James P. Allison, 66, é o presidente do Departamento de Imunologia no Centro de Câncer M.D. Anderson da Universidade do Texas em Houston. Sua pesquisa, sobre as formas de estimular o sistema imune a destruir um câncer, abriu um novo campo no tratamento da doença, a imunoterapia. Ele ganhou o Prêmio Louisa Gross Horwitz, que muitas vezes é precursor de um Nobel. Leia abaixo trechos de sua entrevista:
P. Otipo de droga que o senhor ajudou a inventar foi elogiado como sendo uma das únicas inovações no tratamento de câncer em décadas. O que o torna tão diferente?
R. Nos anos 1980, meu laboratório fez trabalhos sobre como as células T do sistema imunológico, que são as células de ataque, se prendem às células infectadas com vírus e bactérias para matá-las. Essa pesquisa me levou a pensar que o sistema imune poderia ser utilizado para matar cânceres. Basicamente, eu propus que deveríamos parar de nos preocupar em matar diretamente as células de câncer e desenvolver drogas para liberar as células T.
P. Procurar uma terapia para o câncer no sistema imune não é uma ideia nova, é?
R. Houve um cirurgião no século 19, chamado William Coley, que percebeu que os pacientes de câncer que tinham infecções depois de cirurgias tendiam a ter menos recorrências do que os que não tinham infecções. Ele pensou que havia algo nas bactérias que incitava o corpo a fazer algo terapêutico, e ele tentou desenvolver tratamentos com base nisso.
Coley teve um certo sucesso. Porém, suas ideias desapareceram com o advento da radioterapia, que se tornou o tratamento aceito.
P. O que o senhor descobriu?
R. Na década de 1990, minha equipe e outro grupo mostraram que havia uma molécula nas células T que, na verdade, agia como um interruptor, ou um pedal de freio, quando as células T encontram uma célula infectada. Em vez de atacar a célula, essa molécula aplica uma espécie de freio na reação imunológica. Chamamos isso de ponto de checagem.
Eu me perguntava se poderíamos bloquear esse interruptor para manter as células T ligadas. E foi o que fizemos. Desenvolvemos um anticorpo para acionar esse interruptor. Ele funcionou muito bem em muitos tipos de câncer em modelos com ratos.
Mais importante, funcionou em algumas pessoas com câncer de pele. A primeira droga desenvolvida a partir disso foi a Yervoy, aprovada nos EUA em 2011 contra melanomas metastáticos avançados e não operáveis. O acompanhamento a longo prazo de 5.000 pacientes de melanoma que a receberam revelou que 22% sobreviveram por pelo menos dez anos.
P. É um bom número?
R. Eram pacientes que geralmente teriam de sete meses a um ano de vida. Uma mulher em Santa Monica foi uma das primeiras pessoas a receber a droga. Ela tinha dois filhos no colégio. Nada havia funcionado. Então Antoni Ribas, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, disse: “Temos uma coisa experimental. Não sabemos se vai funcionar. Pode ser tóxico”. Ela disse: “Farei qualquer coisa para viver mais alguns meses e ver meu filho se formar no colégio”. Então eles a trataram e seus tumores desapareceram em cerca de quatro meses.
Eu a encontrei dez anos depois e ela me disse: “Sabe, meus filhos terminaram os estudos, se casaram e estão formando famílias”.
P. Há muitos casos de câncer na sua família, não é?
R. Minha mãe morreu de linfoma quando eu tinha 12 anos. Um tio morreu de melanoma, outro de câncer no pulmão. Meus dois irmãos tiveram câncer de próstata —um morreu disso.
Eu também fui diagnosticado com a doença. Foi detectada cedo. Fiz uma prostatectomia. Depois de ver como ela progrediu rápido no meu irmão e como era terrível, eu disse: “Não vou correr riscos. Vou me expor aos efeitos colaterais. Podem tirá-lo agora”.
P. Como se sente por ter dado um golpe em algo que causou tal devastação em sua família?
R. Acho que minha mãe e meu irmão ficariam orgulhosos. Desde o Yervoy, foram aprovadas duas outras drogas desse tipo nos EUA. E houve testes com outros cânceres usando Yervoy que indicam reações com benefícios clínicos para cânceres de próstata, de rim e de bexiga.