Para muitos bolivianos, o novo sistema de teleféricos é um símbolo do progresso de seu país| Foto: Meridith Kohut PARA The New York Times

Nessas duas cidades, geografia e estratos sociais têm relação oposta. La Paz, a sede do governo, de fortunas tradicionais e de uma elite de pele mais clara, fica em um vale. Acima dela, em um platô, está El Alto: mais pobre, mais jovem e geralmente mais morena. La Paz sempre desprezou a vizinha mais elevada.

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Agora, essa espécie de paradoxo urbano, em que a parte baixa abriga a classe alta e a parte alta abriga a classe baixa, está passando por uma mudança. Um sistema de teleféricos para transporte coletivo, um híbrido entre teleféricos de esqui e trem elevado, está sendo instalado para conectá-las melhor.

A primeira linha do sistema, que parte de uma área perto do centro de La Paz e vai além da beira do platô em El Alto, começou a transportar passageiros em 31 de maio. Outra linha deve entrar em operação em setembro, e a terceira, no mês seguinte —a tempo para as eleições em 12 de outubro, na qual o presidente Evo Morales concorre a sua terceira gestão.

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Morales, que ordenou a construção do sistema, anunciou recentemente que construirá mais cinco linhas. Isso faz parte de um plano diretor que Cesar Dockweiler, o coordenador-geral do projeto, disse que poderá ter 18 linhas chegando ao piso do vale na Zona Sul de La Paz, onde moram os ricos, e até o platô, onde vive a população pobre de El Alto.

A Bolívia, nação mais pobre da América do Sul, lançou recentemente seu primeiro satélite de comunicações, cercado de muita propaganda sobre o progresso do país. Mas muitos bolivianos demonstram mais entusiasmo pelos teleféricos, que, no fim das contas, são muito mais acessíveis e confortáveis.

A primeira linha, a Vermelha, transportou 2 milhões de passageiros em 51 dias desde que passou a funcionar, o que superou largamente as projeções mais otimistas. Alguns usuários são trabalhadores, mas muitas pessoas utilizaram o transporte apenas por curiosidade. O teleférico tornou-se uma atração na área por ser uma novidade e pelas vistas amplas que descortina de La Paz e das montanhas ao redor. O movimento maior é às quintas-feiras e aos domingos, quando há uma feira nas ruas de El Alto.

"Isto é uma maravilha", disse o gráfico Carlos Flores, 60, em uma longa fila para embarcar em um teleférico em um domingo recente na Estação Central de La Paz. Referindo-se a uma das maravilhas naturais de seu país, Flores comentou: "Nós dizemos que o lago Titicaca é uma maravilha, e agora temos outra".

Outras cidades sul-americanas, como Medellín, na Colômbia, e Caracas, na Venezuela, têm teleféricos. No entanto, em lugar algum teleféricos são a espinha dorsal de um sistema de transporte coletivo, afirmou Torsten Bäuerlen da Doppelmayr, a empresa austríaca que está construindo as três primeiras linhas.

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La Paz, a capital mais alta do mundo, fica 3.600 metros acima do nível do mar e desce pelas encostas íngremes de um vale, o que inviabiliza sistemas de metrô ou trem. Além disso, ônibus estão sujeitos a congestionamentos de trânsito comuns em ambas as cidades.

"A solução para nós seria construir literalmente um metrô aéreo", disse Dockweiler.

A tarifa do teleférico é de cerca de R$ 1, o dobro da cobrada nos micro-ônibus que atravancam as ruas. Os micro-ônibus, porém, ostentam a justa fama de serem sujos e lotados, com motoristas muitas vezes rudes que cobram acima da tarifa estabelecida e não deixam idosos e pessoas com crianças embarcarem.

O custo de US$ 234 milhões (R$ 531 milhões) das três primeiras linhas foi pago em dinheiro da vasta reserva de divisas acumulada pelo Banco Central do país durante vários anos de crescimento econômico impressionante, impulsionado pela venda de gás natural aos vizinhos Brasil e Argentina.

O governo considera o sistema de teleféricos como uma maneira de aproximar La Paz e El Alto e usa slogans publicitários como "Unindo nossas vidas" e "Um ponto de encontro".

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"A malha de teleféricos possibilitará um diálogo e uma conexão entre as duas culturas", opinou René Pereira, diretor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade San Andrés, em La Paz.

"Isso quebrará barreiras e, provavelmente, nos fará refletir seriamente sobre a realidade na Bolívia", disse.