempre escapou aos pesquisadores.

Em seres humanos, as medições de pressão são fáceis, porque existem vasos sanguíneos perto da pele, e tudo é elástico.

Mas o floema está dentro da árvore e é mais rígido. "Você não tem como chegar até ele", disse Lucas. "E quem tentou chegar lá destruiu o sistema."

Os medidores de Knoblauch são tão pequenos e a medição é feita tão rapidamente que qualquer dano ao sistema é pequeno.

Mas as coisas podem dar errado. Knoblauch contou que, durante seu ano sabático, ele passou cinco meses "otimizando o sistema", o que é uma forma de dizer que ele tentou descobrir como evitar tudo que pudesse atrapalhar as medições.

O trabalho é tão desafiador que ele e seu filho obtiveram menos de 20 medições de pressão válidas nesse carvalho.

Mas ele também trabalha com uma flor trepadeira que leva para o laboratório, onde pode fazer as medições com mais calma.

As medições no carvalho, combinadas com as feitas nas flores (além de outros dados, como o diâmetro das células do floema e as vazões), devem ser suficientes para uma conclusão.

"Em seis meses teremos todos os dados para dizer se Münch estava certo ou errado", disse.

Knoblauch disse qie estava cauteloso, "mas agora parece que ele estava certo".

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