O que acontece com as lembranças esquecidas – digamos, senhas antigas e números de telefone de velhos amigos?

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Há tempos os cientistas têm duas teorias: uma diz que as mais velhas não perdem força, mas são ofuscadas pelas novas; a outra reza que as recordações anteriores vão enfraquecendo e que usar a mente para armazenar novas informações as afeta irreversivelmente.

Se a primeira for verdadeira, então as recordações são mais fáceis de recuperar – o que pode ser bom para quem está tentando se lembrar do nome de um conhecido, mas péssimo para aqueles que querem esquecer agressões sofridas. Agora um novo estudo diz provar que a capacidade pessoal de se lembrar de algo e o padrão de atividade cerebral que a cognição revela parecem diminuir quando uma lembrança se sobrepõe.

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Usando tomografias cerebrais, os autores da pesquisa – publicada no jornal Nature Neuroscience – parecem ter identificado “impressões neurais” de lembranças específicas, distinguindo padrões de atividade produzidos mediante a visão de um colar e a de um binóculo, por exemplo. Conduzido por cientistas em Birmingham e Cambridge, na Inglaterra, o processo foi dividido em vários estágios, com 24 participantes treinados primeiro a associar palavras às duas imagens; a seguir, deveriam completar a seguinte tarefa em um aparelho de tomografia: ao verem uma palavra-chave, tinham que relembrar a imagem que foram instruídos a associar a ela de modo que a figura se tornasse a lembrança dominante.

Por exemplo, se “areia” fosse associada primeiro a Marilyn Monroe e depois a um chapéu, os cientistas queriam que os participantes indicassem que se lembravam da atriz. Cada palavra apareceu no teste quatro vezes para que se pudesse confirmar se os participantes, olhando para a palavra “areia”, optassem cada vez mais por Marilyn Monroe e não pelo chapéu. Foi o que aconteceu.

A seguir, os especialistas quiseram saber o que acontecia com a lembrança do chapéu; assim, mostraram às pessoas duas fotos diferentes de Marilyn e duas de chapéus, perguntando quais delas foram treinados a reconhecer. A ideia era a de que, se a lembrança do chapéu não tivesse esvanecido, os voluntários escolheriam o correto, da mesma forma que tinham feito com a imagem da atriz.

Para medir o nível de acertos, os cientistas criaram um padrão: a precisão com que as pessoas se lembravam da imagem correta, mas aleatória, de uma pessoa famosa ou objeto, exibidas logo no início do procedimento, mas que não tinham motivos para serem lembradas, já que ninguém recebeu instruções para tal. Em termos de pessoas, havia duas fotos de Albert Einstein – e aqueles que escolheram a Marilyn Monroe correta também escolheram o Einstein certo. Em relação aos objetos, havia duas representações de óculos de proteção, dos quais as pessoas se lembraram melhor do que do chapéu correto.

Brice Kuhl, professor da Universidade de Nova York que participou do estudo, disse que as memórias que competem umas com as outras ficam mais fracas. “Você imagina que serão melhores ou pelo menos semelhantes as das imagens padrão, afinal você tinha um lembrete para o chapéu, a tal da palavra-chave”. Segundo ele, o fato de as pessoas terem problemas para se lembrarem do chapéu correto não quer dizer que tenha sido eclipsada pela de Marilyn Monroe. “A essa altura, é difícil imaginar que a sua incapacidade em escolher o chapéu correto tenha alguma coisa a ver com Marilyn Monroe”.

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A seguir, os pesquisadores obtiveram uma “assinatura neural” no córtex pré-frontal enquanto os participantes viam cada figura seis vezes, explica a autora do estudo, Maria Wimber. Combinando essas marcas com os padrões cerebrais do teste da palavra-chave, os especialistas perceberam que quando a palavra “areia” era exibida primeiro, o cérebro das pessoas refletia o padrão Marilyn/chapéu, mas depois que ela era repetida, os traços do objeto iam desaparecendo. “Observamos que as lembranças iam sendo suprimidas, foram enfraquecendo. E não só porque as lembranças-alvo ficaram mais fortes; as outras também definharam”, explica a Dra. Wimber.

Essa interpretação não é necessariamente aceita pelos que defendem a teoria da memória eclipsada. “Até aceito que os padrões cerebrais se tornem cada vez menos semelhantes ao chapéu; é possível também que a pessoa aprenda a pensar em algo que não seja o dito objeto”, afirma David E. Huber, da Universidade de Massachusetts em Amherst.

Kenneth Norman, neurocientista da Universidade de Princeton em Nova Jersey, que não participou do estudo, explica que as aplicações terapêuticas de enfraquecimento das lembranças incluem a eliminação de medos específicos, como de cobras, por exemplo.

“Se você mostra a alguém o desenho fofinho de uma cobra, naquele momento você estimula o gostar do réptil, que supera o não gostar. Se quiser enfraquecer ou apagar uma lembrança, o que tem a fazer é livrar-se dela. É um processo da memória estimulada semelhante a um concorrente que perde a competição”, explica.