Em um país tão preocupado com o abuso de drogas que chega a limitar a venda de aspirinas, Pal-Orjan Johansen defende o que pode parecer uma causa perdida: a reabilitação do LSD.
Para ele, pouco importa que a droga psicodélica tenha sido proibida em todo o mundo há mais de 40 anos. Johansen pinta sua iniciativa como uma batalha pelos direitos humanos e pela saúde.
Na verdade, ele também quer fabricar MDMA (metilenodioximetanfetamina) e psilocibina, os ingredientes ativos de duas outras substâncias proibidas, ecstasy e os chamados “cogumelos mágicos”.
Tudo isso pode parecer quixotesco, se Johansen e EmmaSofia, o grupo de defesa dos psicodélicos que ele fundou com sua mulher e também cientista, Teri Krebs, já não tivessem conquistado alguns apoiadores improváveis, incluindo um juiz aposentado da Suprema Corte da Noruega que é seu assessor jurídico.
O grupo, cujo nome deriva da gíria usada para MDMA (Emma) e da palavra grega para “sabedoria” (Sofia), está na vanguarda de um movimento que pressiona por uma revisão das políticas antidrogas estabelecidas nos anos 1970.
O fato de ele ter ganhado impulso em um país tão comprometido com o controle das drogas mostra como as antigas ortodoxias desmoronaram. O grupo também quer fabricar os psicodélicos para garantir que sejam seguros.
Recentemente, iniciou uma campanha on-line para levantar dinheiro com a finalidade de, em cooperação com uma empresa farmacêutica norueguesa, iniciar a produção com controle de qualidade dessas drogas que, segundo Johansen, salvaram e transformaram sua vida.
“Eu ajudei a mim mesmo com os psicodélicos e quero que outros tenham a mesma oportunidade sem correr o risco de ser presos”, disse Johansen, 42, ex-pesquisador na Universidade de Ciência e Tecnologia da Noruega.
Ele lembrou como derrotou seus problemas de alcoolismo, tabagismo, transtorno de estresse pós-traumático e depressão ingerindo psilocibina e MDMA.
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Leia a matéria completaEnquanto nos Estados Unidos os defensores da maconha levaram décadas para modificar a atitude do público e as políticas do governo, os pregadores das drogas psicodélicas na Noruega insistem que têm a ciência e a lei a seu lado.
Até políticos que os apoiam advertem que será uma longa luta. A EmmaSofia, de todo modo, conseguiu transformar sua causa em uma questão pública, e Johansen apareceu em debates na TV estatal NRK e em um extenso perfil em uma revista.
Johansen e seus seguidores apontam para uma longa tradição de pajés adoradores da natureza. Até os vikings, pelo menos segundo os fãs das drogas psicodélicas, comiam cogumelos alucinógenos antes das batalhas.
Steinar Madsen, o diretor médico da Agência de Medicamentos Norueguesa, disse que em princípio não tem objeção ao que chamou de “projeto interessante” da EmmaSofia.
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Leia a matéria completaIna Roll Spinnangr, uma política do Partido Liberal que defende uma política mais branda para as drogas, disse que a melhor maneira de efetuar mudanças não é atacar o governo da Noruega, mas virá-lo de cabeça para baixo.
“Você tem de usar o argumento da babá: o governo precisa regulamentar o mercado, em vez de deixá-lo para os criminosos. O argumento de que você decide o que coloca no próprio corpo nunca funcionará na Noruega.”
Ketil Lund, 75, o juiz aposentado da Suprema Corte que assessora a EmmaSofia sobre sua estratégia legal, disse que apoiou a campanha como parte de uma “luta maior” contra as políticas antidrogas no Ocidente, que descreveu como um “fracasso absoluto”.
“A atual política antinarcóticos no Ocidente tem muitos efeitos negativos”, disse. “Estes têm de ser sopesados contra os efeitos negativos das próprias drogas.”
O tabu sobre psicodélicos está profundamente arraigado no Ocidente —um legado de campanhas contra o uso de drogas e uma reação à contracultura dos anos 1960, quando Timothy Leary, professor de Harvard e defensor do LSD, instigou os americanos a “se ligar, entrar em sintonia e cair fora”.
“O LSD aterroriza os governos; é seu temor máximo porque muda a maneira como as pessoas veem o mundo”, disse David Nutt, professor de neuropsicofarmacologia no Imperial College em Londres.
Ele foi demitido em 2009 do cargo de assessor de políticas sobre drogas do governo britânico, depois que disse em uma entrevista que o álcool é muito mais prejudicial que o LSD.
Nutt elogiou a EmmaSofia e outros grupos por ajudarem a remover o estigma e o medo ligados às drogas psicodélicas, acrescentando que “houve definitivamente um renascimento” da pesquisa médica nos últimos anos, depois de décadas de “paranoia e censura”, que matam a ciência, baseadas em histórias sobre psicodélicos que geram pânico no público.
“Não estamos mais nos anos 1960, já avançamos”, disse Johansen. “Essa é uma questão de direitos humanos básicos.”
O LSD, que foi sintetizado pela primeira vez em um laboratório suíço em 1938, e o MDMA, patenteado em 1914, tiveram ampla aceitação na Europa e nos EUA em meados do século passado, quando eram uma promessa contra o alcoolismo e outras doenças.
Mas a euforia inicial sobre sua utilidade médica foi abafada pelo alarme com o aumento do uso recreativo dos psicodélicos.
Os EUA proibiram o LSD em 1970. Um ano depois, a Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas da ONU proibiu seu uso, “exceto para fins médicos e científicos muito limitados”.
O doutor Madsen, da Agência de Medicamentos Norueguesa, admitiu que há “muitos mitos” sobre as drogas psicodélicas, como afirmações de que “se você usar LSD, vai pular do telhado”.
De todo modo, ele não vê uma maneira rápida de contornar as leis e os rígidos regulamentos sobre seu uso. “Todo mundo sabe que temos de ser muito cuidadosos com essas drogas. Não acho que seja o momento adequado.”