• Carregando...
Avdiivka Coke and Steel, no leste da Ucrânia, enfrenta ataques e cinco trabalhadores foram mortos, mas continua funcionando | Brendan Hoffman/The New York Times
Avdiivka Coke and Steel, no leste da Ucrânia, enfrenta ataques e cinco trabalhadores foram mortos, mas continua funcionando| Foto: Brendan Hoffman/The New York Times

O Mercedes-Benz blindado parou ao lado de uma chaminé de fábrica que lançava uma coluna sem fim de vapor branco e dela saiu Musa Magomedov, de 45 anos e ombros largos, diretor-geral da fábrica Avdiivka Coke and Steel.

“Quando o bombardeio começou ele fez tudo certo; correu para o túnel mais próximo”, disse Magomedov, no local onde um jovem mecânico e pai de dois filhos foi ferido em fevereiro, a cinco passos da segurança. “Tentamos salvá-lo, mas ele morreu na ambulância, antes de chegar ao hospital.”

Localizada na linha de frente de uma guerra desde julho passado, os milhares de funcionários da Avdiivka têm aguentado firme, dirigindo-se teimosamente ao trabalho todos os dias apesar de 160 ataques documentados de foguetes e artilharia, apagões periódicos, uma lista interminável de reparos e, pior de tudo, a morte de cinco colegas. Um ato de heroísmo na guerra civil da Ucrânia, mas também de pragmatismo: se a fábrica, a maior operação de coque na Europa, parar de funcionar, quase certamente será para sempre.

O coque, combustível utilizado nos fornos siderúrgicos da Ucrânia, é uma forma purificada de carvão, produzido por fornos especiais. Quando os fornos esfriam, acabam rachando, e o custo dos reparos e da retomada poderia chegar a US$1 bilhão ou mais. Quem é do ramo gosta de dizer que uma usina de coque pode ser fechada uma única vez. “Somos como o tubarão. Ele tem que nadar o tempo todo porque se parar, se afoga”, disse Magomedov.

A Avdiivka Coke and Steel fica no lado ucraniano da linha de frente, a apenas oito quilômetros das ruínas do Aeroporto Internacional de Donetsk. A área é um dos vários pontos onde dois cessar-fogo passaram despercebidos.

Não há nenhum lugar seguro acima do solo na fábrica, uma gigante de 52 anos que produz o coque em alto-fornos, além de dezenas de produtos químicos, eletricidade e aquecimento. Depois de repetidos ataques, a chuva cai através de um buraco no telhado da sala de máquinas. Morteiros se chocaram com os fornos de coque. Um foguete quase destruiu uma turbina. Outro rompeu um cano de gás, causando um incêndio que durou nove horas.

O primeiro-ministro Arseniy P. Yatsenyuk declarou a fábrica um ativo estratégico para a sofrida economia da Ucrânia. As siderúrgicas de Mariupol, um polo industrial, utilizam o coque. “Eles estão bombardeando Avdiivka de propósito para destruir a fábrica, para parar a indústria de Mariupol. Querem deixar 30 mil pessoas sem trabalho e provocar uma explosão social para acabar com os fundos do governo”, disse ele durante uma coletiva de imprensa em fevereiro.

As opiniões políticas dentro da fábrica estão divididas. Muitos trabalhadores, vindos do território controlado pela República do Povo de Donetsk, simpatizam com os separatistas. Outros, incluindo Magomedov, estão a favor do governo. Mas a fábrica continua a pagar salários e é a tábua de salvação para os milhares que trabalham lá, então a política não é um problema.

Temendo o que chamam de resposta ao fogo, os trabalhadores se recusaram a instalar posições de artilharia perto da fábrica ou na cidade de Avdiivka, que está em meio a uma crise humanitária. Apesar do perigo de bombardeios e grandes danos, a fábrica é considerada um dos lugares mais seguros na área. As estradas que levam até ela são disputadas e as cidades vizinhas, onde os trabalhadores vivem, estão sem eletricidade e água, por isso quase dois mil empregados estão vivendo nas dependências da fábrica, dormindo em pequenas camas distantes apenas alguns metros de onde trabalham.

Anna Skvortsova, diretora de RH, cresceu em Avdiivka. Porém, nos últimos meses, vive no abrigo nuclear da fábrica, construído na era soviética, que foi convertido em um escritório e casa. Ela se mudou para lá quando duas bombas caíram no telhado no prédio da administração. Anna, que tinha acabado de sair do escritório para falar com uma colega, foi jogada no chão. Se ela estivesse em sua mesa, disse, teria morrido.

Quase todos os trabalhadores da fábrica tem uma história parecida. Desde que o bombardeio começou, 600 deles saíram ou pediram demissão, e 324 outros concordaram em trabalhar periodicamente, disse Magomedov. Mas milhares mais ficaram em tempo integral, pelos salários, por sua segurança, ou por lealdade à fábrica.

Pavel Zhelavy, um capataz grisalho, trabalha na fábrica há 36 anos, desde que tinha 24. Quando planejava se aposentar, pediram que ficasse como conselheiro. Ele se mudou no mês passado, trazendo uma cama para o prédio da administração.

“Há duas razões pelas quais estou vindo para cá. Em primeiro lugar, quase sempre precisam de mim aqui. Segundo, porque está muito frio em minha casa”, ele brincou. Sua família se mudou para um apartamento em Berdyansk, longe das batalhas. Agora ele precisava de dinheiro para pagar o aluguel.

Seus dois irmãos vivem perto de Donetsk. Ele disse que não os vê desde que a luta começou.

“Não precisamos de um cessar-fogo. Precisamos de paz”, disse ele.

Brendan Hoffman para The New York Times.

Avdiivka Coke and Steel, no leste da Ucrânia, enfrenta ataques e cinco trabalhadores foram mortos, mas continua funcionando.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]