A notícia da morte de Philip Seymour Hoffman no início deste mês, aparentemente causada por uma "overdose" de heroína, provocou uma reação visceral nas reuniões dos Alcoólicos Anônimos (AA) e Narcóticos Anônimos (NA), onde muitas discussões rapidamente passaram da morte de um grande ator para como a sobriedade é precária, não importa há quantos anos as pessoas estejam "limpas".
Outros dependentes em recuperação, alguns muito conhecidos, escreveram na internet sobre sua dor, suas lutas e o medo de sofrer recaídas.
A overdose de Hoffman, 23 anos depois de ele declarar que havia parado de usar drogas ou álcool, período em que falou abertamente sobre suas dependências, foi discutida em reuniões em igrejas e sinagogas.
"Estive em três reuniões desde que isso aconteceu", disse Rita, que estava em um restaurante em Nova York depois de um encontro de recuperação. "Não houve uma só reunião em que eu não tenha ouvido falar a respeito. As pessoas públicas veem o fato como: Perdemos um grande talento. As pessoas em recuperação o veem como: Perdemos um irmão de luta."
Uma mulher que participou de uma reunião do AA em Los Angeles disse que "as pessoas só conseguiam falar" sobre Hoffman, mas acrescentou que nenhum dos participantes, cientes do segundo "A" de AA, realmente falou o nome do ator.
Nas circunstâncias da morte de Hoffman houve algo que comoveu profundamente as pessoas que estão sóbrias, mas lutam diariamente para manter sua dependência à distância.
Sua conversa rapidamente passou de tristeza e choque sobre a morte de Hoffman para um tom mais pessoal: o que isso significa para mim, dependente de álcool e drogas em recuperação? Todos os meus anos de sobriedade, anos em que lutei para ficar sóbrio, poderão ir embora mais facilmente do que eu acredito? Se isso aconteceu com alguém universalmente respeitado por seus colegas, alguém que falava abertamente sobre seus anos de sobriedade, também poderá acontecer comigo?
"Eu chorei quando soube de Philip Seymour Hoffman", escreveu Seth Mnookin em um ensaio na Slate. "A notícia me assustou."
Mnookin escreveu sobre como seus próprios anos de dependência primeiro do álcool e depois da heroína começaram, quando ele ainda era adolescente, e como, apesar de agora estar limpo, ter-se casado e ter uma filha pequena, temia quase diariamente o tipo de tentação que parece ter atraído Hoffman.
Morte de Hoffman abala dependentes químicos
"Há muita coisa que não sabemos sobre o alcoolismo e o vício em drogas", escreveu Mnookin, "mas uma coisa é certa: independentemente de há quanto tempo você está limpo, a recaída sempre é tão fácil quanto levar a mão até a boca."
Hoffman parecia ser o modelo perfeito. "Ele era um ator extremamente talentoso e todo mundo sabia que estava sóbrio", declarou Gregory, que disse ter trabalhado em uma peça com Hoffman e citou o autor como uma pessoa que o ajudou a superar o vício. "Mas ele não ficava dizendo: Ei, estou no AA, cara."
Por ser tão casual e discreto a respeito, acrescentou Gregory, Hoffman era um "exemplo poderoso" para ele, mais que uma espécie de "porta-voz de programas de recuperação" ou alguém que "parecia apreciar a ideia de estar sóbrio em público como membro de um elenco de celebridades reabilitadas".
"Lembro-me de ouvi-lo falar em uma reunião", disse Chris, outro dependente em recuperação. "No meu entender, ele patrocinou uma tonelada de atores. Na época eu pensei: Estou muito feliz que ele esteja ficando famoso, em vez de mais um rosto bonito. Ele ficou sóbrio jovem. Realmente pôs sua vida em ordem e conseguiu cultivar esse talento nascente, mesmo sem ser o ator principal. Fazia mais de 20 anos que ele estava sóbrio e, naquela época, estava superpresente e responsável. Há outras pessoas que entram e saem [da recuperação] com as estações. Mas ele estava lá."
Para pessoas que tiveram recaída depois de alcançar um longo período de sobriedade e lutaram para voltar, a morte de Hoffman foi um golpe especialmente duro.
"Ele sou eu", disse Jim, dependente químico que disse que teve uma recaída depois de mais de 20 anos em recuperação e que voltou a ficar sóbrio em 2006. "Sua história é semelhante à minha. Eu estive 21 anos [limpo], mas tinha dores terríveis nas costas. Um dia, estava em Marthas Vineyard e alguém disse: Você quer um Fioricet? É basicamente um remédio para enxaqueca. Tomei aquela pequena pílula azul e fiquei ótimo, de uma maneira que não me sentia havia 21 anos. Tive aquela maravilhosa sensação que não se tem quando sóbrio. De repente, estou em uma festa e alguém diz: Você quer uma pedra? Eu nem sequer sabia o que era crack. No dia seguinte, estava ligando para o traficante daquele sujeito."
Ele continua incrédulo diante do fato de que não morreu; de que conseguiu voltar aos Alcoólicos Anônimos quando tantos outros não conseguem, entre eles Hoffman. "Por que eu tive um momento em que consegui voltar, e ele não? Isso é um mistério", disse Jim.
Henry, outro que está sóbrio há muito tempo, disse: "Todos sabemos de amigos íntimos que depois de muitos anos, por um motivo ou outro, não conseguiram se agarrar a esta vida. Todos conhecemos pessoas com quem isso aconteceu. É excepcional, é incomum, mas também é de uma frequência perturbadora."
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