Dizem que o futuro pertence a quem traça planos para ele. Agora, astrônomos que trabalharam arduamente estão prestes a ter algo para mostrar por seus esforços.
Mais de dez anos depois de grupos concorrentes terem começado a buscar recursos para construir telescópios gigantescos, capazes de estudar os planetas que orbitam estrelas distantes e o nascimento de galáxias na aurora do tempo, essas novas ferramentas vão começar a entrar em ação no alto de montanhas no Havaí e no Chile, na maior, mais cara e mais ambiciosa onda de criação de telescópios na história da astronomia. Se tudo correr conforme o previsto, os astrônomos da década de 2020 vão nadar em petabytes de dados que chegarão por "streaming" do espaço e da Terra.
No último 20 de junho, profissionais do Observatório Europeu do Sul (ESO) nivelaram o topo de uma montanha no norte do Chile chamada Armazones, preparando o terreno para aquele que se pretende que seja o maior e mais poderoso telescópio óptico jamais construído. Conhecido como o Telescópio Europeu Extremamente Grande, ou E-ELT, o aparelho terá um espelho segmentado com 39 metros de diâmetro, poderoso o suficiente para divisar planetas que orbitam estrelas distantes. Os maiores telescópios atuais têm dez metros de diâmetro.
O Observatório Europeu do Sul é um consórcio formado por 14 países europeus e o Brasil, que aguarda a ratificação pelo Congresso. A entrada do Brasil deve colocar o grupo a mais de 90% do caminho em direção aos US$ 1,5 bilhão (R$ 3,40 bilhões) em dólares de 2012, que é o custo projetado do telescópio, segundo Lars Christensen, porta-voz do consórcio. O telescópio está previsto para ficar pronto em 19 de junho de 2024.
Dois anos atrás, outro grupo de astrônomos nivelou o topo de outra montanha no Chile, Las Campanas, onde pretende construir o Giant Magellan Telescope (GMT). Este terá um conjunto de sete espelhos de oito metros reunidos para formar o equivalente a um espelho de 25 metros de diâmetro.
Wendy Freedman, dos Observatórios Carnegie, na Califórnia, um dos organismos que lidera a colaboração para o telescópio Magellan, disse que o grupo já levantou cerca de US$ 500 milhões dos US$ 880 milhões (R$ 1,13 bi dos R$ 1,997 bi, em dólares de 2012) necessários. Ela anunciou recentemente a entrada da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) no grupo. A construção do telescópio começará este ano.
No Havaí não será necessário nivelar nada com explosões bastará alguma terraplanagem no monte Mauna Kea, onde ainda outro grupo de astrônomos pretende construir um telescópio de 30 metros de diâmetro chamado simplesmente Thirty Meter Telescope (TMT), ou Telescópio de Trinta Metros num planalto pouco abaixo do pico de 4.300 metros de altitude.
O TMT vai custar US$ 1,2 bilhão (R$ 2,72 bi), em dólares de 2012. Até 2015, quando se prevê a entrada da Índia e do Canadá no consórcio, o grupo já terá 85% do dinheiro necessário, segundo seu co-diretor Michael Bolte, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz.
O refletor Hale, no monte Palomar, no condado de San Diego, Califórnia, era visto como o limite do que era possível na Terra, mas na década de 1980 astrônomos inventaram maneiras de construir espelhos maiores e mais finos que não vergassem, levando à criação de vários espelhos de oito metros e aos dois Kecks de dez metros. Mas o Magellan, o menor telescópio da nova variedade, será seis vezes mais potente que os Kecks.
O Telescópio Espacial Hubble, inaugurado em 1990 e previsto para continuar a transmitir dados até a década de 2030, tem apenas 2,4 metros de diâmetro. Sua potência vem do fato de estar acima da atmosfera, que embaça a luz vinda das estrelas.
Os novos telescópios serão equipados com uma tecnologia que não existia antes: a óptica adaptativa a capacidade de ajustar a forma dos espelhos de modo a minimizar ou cancelar os efeitos da turbulência atmosférica que faz as estrelas piscarem. Esses telescópios poderão detectar objetos mais tênues que o Hubble.
Os telescópios no Chile vão reforçar a posição de centro da astronomia mundial do deserto do Atacama, uma área muito seca, alta, escura e dotada de ar muito calmo. A região já tem o Atacama Large Millimeter/sub-millimeter Array, ou Alma, um projeto internacional que é o radiotelescópio mais caro do mundo, e o Very Large Telescope (VLT), do ESO, um conjunto de quatro telescópios de oito metros situado perto do local que vai obrigar o E-ELT.
O Largy Synoptic Survey Telescope (LSST) deve começar a ser construído em breve no monte Pachón, também no Chile. Esse telescópio, um projeto conjunto da Fundação Nacional de Ciência dos EUA e do Departamento de Energia, tem oito metros de diâmetro. A Fundação Nacional de Ciência reservou US$ 473 milhões (R$ 1,07 bi) em seu orçamento para sua construção. O Departamento de Energia está contribuindo com US$ 165 milhões (R$ 374,5 mi) para uma câmera de 3.200 megapixels que vai produzir uma imagem do céu a cada poucos dias e, ao longo de dez anos, um filme do universo, permitindo flagrar tudo que se move ou pisca.
E há o espaço sideral, onde estão as estrelas.
Dois anos atrás, nos Estados Unidos, o National Reconnaissance Office (NRO, uma agência de inteligência) deu à Nasa dois telescópios espaciais do mesmo tamanho e design que o Hubble. Conhecida como Wfirst-AFTA (Wide Field Infrared Survey Telescope-Astrophysics Focused Telescope Assets), a missão pode começar em 2023, mais ou menos na mesma época em que a Agência Espacial Europeia vai lançar seu próprio satélite, o Euclid, para investigar a energia escura.
E há o mais caro de todos e aquele que voará mais alto de todos, o Telescópio Espacial James Webb, da Nasa, quase três vezes maior que o Hubble, com espelho de 6,5 metros de diâmetro que, em órbita, terá que desabrochar como uma flor.
O telescópio Webb, com orçamento limite de US$ 8 bilhões (R$ 18,1 bi) e lançamento previsto para 2018, foi construído para estudar as primeiras estrelas e galáxias. Ele é projetado para registrar a radiação infravermelha, não a luz visível, porque os objetos a essa distância se afastam de nós em velocidade tão grande que sua luz foi "deslocada para o vermelho", para comprimentos de onda maiores.
Alguns astrônomos sugerem que os telescópios também poderão enxergar a poluição. Ao longo de alguns milênios de indústria, alguns desses gases podem acumular-se até chegar a níveis detectáveis de longe e podem permanecer assim por 50 mil anos.
Como escreveram em um artigo Henry W. Lin, estudante da Universidade Harvard, e outros, será um mau sinal se os astrônomos enxergarem poluição em volta de um planeta distante, mas não divisarem sinais de vida presente. A detecção, escreveram, "pode servir de aviso adicional à vida inteligente aqui na Terra sobre os riscos da poluição industrial."
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