O Masoch Cafe em Lviv, na Ucrânia| Foto: Fotos: Sergey Ponomarev/ The New York Times
Uma estátua de Leopold von Sacher-Masoch, cuja obra levou à criação do termo

Um dia, Taras Demlan saiu para beber com os amigos na cidade de Lviv, no oeste da Ucrânia – verdadeira joia do esplendor da arquitetura dos Habsburgo – e o convenceram a experimentar a especialidade da casa.

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A garçonete lhe tirou a camisa, amarrou-lhe as mãos no encosto da cadeira em que se encontrava e começou a derramar a cera derretida de uma vela no seu peito; a seguir, esfregou cubos de gelo e, para completar, lascou umas chicotadas nas suas costas.

"Foi bem desconfortável", resumiu ele sobre sua experiência no Masoch Cafe.

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Desconforto, entretanto, era exatamente o que queria Leopold von Sacher-Masoch, o escritor do século XIX que nasceu na cidade e inspirou o nome ao bar. Sua obra, "A Vênus das Peles", tece considerações filosóficas e descrições sobre o prazer sexual advindo da dor – e levou um professor de Psicologia de Viena, Richard von Krafft-Ebing, a criar o termo "masoquismo" para o que considerava um desvio mental.

Como recurso para chamar a atenção, o legado do escritor parecia imbatível em uma cidade que queria atrair turistas estrangeiros para uma antiga república soviética conhecida hoje em dia pelo caos político e pela queda de braço com o Kremlin do russo Vladimir V. Putin.

"Ele é famoso no mundo todo; foi ele que pôs nossa cidade no mapa", explica Yuri Nazuruk, diretor criativo da empresa que administra a casa.

Só que a ligação com o masoquismo não dá nenhum prazer aos guardiões da imagem de Lviv como berço do nacionalismo ucraniano que sobreviveu à União Soviética para se tornar uma das cidades mais belas e criativas da Europa. Eles preferem destacar outros aspectos do espírito imaginativo local – como a introdução, em 1853, dos primeiros postes de iluminação do continente.

"O pessoal daqui trata Sacher-Masoch como piada e não como um lance sério", diz Petro Kolodiy, líder da Câmara e do Svoboda, partido nacionalista que proíbe a filiação de ateus e promove o patriotismo calcado em "sangue e espírito comuns".

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Os jovens da cidade, entretanto, não se interessam por esses detalhes e transformaram a casa em ponto popular entre casais e grupos de amigos. Lviv está cheia de monumentos a heróis mais "sadios" — como Taras Shevchenko, o poeta considerado o fundador da literatura ucraniana moderna. O governo local não quer saber de tributos a Sacher-Masoch: o bar mandou fazer uma estátua de bronze em sua homenagem para pôr na entrada do estabelecimento e, ainda assim, gerou reclamações da prefeitura.

"Ele é provocador demais para um lugar como Lviv, conservadora em religião e tradição", afirma o cineasta Ihor Podalchuk, que nasceu na cidade.

Taras Voznyak, editor do jornal cultural Ji, diz entender por que "A Vênus das Peles" não é leitura obrigatória nas escolas e causa tanta preocupação, mas acha que a cidade está desperdiçando uma oportunidade lucrativa ao não vender uma imagem ligada a do escritor, como a austríaca Salzburgo fez com Mozart.

"Tudo bem que ele não é tão famoso como um compositor clássico, mas praticamente todo idioma do mundo inclui a palavra ‘masoquismo’", completa ele.