Um apartamento no 23« andar do novo edifício Le Riviera, que recentemente foi vendido por US$722.000, tem uma vista deslumbrante para o Porto Vitória. Os aparelhos alemães de última geração e as bancadas de mármore evocam o luxo europeu. Na entrada do edifício, esculturas de arame de artistas espanhóis estão penduradas no teto.
Há só um porém. O apartamento tem apenas 25,5 metros quadrados, e o quarto só comporta uma cama de casal.
"Se não comprarmos agora, não poderemos pagá-lo mais tarde", disse Frank Wu, de 60 anos, o novo proprietário desse "microflat" na extremidade nordeste da ilha de Hong Kong.
Os imóveis desafiam a lógica nesta cidade, um dos lugares mais caros do mundo para se viver, com espaços que um dia já foram impensáveis sendo vendidos rapidamente a preços astronômicos.
Mas o boom imobiliário e a desigualdade que ele expôs têm cobrado um preço alto. O valor das propriedades aumentou o descontentamento que levou milhares de pessoas a tomarem as ruas em recentes protestos pró-democracia.
Para muitos jovens que vivem com os pais, está cada vez mais difícil ter seu próprio lugar. Os preços dos aluguéis estão nas alturas. E muitos temem que o mercado imobiliário possa desabar, principalmente se o Fed, o banco central americano, começar a aumentar as taxas de juros no próximo ano. Os empréstimos aqui estão indexados às taxas americanas.
Desde a baixa do mercado imobiliário de Hong Kong em 2003, os preços médios da habitação aumentaram em mais de 300 por cento, segundo dados compilados pela agência imobiliária Centaline e pela City University de Hong Kong.
A economia de Hong Kong ajudou a impulsionar esse aumento, pois ela se expandiu nos últimos 10 anos após o rápido crescimento da China. A alta demanda de ricos chineses do continente e a área limitada também ajudaram a aumentar os preços, embora esse efeito tenha diminuído após medidas desaceleradoras do governo, como impostos adicionais sobre compras de propriedade. Novos compradores agora dominam o mercado, estimulado pelas taxas de juros extremamente baixas.
"A taxa de hipoteca está abaixo de 2 por cento, por isso é muito atraente para os compradores", disse Patrick Wong, analista de propriedade da BNP Paribas.
Wu, engenheiro aposentado que vive em Mid-Levels, uma das partes mais valorizadas da ilha de Hong Kong, comprou seu microflat como investimento. Ele já tem um inquilino em potencial e disse que planejava cobrar mais de US$2.000 por mês.
To Pui-lui, corretora de imóveis que vendeu duas unidades de tamanho similar no prédio, vê problemas pela frente. Recentemente, ela disse à filha médica que esse não é um bom momento para comprar. "Seria desastroso se o preço caísse agora que está tão alto", disse To.
As incorporadoras parecem implacáveis e continuam a construir novas propriedades, com cada vez mais incentivos, como a isenção de impostos que pode chegar a 10 por cento de desconto. Os microflats são uma parte pequena, mas crescente, das ofertas.
Wu, que reconheceu os riscos de comprar seu microflat no momento em que os preços estão tão altos, não parece muito preocupado.
Ele e sua esposa podem até acabar se mudando para lá. "Para mim, está bem assim."
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