Fardos Osman se sentou no chão de concreto de uma sala lotada num vasto estádio, ao lado de várias outras mulheres, muitas das quais escondiam o rosto.
Ela disse que estava no estádio havia quatro dias. Seu documento de refugiada havia expirado, contou, e ela temia ser devolvida à Somália, um país devastado pela guerra. "Não quero voltar", disse Osman, 28. Milhares de cidadãos quenianos, imigrantes e refugiados sem documentos já foram detidos no país nas últimas semanas, em resposta ao que o governo diz ser uma escalada da atividade terrorista nesta nação do leste africano.
Refugiados encontrados em áreas urbanas estão sendo obrigados a voltar a acampamentos no norte do Quênia, sendo que dezenas de refugiados somalis já foram deportados para seu país de origem. Em Nairóbi, o estádio Kasarani foi transformado em delegacia de polícia, onde centenas de suspeitos ficam detidos.
Fora do estádio, familiares dos detentos se mostram confusos e ultrajados. "Minha esposa grávida, meu filho de 17 meses e minha irmã está lá", disse o refugiado etíope Mahdi Ibrahim, 39. "Esta é a segunda vez que eles vêm e prendem minha família."
Ismail Osman, 63, cidadão queniano de etnia somali, disse que policiais do seu bairro prenderam na véspera o filho dele, de 32 anos, que tem uma doença mental e não portava documentos.
"Não sabemos onde ele está", disse Osman, mostrando os documentos que comprovam a cidadania queniana do seu filho.
A campanha repressiva começou após uma série de fatos que irritaram as autoridades, incluindo um atentado na capital e um ataque a tiros contra uma igreja na cidade de Mombaça.
Nenhum grupo assumiu a autoria, mas as autoridades suspeitam do grupo islâmico somali Shabab, que diz lutar contra o governo queniano por causa da presença de militares do Quênia na Somália. O Shabab assumiu a autoria do atentado do ano passado no shopping center Westgate, em Nairóbi, que deixou 67 mortos.
O governo queniano respondeu de forma incisiva aos recentes episódios, realizando o que batizou de Operação Usalama ("paz", em suaíle). A segurança foi reforçada em torno de edifícios vistos como possíveis alvos, e a polícia recebeu sinal verde para "atirar para matar" em suspeitos de terrorismo.
O bairro de Eastleigh, em Nairóbi, sofreu o maior impacto da campanha. No bairro, majoritariamente habitado por pessoas da etnia somali tanto cidadãos quenianos quanto refugiados da Somália e também por etíopes, o mercado outrora fervilhante é agora uma sombra do que já foi, já que muita gente quer evitar detenções e interrogatórios.
"Nem todos os somalis são do Shabab", disse Ahmed Khader, 29, ativista somali-queniano de Eastleigh. "Apoiamos nosso governo contra o terrorismo, mas não a natureza indiscriminada da operação", afirmou. As autoridades são peremptórias a respeito da necessidade das medidas de segurança.
"Parece que a ampla rede lançada pelo governo para capturar terroristas é um exercício internacional de relações públicas, visível, mas não substancial nenhuma atividade terrorista foi descoberta, nenhum plano terrorista foi revelado", disse Kwamchetsi Makokha, do jornal "The Daily Nation". "A segurança precisa depender mais da inteligência e menos da força."
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