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O guardião de um lago denuncia poluidores chineses

“Se você pular nessa água, perde metade da pele”, lamenta Wu Lihong, na margem o Lago Tai, extremamente poluído |
“Se você pular nessa água, perde metade da pele”, lamenta Wu Lihong, na margem o Lago Tai, extremamente poluído (Foto: )

O mau cheiro que emana do Lago Tai e o brilho esverdeado meio esquisito de suas águas geralmente somem com a maré baixa do verão, mas este ano foi diferente. Apoiado na margem de concreto, olhando para o acúmulo fétido de garrafas plásticas, embalagens de isopor, chinelos e peixes mortos, Wu Lihong, o guardião extraoficial do lago balança a cabeça, desgostoso.

"Se você pular nessa água, perde metade da pele. O governo alega que está limpando o lago, mas, como se vê, não é verdade", lamenta.

Sete anos depois de uma "explosão" de algas que forçou milhões de pessoas a dependerem dele como fonte alternativa de água potável, o Lago Tai, que serve duas províncias do delta do Rio Yangtzé, continua sendo o símbolo latente da incapacidade chinesa de solucionar seus problemas ambientais mais sérios.

Desde a crise de 2007, o governo já gastou bilhões de dólares na limpeza do lago – o terceiro maior corpo de água doce do país – mas os ambientalistas reclamam do resultado pífio. Além disso, centenas de fábricas de produtos químicos, tecelagens e olarias continuam a despejar seus detritos tóxicos nos riachos que deságuam no Lago Tai.

"Para muitas fábricas, o custo de violar a lei é menor do que o de cumpri-la", explica Ma Jun, um dos principais ambientalistas chineses.

Inalterada também continua a perseguição a Wu, um ambientalista autodidata de 46 anos que passou três anos preso por fraude, acusação, segundo ele, manipulada, punição por sua campanha contra os donos das fábricas e os aliados no governo.

Entretanto, desde que foi solto, em 2010, Wu continua sua luta. Por conta disso, às vezes é obrigado a passar períodos de confinamento em casa, em Zhoutie, vilarejo às margens do lago; seu celular é monitorado pela polícia e não pode ir além de Yixing, município no leste da província de Jiangsu que inclui Zhoutie.

Por telefone, um funcionário do departamento de segurança pública da cidade negou que a liberdade de Wu esteja sendo restringida.

Objeto da revolta popular causada pela poluição do ar, da água e do solo, o Partido Comunista se dispôs a fechar siderúrgicas obsoletas, restringir o número de placas disponíveis aos motoristas das cidades maiores e reavaliar os critérios de crescimento econômico a todo custo usado pelas autoridades locais.

Muitas delas, porém, são contra as políticas que temem fechar fábricas e eliminar postos de trabalho. E também preferem lidar com os problemas ambientais à sua própria maneira – quando se dispõem a isso.

Em 2007, quando se preparava para entrar na justiça contra a agência ambiental, Wu foi acusado de tentar extorquir uma empresa em troca de acusações de irregularidades – e afirma ter sido, durante o interrogatório, açoitado com galhos de árvores, queimado com pontas de cigarro e mantido na solitária. "A violência foi maior do que pude suportar, então é claro que assinei a confissão redigida pro eles", explica.

No mesmo ano, pouco depois do início de seu julgamento, o lixo industrial despejado no lago pelas duas mil fábricas da região atingiu o ponto máximo, gerando a "explosão" de algas que forçou as autoridades da cidade vizinha de Wuxi a cortar o fornecimento de água de dois milhões de moradores.

O governo de Jiangsu disse que ia gastar mais de US$14 bilhões para limpar o lago e jurou resolver o problema das algas em, no máximo, cinco anos.

Só que os pesquisadores governamentais reconhecem que o impacto dessa dinheirama foi insignificante. Dwe acordo com a Autoridade da Bacia do lago Tai, 90 por cento das amostras de água do lago retiradas este ano foram consideradas tão tóxicas que recomendaram não entrar em contato com a pele humana.

Em abril, o governo central reformou a lei ambiental que rege o país, impondo multas pesadas aos poluidores e exigindo das empresas transparência no gerenciamento dos poluentes. A nova legislação, que entra em vigor em janeiro, vai permitir também que os grupos ambientalistas processem as companhias que a violarem.

Para Wu, no entanto, a limpeza de seu amado lago exige mais do que uma mudança radical.

"Se com todo o dinheiro que tem o Partido Comunista não consegue limpar esse lago, é sinal que o buraco é mais embaixo. Percebi que a raiz do problema é o próprio sistema", conclui ele.

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