Um restaurante ficava a poucas quadras do Senado. Um café se situava no distrito diplomático, e a sorveteria ficava próxima ao Panteão.
Esses estabelecimentos comerciais pareciam normais, até que uma operação policial promovida em Roma as expôs como fachadas para a lavagem de dinheiro de organizações mafiosas do sul da Itália. Em janeiro e fevereiro, autoridades italianas apreenderam propriedades e outros bens de mafiosos no valor de 51 milhões (cerca de US$ 70 mi) em Roma, propiciando um vislumbre dos interesses comerciais legais da capital controlados por clãs do sul.
A repressão em Roma expôs apenas um cantinho pequeno de algo que as autoridades descrevem como uma economia mafiosa que se dissemina rapidamente pela Europa. Numa era de austeridade, com a Itália endividada e lutando para se recuperar, grupos do crime organizado têm pilhas de dinheiro disponível. Eles vêm aproveitando a crise econômica para acelerar a infiltração de negócios legítimos em locais fora de seus redutos no sul da Itália e agora controlam interesses comerciais em Roma e Milão, além da França, Alemanha, Holanda, Escócia, Espanha e outros países.
"As máfias vêm tendo muita liquidez nos últimos 20 anos", afirmou Michele Prestipino, o promotor responsável pela repressão em Roma. "Isso é um problema hoje. Elas têm dinheiro demais, não conseguem investir tudo. É o oposto do que acontece com empreendedores legítimos."
Especialistas dizem que além dos grupos mafiosos italianos, outras organizações criminosas, incluindo algumas da Albânia, China e Rússia, estão penetrando em setores econômicos legítimos na Europa. A Confesercenti, uma das maiores associações comerciais da Itália, estima que o crime organizado movimenta cerca de 130 bilhões (US$ 180 bilhões) anualmente, algo como 7% do PIB italiano.
"Algumas investigações indicaram que o fluxo de dinheiro é tão conspícuo que, em vez de ser contado, o dinheiro é pesado em balanças", disse David Ellero, da polícia europeia Europol.
Acredita-se que a família mais rica do crime organizado seja a Ndrangheta, um grupo da região da Calábria que controla boa parte do comércio de cocaína na Europa. Analistas dizem que a Ndrangheta é ativa no Reino Unido, França, Alemanha, Espanha e Suíça. As outras organizações principais são a Camorra, os clãs sediados na região de Nápoles, que são especialmente poderosos no sul da Espanha; e a Cosa Nostra, as famílias mafiosas sicilianas que atuam em toda a Europa.
Um relatório apresentado recentemente a representantes da União Europeia concluiu que as máfias estão presente em quase todos os setores: hotéis, boates, setor imobiliário, jogos de azar, construção, vendas de gasolina no varejo, setor atacadista de roupas e joias, processamento de alimentos, saúde, energia renovável e outras áreas.
"Elas têm preferências específicas por determinados setores", explicou Michele Riccardi, pesquisador do instituto Transcrime, de Milão, que compilou o estudo. "São os setores que parecem ser mais vulneráveis e menos regulamentados."
A revista alemã "Der Spiegel" noticiou em abril um julgamento em Colônia em que investigadores acusam mafiosos ligados à Cosa Nostra de fraudar milhões de euros do Estado, emitindo faturas falsas de empresas de construção que atuam como fachadas.
A revista citou uma revisão confidencial feita pelo Escritório da Polícia Criminal Federal que concluiu que a Camorra vende bens de consumo falsificados e a Ndrangheta está vendendo azeite de oliva e outros produtos alimentícios adulterados. Ainda segundo o documento, mafiosos controlam pelo menos 300 pizzarias na Alemanha e estão usando essas empresas para ingressar na economia legítima.
A consciência do problema está começando a crescer. Em fevereiro as autoridades italianas e alemãs lançaram uma operação conjunta contra a Cosa Nostra e prenderam mais de uma dúzia de suspeitos acusados de roubar milhões de euros em subsídios agrícolas da União Europeia.
A operação de repressão recente em Roma revelou como grupos do crime organizado estão investindo diretamente em empresas. Entre os 23 restaurantes tomados em janeiro estava o Pizza Ciro, que faz parte de uma rede.
"O objetivo [das máfias] não é que haja dinheiro no caixa no final do dia", disse Enrico Fontana, do Libera, grupo que reúne associações de combate às máfias. "É a lavagem de dinheiro".
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