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Lesmas-do-mar atlânticas invasoras cobrem o leito do mar ao largo de Cancale | Catalina Martin-Chico paraThe New York Times
Lesmas-do-mar atlânticas invasoras cobrem o leito do mar ao largo de Cancale| Foto: Catalina Martin-Chico paraThe New York Times

Nesta extremidade tempestuosa da baía do monte Saint-Michel, as marés fortes submergiram a divisão entre terra e mar. Os pescadores levam seus barcos com rodas diretamente para dentro da baía para colher sua "safra": crustáceos de tipos diversos que são prezados em toda a França.

Mas agora suas redes estão sendo ocupadas por uma espécie invasora: a "crépidule" (gastrópode do gênero Crepidula), um tipo de lesma-do-mar que se espalhou a partir da costa leste dos Estados Unidos.

Os pescadores de ostras e mexilhões desta região observam, impotentes, a colônia tomar conta de sua bela baía repleta de fitoplânctons, os microorganismos que a tornam convidativa para crustáceos de todo tipo e conferem à água um tom turquesa.

É aqui que entra em cena Pierrick Clément, um empreendedor local que olhou a lesma-do-mar invasora e fez uma pergunta impensável numa cidade cuja subsistência se baseia na fartura de frutos-do-mar: as pessoas comeriam o bichinho insidioso?

"Como empresário, enxergo uma oportunidade aqui", diz, depois de tirar com uma faca uma lesma ainda viva de sua casca.

As lesmas-do-mar, que ele descreve afetuosamente como "o problema", podem tornar-se uma iguaria, servidas cruas ou cozidas, disse Clément.

A lesma, um pedacinho de carne alaranjada que se comprime dentro da concha, tem sabor um pouco semelhante ao de vieiras e búzios, mas nunca foi vista como alimento comum.

A comunidade de Cancale agora está dividida entre o asco e o alívio diante do projeto de Clément de pescar e vender as lesmas-do-mar para consumo humano.

Depois de anos de esforço, Clément persuadiu municípios e produtores locais a apoiar seu projeto e iniciar uma campanha para reabilitar a imagem da lesma-do-mar.

O bichinho ganhou um novo nome, "berlingot des mers", termo poético que destoa dos apelidos um tanto vulgares que tinha conquistado aqui devido a seu modo de reprodução frenético.

Clément cresceu mergulhando para pescar ostras, haliotes e ouriços-do-mar e, como a maioria dos bretões, nunca tinha pensado em comer a onipresente lesma-do-mar atlântica.

Então descobriu um mecanismo capaz de abrir as conchas das lesmas invasoras, em escala industrial, sem ferir a carne, e rapidamente investiu € 1 milhão (R$ 3,1 milhões) em pesquisas e desenvolvimento.

Agora ele distribui pacotes de carne congelada de lesma-do-mar a lojas e restaurantes. Ele também tem planos de reutilizar as conchas, ricas em cálcio, em materiais de construção e para melhorar o solo ácido da costa da Bretanha, onde nasceu.

Sua fábrica-piloto, situada entre as criações de ostras da vizinha Le Vivier-sur-Mer, envia a carne da lesma-do-mar para algumas lojas e restaurantes da França, Espanha e Alemanha.

Clément espera com o tempo chegar a processar até 90 mil toneladas de molusco por ano, volume suficiente para contrabalançar o crescimento da espécie nas baías de Mont Saint-Michel, Saint-Brieuc and Morlaix.

Seu plano é vender o produto nos mercados americano, japonês e chinês, onde elas talvez tenham reputação melhor.

As lesmas-do-mar estão presentes em grande número na Bretanha desde a década de 1970, tendo sido trazidas por navios que transportavam ostras. Foram lançadas diversas campanhas para exterminá-las, mas sem resultado.

Joseph Jambon, diretor do sindicato local de produtores de crustáceos, concordou em dividir seu barco de pesca de ostras com Clément.

Jambon disse que as lesmas são um veneno para suas ostras e uma praga na baía, mas são ótimas em um molho de espaguete.

Clément tem o apoio de outras figuras influentes que formam paladares –ou seja, chefs premiados da Espanha, do Japão e até da França. Um deles é Gaël Orieux, mergulhador amador em águas profundas que costuma incorporar o "berlingot des mers" nos pratos que cria para o restaurante Auguste, em Paris.

"Tem sabor de água do mar, mas também é um pouco doce", com um gostinho final amargo", disse Orieux, acrescentando que a lesma "possui sua própria identidade". Se mais chefs concordarem com ele, esse molusco pode acabar se insinuando na culinária francesa.

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