Numa tarde clara, quase cem anos atrás, um navio de passageiros britânico começou a afundar na costa da Irlanda, adernando violentamente enquanto era sugado para dentro do oceano. “Pessoas desesperadas corriam impotentes, subindo e descendo as plataformas”, escreveu uma testemunha, horrorizada, acrescentando: “Foi a pior coisa que eu já vi. Não tive como ajudar”.
A testemunha era Walther Schwieger, capitão de um submarino alemão que, poucos minutos antes, havia disparado um torpedo contra o navio, o “Lusitania”, matando 1.198 dos seus 1.959 passageiros, num dos mais devastadores desastres marítimos da história.
Aproximadamente 95 anos mais tarde, Erik Larson, autor de best-sellers de base histórica como “O Demônio na Cidade Branca” e “No Jardim das Feras”, topou com o diário de Schwieger e com outros depoimentos dramáticos na Universidade de Stanford, na Califórnia. A complexidade de Schwieger como personagem fascinou Larson e ajudou a convencê-lo de que havia encontrado o tema do seu próximo livro.
Cinco anos e oito rascunhos depois, “Wake Dead” (inédito no Brasil) se candidata a ser um dos maiores títulos de não ficção do ano. Larson transforma a destruição do “Lusitania”, já amplamente narrada, em uma espécie de thriller geopolítico. Dias antes do seu lançamento, “Wake Dead” já aparecia em primeiro lugar na lista de mais vendidos da Amazon.
Embora a história do “Lusitania” parecesse ideal para Larson, ele relutou em encará-la. Mas, quando começou a ler os arquivos de Stanford, percebeu que não sabia muito sobre o naufrágio do “Lusitania”, e muito do que ele achava que sabia estava errado.
Larson passou os dois anos seguintes coletando material em Thorsminde (Dinamarca), Londres, Liverpool e Cambridge (Reino Unido). Estudou telegramas de guerra interceptados, manuais de código usados pelos militares britânicos, cartas de amor, diários, laudos de autópsias, fotos de necrotério, depoimentos de sobreviventes colhidos durante um julgamento após o desastre e uma solicitação de indenização de seguro com mais de 180 páginas, feita por um sobrevivente que perdeu manuscritos e desenhos raros de Charles Dickens e William Thackeray. “É como estar envolvido em uma história de detetive, procurando aquela coisa que ninguém mais encontrou”, disse Larson.
Nem todo mundo acha que ele conseguiu. No “The New York Times Book Review”, o historiador e escritor Hampton Sides observou que, “do ponto de vista acadêmico ou do drama humano, não há muita novidade no livro”.
Outros argumentam que a obra de Larson combaterá equívocos generalizados sobre o ataque, como a visão de que o naufrágio levou os Estados Unidos diretamente para a guerra, como observou Mike Poirier, entusiasta da história do “Lusitania” e coautor de um livro sobre desastres navais na Primeira Guerra Mundial.
A editora de Larson espera ampliar a já considerável base de fãs do autor, aproveitando o centenário do naufrágio do navio, ocorrido em 7 de maio de 1915. Numa ação de marketing inteligente e um pouco macabra, a Crown está fazendo sorteios temáticos em parceria com revista “Travel + Leisure”, com o site de receitas “TasteBook” e com a empresa “Cunard Line”, que operava o “Lusitania”. O ganhador receberá uma cópia autografada do livro e duas passagens para um cruzeiro de uma semana pela Grã-Bretanha e Irlanda.
O livro não tardou a despertar a curiosidade dos fãs de Larson. Seus seis livros anteriores venderam juntos 5,5 milhões de exemplares. “Ele é mestre em nos fazer esquecer a história que nós achávamos que sabíamos”, disse Amanda Cook, editora de Larson na Crown. “Ele consegue criar suspense, mesmo quando sabemos como a história vai acabar.”
O autor bebe dos fatos, mas parece ter a ficção como modelo para os seus arcos narrativos e estilo de escrita. Ele lista os autores policiais Raymond Chandler e Dashiell Hammett como influências.
Larson já concluiu quatro romances, os quais está determinado a manter inéditos. Por enquanto, parece se contentar em exumar histórias da história, reunindo fatos de uma forma que nenhum romancista poderia apresentar sem causar descrença.
Já no fim de “Dead Wake”, Larson solta o detalhe horripilante de que, quatro meses depois de Schwieger afundar o “Lusitania”, ele torpedeou outro navio de passageiros, matando 32 pessoas. O navio levava o corpo de uma vítima do “Lusitania”, Frances Stephens, que seria enterrado no Canadá.