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Mandela

Pai de uma nação, e de sua família

 | Keith Bernstein/Weinstein Company
(Foto: Keith Bernstein/Weinstein Company)

A lembrança mais antiga de Zindzi Mandela é a de estar sentada do lado de fora de uma delegacia de polícia de Pretória, África do Sul, em 1962, enquanto a mãe, Winnie, entregava o prato favorito do pai dela, Nelson Mandela, que estava preso lá dentro.

"Eu tinha 18 meses de idade, mas realmente consigo me lembrar daquele instante, sentada no carro, esperando minha mãe voltar. Eu devo ter percebido que havia algum tipo de trauma, e estava muito assustada. Ela estava demorando muito."

Zindzi Mandela relatava essa lembrança num bar de hotel em Manhattan mais de meio século depois. "Eu não imaginava quando era uma menina em Soweto, nem quando era uma moça envolvida na luta, que um dia iria sair daquele lugar e passar minha vida em quartos como este", ela contou.

A longa trajetória de uma vida estava na cabeça de Zindzi Mandela porque, na noite anterior, outro filme sobre seu reverenciado pai, que viria a morrer em cinco de dezembro aos 95 anos, teve sua estreia. E o filme – "Mandela: Long Walk to Freedom", baseado na autobiografia do estadista e com previsão de lançamento mundial em fevereiro – conta a história complicada e nem sempre edificante de sua vida, da infância num vilarejo rural à imersão na batalha contra o apartheid, a liderança do Congresso Nacional Africano (CNA), os 27 anos na prisão e o triunfo.

Alguns dos filmes mais famosos sobre Nelson Mandela, como "Invictus", de Clint Eastwood, se concentraram num episódio de sua vida. Porém, essa não foi a opção desta vez. "Nós estávamos adaptando o livro dele", contou o diretor, Justin Chadwick. "Assim, era preciso ter a jornada inteira."

Chadwick e o roteirista, William Nicholson, optaram pela perspectiva da família de Mandela. Embora existam trechos calmos explicando o complexo jogo de xadrez que Nelson Mandela jogou com P.W. Botha, F.W. de Klerk e outros líderes do apartheid, o núcleo do filme envolve os relacionamentos vacilantes com sua família.

Segundo Chadwick, o fato de Winnie Mandela, Zindzi e outros filhos de Mandela atuarem como "consultores históricos" oficiais foi sensato, pois todos estavam tão dispostos quanto ele a retratar Nelson Mandela por completo, incluindo suas falhas. "Ele é um ser humano", afirmou Zindzi Mandela. "Extraordinário, mas sem deixar de ser humano."

Não se trata exatamente de uma história contando toda a verdade. Nelson Mandela é mostrado como um líder grandioso e inspirador que via mais claramente e lutava de forma mais resoluta do que todos. Porém, permite-se a presença de sombras e contradições, começando pelos vários casos amorosos que ele teve e chegando ao seu desaparecimento na luta contra o apartheid que deixou a esposa e os filhos mergulhados na mais profunda pobreza. Winnie também não é poupada, emergindo como uma esposa raivosa e distante que apoia a vingança violenta.

"Temos o direito de não sermos hipócritas com Mandela, como costuma ser o caso nos filmes que narram biografias", afirmou Idris Elba, ator britânico mais conhecido pelos papéis na televisão em "A Escuta" e "Luther", que interpreta Mandela.

Segundo a filha, nunca um filme havia tentado capturar toda a trajetória do seu relacionamento distante e fraturado com o pai e o rompimento doloroso do casamento dos pais.

Naquela época, em público Nelson Mandela era genial, ainda que um pouco ao estilo refinado e formal, mas sempre pronto a flertar com mocinhas nos elevadores da sede do CNA em Johanesburgo. Porém, o personagem às vezes irritado e desesperado que surge aqui e ali na interpretação de Elba sempre era mantido nos bastidores, embora os auxiliares mais próximos por vezes descrevessem explosões furiosas.

"Era preciso ser da família para ver esse lado de sua personalidade", disse Zindzi Mandela. "Quando ele começava a cadenciar as palavras, você sabia que estava enrascada."

O partido Inkatha, de base zulu, com quem os partidários do CNA batalhavam nas cidades no começo da década de 1990, não é mencionado. Em vez disso, o período é empregado para ilustrar a mudança de Mandela, deixando de lado a adoção da violência pela insistência, após ser liberado, na reconciliação e na paz. As polêmicas atividades de Winnie durante aqueles anos também são mencionadas, mas não as acusações mais pesadas feitas contra ela.

Zindzi ficou com raiva quando o pai saiu da prisão com uma mensagem de reconciliação em vez de triunfo militar como ela, a mãe e muitos ativistas locais desejavam.

Agora, ela raramente fala dos anos difíceis, preocupada que isso possa de alguma forma trair a política de reconciliação do pai.

Mandela foi enterrado em Qunu, vilarejo na província de Cabo Oriental. Segundo a filha, foi onde ele nasceu e gostaria de morrer.

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