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Guerra de palavras prejudica Europa

As brigas entre os membros da União Europeia em torno da crise da dívida grega estão ultrapassando os limites da discussão saudável | Aris Messinis/Agence France-Presse — Getty Images
As brigas entre os membros da União Europeia em torno da crise da dívida grega estão ultrapassando os limites da discussão saudável (Foto: Aris Messinis/Agence France-Presse — Getty Images)

Dizem que a maneira mais fácil de estragar uma amizade é emprestar dinheiro. Será que isso significa que o euro foi a pior ideia que a União Europeia já teve? Até recentemente, eu teria dito que não devemos nos apressar em julgar: eu acreditava que as brigas entre os 28 Estados-membros em torno da crise da dívida grega tinham sido úteis, ao gerar uma nova franqueza no bloco.

Mas o que está acontecendo agora vai além da manifestação saudável de posições. Algo está começando a cheirar mal.

Existem duas narrativas opostas neste conflito, dois sistemas segundo os quais um lado está com a razão e o outro é o culpado. Não são meras discussões políticas insossas —são narrativas carregadas de orgulho, preconceito, obstinação e ideologia.

Por um lado, temos a história da Alemanha que destrói a democracia da Europa, conforme é relatada pela esquerda europeia e reaquecida por vários comentaristas americanos.

Eles nos dizem que a confusão atual tem uma origem simples: os alemães, farisaicos e obcecados pelas regras. Depois de a Grécia ingressar na zona do euro, em 2001, bancos alemães começaram a emprestar demais aos cidadãos e empresas gregos, e esses gregos gastaram o dinheiro com carros e máquinas alemães.

Na Alemanha, os produtores começaram a adorar o euro: ele enchia seus blocos de encomendas, porque os produtos alemães passaram a ser muito mais competitivos do que tinham sido nos tempos do marco. Mas, quando a Grécia se aproximou da falência, em 2010, os alemães a ajudaram apenas para não deixar seus próprios bancos ser prejudicados.

Foram eles, não os cidadãos gregos, os maiores beneficiários do resgate. Além disso, as medidas de austeridade impostas pela Alemanha devastaram a economia da Grécia, deixando o país com desemprego de 25%.

Quando os gregos promoveram um referendo, pedindo para acabar com essa insensatez, a Alemanha reagiu chantageando-os: teriam que aceitar um programa de austeridade ainda mais intransigente, ou sair da zona do euro. A mesma Alemanha que teve sua dívida perdoada após a Segunda Guerra Mundial está disposta a sufocar o sul da Europa a não ser que ele se dobre à vontade de Berlim. A União Europeia seria um Quarto Reich econômico? Europeus, resistam!

Essa é uma narrativa. A outra defende que a Grécia empurra a zona do euro para o abismo. Ela é contada pela direita europeia e alardeada por comentaristas do norte da Europa.

A crise da dívida, dizem eles, é consequência da incompetência política da Grécia. Atenas teria falsificado suas contas para conseguir ingressar na zona do euro e foi recompensada com a oportunidade de contrair empréstimos. Mas, em vez de investir o dinheiro, os gregos o teriam desperdiçado.

Na mesma época, a Alemanha impôs cortes ásperos a seus benefícios sociais e liberalizou seu mercado de trabalho. Esses dois fatores, somados às restrições salariais, tornaram competitivos os produtos alemães.

Quando a Grécia se viu diante da possibilidade do default, a Alemanha ajudou a mobilizar empréstimos de emergência, apesar de o tratado da UE proibir explicitamente a concessão de pacotes de resgate. Além disso, investidores estrangeiros concordaram com uma redução de 105 bilhões de euros. Esta, somada a cortes orçamentários cuidadosos feitos por Atenas, começou a render frutos. Em 2014, o Orçamento grego revelou um ligeiro superávit.

Então o governo do Syriza chegou ao poder. Foi ele, não a Alemanha, quem chantageou, ameaçando perturbar o equilíbrio da zona do euro com um referendo desestabilizador. E isso simplesmente não funciona —o que aconteceria se os países credores promovessem referendos para decidir se ajudam a Grécia ou não?

Sim, a Alemanha teve sua dívida perdoada, em grande parte, em 1953. Mas a Alemanha não fazia parte de uma união monetária cujos membros tinham acordado um conjunto de regras. A chanceler Angela Merkel vem sendo leniente demais, abrindo o caminho para mais um pacote de resgate para a Grécia. Uma zona do euro em que governos socialistas falidos ditam os termos de seus próprios resgates? Cuidado, europeus!

Essas duas narrativas podem soar como caricaturas, mas, a não ser que alguma coisa mude, vão ajudar a influenciar a opinião pública, as eleições e, portanto, a política europeia.

Existe alguma maneira de sustar as forças centrífugas?

Felizmente, sim.

A Alemanha poderia começar por reconhecer os fatos gravemente desanimadores e concordar com a concessão de um novo pacote de ajuda emergencial à Grécia. Isso pode ser visto em casa como sinal de fraqueza, mas, apresentado corretamente fora da Alemanha, seria visto como gesto de generosidade feito a partir de uma posição de força.

Ao mesmo tempo, a União Europeia deveria criar uma opção para os países deixarem a zona do euro se não conseguirem recuperar-se dentro dela. Somados, esses passos poderiam encerrar a crise e também criar um espaço para manobras para o caso de outra crise emergir.

E talvez pudéssemos todos concordar em relação a uma lição a tirar da crise grega: que, para conservar uma amizade, você só deve emprestar tanto dinheiro quanto estiver disposto a doar. Partindo disso, nós, europeus, poderíamos finalmente começar a crescer juntos como adultos.

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