Os jornalistas de Mianmar comemoraram neste ano quando o governo revogou uma proibição de cinco décadas a jornais diários privados.
Porém, seis meses depois que uma dúzia de diários entrou em produção, os jornalistas que resistiram à ira e à crueldade da ditatura militar lutam agora contra algo muito mais mundano: as forças do mercado. Apesar da expectativa de demanda reprimida, os editores dizem estar sofrendo com a circulação inesperadamente baixa, falta de anúncios e concorrência da internet.
"Toda editora está perdendo dinheiro", disse U Sonny Swe, presidente do Mizzima Media Group. "É preciso estar pronto para lutar. E pronto para perder."
Três dos jornais lançados neste ano fecharam, e nenhum dos nove restantes tem lucro, afirmam as editoras.
Alguns dos desafios que os novos diários de Mianmar estão enfrentando são iguais aos que confrontaram a imprensa em escala mundial há anos, como o declínio da leitura de publicações impressas. Contudo, os novos jornais de Mianmar estão operando num país empobrecido e competindo com jornais estatais que apoiavam a ditadura e continuam abertos.
A distribuição em grandes cidades ainda não é confiável, principalmente durante a estação chuvosa, e quase inexistente no interior. E o preço típico de 20 centavos de dólar por exemplar é alto demais para muitos leitores. Já as publicações estatais são vendidas por uma fração desse valor.
Daw Nyein Nyein Naing, diretora executiva de "The 7 Day Daily", disse que encontrar bons repórteres tem sido uma dificuldade. Segundo ela, seus jornalistas são viciados no Facebook e muitas vezes publicam os furos em suas páginas no site, em vez de repassá-los aos editores.
Com o futuro de Mianmar ainda incerto, perturbado pela violência sectária e questões acerca do poder e da influência dos militares, os editores afirmam que existe uma grande necessidade de jornalismo de alta qualidade, mas os leitores se voltam a fontes pouco confiáveis.
U Thiha Saw, jornalista veterano que confrontou censores muitas vezes durante o governo militar, edita o único diário privado em inglês do país, "Myanma Freedom Daily".
"Nós apertamos o cinto, economizamos e vendemos nosso apartamento", afirmou Thiha Saw, vice-presidente da Associação dos Jornalistas de Mianmar. "Parentes e amigos colaboraram."
Ele tem pensado em recorrer a investidores externos, mas teme que o dinheiro possa vir "sob condições".
Para os editores, tanto os jornais estatais quanto os privados devem encontrar dificuldades a longo prazo. Com a melhora das conexões à internet e grandes empresas estrangeiras de telecomunicações prontas para instalar redes de celulares que poderiam colocar online dezenas de milhões de pessoas pela primeira vez, Mianmar deve seguir a tendência global de as pessoas procurarem notícias na internet.
"Os jornais são uma novidade neste país, e por isso todos estão publicando", declarou Sonny Swe, CEO do Mizzima.
"Porém, a intenção não é fazer jornais por dez anos. Nosso futuro é no segmento móvel."
Wai Moe colaborou com a reportagem
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