Os brasileiros tendem a ver o lado positivo das coisas, mesmo quando têm pouca razão para otimismo, ao contrário dos argentinos, seus vizinhos meridionais. Não é à toa que uns têm o samba, e outros, o tango.
O Brasil, como os Estados Unidos, também tem uma identidade nacional fortemente associada à absorção dos imigrantes, o que é outro ponto forte. Lembro que José Mindlin, industrial e bibliófilo de São Paulo, me disse certa vez: "No Brasil, costumo me preocupar com o fim do mês, mas nunca me preocupo com o futuro".
Três décadas depois dessas palavras, Mindlin, que morreu em 2010, provou que estava certo. Morei no Brasil de meados da década de 1980: o da hiperinflação, da pobreza escancarada e do desajuste econômico.
Agora, após 20 anos de relativa estabilidade, o país está diferente. A classe média cresceu. A pobreza extrema persiste, mas programas governamentais resolveram a pior parte dela. Vastas descobertas petrolíferas prometem uma nova riqueza. A Copa do Mundo e a Olimpíada estão chegando.
No entanto, velhos quebra-cabeças do Brasil permanecem. Nenhum país é tão violento por baixo de uma superfície sedutora. Os jornais estão cheios de reportagens sobre aumentos dos índices de homicídios. A corrupção parece mais desenfreada do que nunca. Ondas de protestos nas ruas manifestaram uma profunda insatisfação.
Um ditado que circula diz o seguinte: "Quanto tempo a Venezuela levou para virar Cuba? Quanto tempo a Argentina levou para virar a Venezuela? E agora quanto tempo vai levar para o Brasil virar a Argentina?".
Essa linha de pensamento injusta, mas reveladora reflete duas preocupações. A primeira, a de que o dinheiro do petróleo possa se tornar uma maldição, como ocorreu em outros lugares, corrompendo tanto quanto enriquece.
A outra é que as inclinações estatizantes do governo esquerdista da presidente Dilma Rousseff possam afetar a economia. Ela recriminou os Estados Unidos pelas acusações de espionagem, ao mesmo tempo em que levou o Brasil a estreitar ainda mais suas relações com Cuba.
Ainda estou otimista em relação ao Brasil. O pragmatismo é mais forte do que o idealismo no governo Dilma, e o empreendedorismo fazedor que impulsionou o país para frente perdura. Mas a característica definidora da nação a estranha combinação de sensualidade e crueldade, gentileza e violência não está prestes a desaparecer. Vai demorar até que a vida deixe de valer pouco nos trópicos brasileiros.
Possivelmente ninguém capturou tão bem as raízes desse caráter ambíguo quanto Gilberto Freyre no seu clássico estudo sobre os canaviais do Brasil colonial, "Casa Grande e Senzala". O mundo sensual do engenho de cana, onde o senhor branco e a escrava africana copulavam, lançou as bases de uma sociedade com linhas raciais mais brandas do que nos Estados Unidos, mas também com indignidades cruéis.
Peter Robb assim escreveu no seu "A Death in Brazil", ótimo relato impressionista sobre o país: "O que ligou os senhores aos escravos foi o sexo". Segundo ele, "era sexo reforçado pelo deslumbramento com o clima e pela doçura do açúcar, e também sexo tornado perverso pela cruel relação dos senhores para com os escravos". Para Robb, "séculos de acasalamentos indiscriminados haviam produzido um povo de bastardos voluptuosos".
Lendo as manchetes de hoje, alguns podem decidir ignorar os grandes fatos no Brasil. Seria um erro. As manchetes podem ser enganadoras, porque elas deixam de captar os fundamentos. No caso do Brasil, eles são positivos, apesar de todas as suas contradições impossíveis de erradicar.