Às vezes parece que não existe mulher em Washington que não cometa pelo menos cinco dos sete pecados capitais.
Avareza, luxúria, inveja, ira e orgulho são as moedas correntes do poder na cidade, e algumas das operadoras mais perigosas que trabalham com elas são mulheres na televisão.
No seriado "House of Cards", a maquiavélica Claire Underwood, representada por Robin Wright, ajudou seu marido a tomar conta da Casa Branca.
E a televisão tem inúmeras personagens semelhantes, como Olivia Pope (Kerry Washington), a operadora política destruidora de lares de "Scandal", além de praticamente todas as outras personagens de destaque nesse melodrama da ABC.
Selina Meyer, a vice-presidente representada por Julia Louis-Dreyfus em "Veep", comete os sete pecados do Capitólio, incluindo preguiça e gula.
Não é difícil entender por que tantos seriados têm tramas baseadas na capital americana. O terreno político é conhecido: como o show business, Washington interessa a todo o mundo.
Numa era pós-11 de setembro, quando ataques terroristas são um perigo real e não ameaça de histórias em quadrinhos, é conveniente ambientar histórias de conspirações e malfeitos globais em vestiários do Senado e salões de baile da Casa Branca.
Sobretudo, porém, existe tanto desprezo pelos políticos que esse sentimento supera até mesmo os tabus mais entranhados relativos ao retrato feito de mulheres na televisão aberta.
Ninguém espera encontrar uma heroína virtuosa no Congresso ou na Casa Branca. O feminismo não venceu todas as batalhas, mas pelo menos ensinou os executivos da mídia a se preocuparem com acusações de sexismo ou misoginia.
Na maioria dos seriados dramáticos, seria praticamente impensável mostrar protagonistas femininas sendo egoístas, covardes ou incompetentes, especialmente quando são detetives, bombeiras ou médicas.
As heroínas de séries como "NCIS: Los Angeles" ou "The Blacklist" são notavelmente semelhantes: fortes, belas, dedicadas e entediantes.
Mesmo a televisão paga, com seu pendor pelo lado sombrio da vida, confere à maioria de suas heroínas defeitos que são transgressivos, mas perdoáveis.
Em "Nurse Jackie" (Showtime), Edie Falco é uma enfermeira que tem um vício, e em "Orange Is the New Black" (Netflix), Taylor Schilling faz uma detenta que cumpre pena por envolvimento com drogas. As duas são personagens atraentes, mesmo quando seus atos não o são.
A exceção mais gritante a essa regra está em Washington, onde, aparentemente, não há nada de sexista ou antiquado em retratar mulheres como sendo mercenárias, interesseiras e manipuladoras. Não são criticadas apenas as políticas eleitas: funcionárias públicas são vistas como suspeitas.
Em "The Americans", da FX, existe uma boa razão: o seriado trata de uma equipe de agentes da KGB que se fazem passar por americanos casados comuns, moradores de subúrbios, da era Reagan. Nesse seriado, as heroínas fazem coisas terríveis.
Elizabeth (Keri Russell) deixou um informante estrangular sua protegida, uma jovem revolucionária nicaraguense, porque o ardor da moça poderia comprometer a missão da qual Moscou os tinha encarregado.
A avareza levou Nina (Annet Mehendru), funcionária da embaixada russa, a cair nas garras do FBI. Mas a luxúria, especialmente a de outras pessoas, a mantém ativa, ocupada roubando segredos das duas partes.
"Veep" é uma comédia absolutamente brutal sobre política. Selina, que é candidata à Presidência, é avisada que precisa explicar sua posição em relação ao aborto. Um assessor sugere que ela dê sua visão como mulher.
"Não, não, não", ela cochicha, horrorizada. "Não posso me identificar como mulher. As pessoas não podem saber disso. Os homens odeiam isso, e as mulheres que odeiam mulheres odeiam isso e acho que é o caso da maioria das mulheres."
O seriado da Web "Chasing the Hill" é um olhar cínico, em estilo "cinema-vérité", sobre as campanhas políticas; o tom é mais de tristeza que de sátira.
Robin Weigert faz o papel de Kristi Ryan, uma deputada da Califórnia que enfrenta uma batalha árdua para se reeleger. Kristi não é um monstro, mas tampouco é uma figura exemplar: é tão amargurada, egoísta e de pavio curto quanto qualquer outro deputado.
As ficções focam tanto sobre as vilãs de Washington em parte porque ainda é perigoso atacar políticas mulheres na vida real.
O comitê de ação política Emilys List, que apoia candidatas que defendem o direito de aborto, transformou declarações sexistas numa ferramenta útil de levantamento de fundos.
Até Hillary Clinton, satirizada com frequência, consegue reformular alguns ataques. Seus partidários atribuíram um viés misógino quando Barack Obama a descreveu como "bastante amável" em debate em 2008.
Existe um tipo de igualdade de gêneros em Washington. Na televisão, esse é o único lugar onde as mulheres são tão ruins quanto os homens.