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 | Béatrice de Géa para The New York Times
| Foto: Béatrice de Géa para The New York Times
  • Abbott estuda como a percepção funciona em peixes fracamente elétricos

Os Estados Unidos e a União Europeia lançaram novos programas de pesquisas cerebrais, como parte de uma recente onda de estudos nesse campo.

Os cientistas estão mapeando áreas dos cérebros de ratos, moscas e humanos, com graus diversos de detalhamento. Com isso, eles tentam obter uma maior compreensão sobre o funcionamento cerebral, descobrindo, por exemplo, como o cérebro dos mamíferos se localiza espacialmente e recorda lugares, um trabalho que conquistou o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina neste ano.

No entanto, o crescente conjunto de dados disponíveis —mapas, atlas e conectomas que mostram as ligações entre as células e regiões do cérebro— constitui um paradoxo do progresso, pois esses avanços revelam como são enormes as lacunas na compreensão.

Restam perguntas demais, grandes e pequenas. Como a informação é codificada e transferida de uma célula para outra ou de rede celular para rede celular? A ciência encontrou um código genético, mas não existe um código neurológico aplicável a todo o cérebro —nenhum alfabeto elétrico ou químico que possa ser recombinado para dizer "vermelho" ou "medo". Ninguém sabe se a informação é codificada de forma diferente em diferentes partes do cérebro. Larry Abbott, 64, leciona na Universidade Columbia, em Nova York, e é um dos mais importantes teóricos desse campo.

Abbott trocou a física pela neurociência no final dos anos 1980, após passar pelo laboratório de Eve Marder, sua colega na Universidade Brandeis, em Massachusetts. Na época, a equipe dela estudava os neurônios que controlam um músculo dos caranguejos.

Um aluno de Marder mostrou a Abbott o equipamento que gravava a atividade elétrica dos neurônios e a traduzia em cliques que podiam ser ouvidos em alto-falantes cada vez que uma célula atingia um pico de atividade. "Foi o som desses picos que me extasiou", disse Abbott.

Marder e Abbott inventaram a técnica da fixação dinâmica, maneira de vincular as células do cérebro a um computador e manipular a sua atividade, testando ideias sobre como as células e redes celulares operam.

Uma década atrás, ele se transferiu da Brandeis para a Columbia, onde junto com outros cientistas tenta construir modelos computacionais do funcionamento cerebral. Individualmente, segundo ele, os neurônios já foram bem compreendidos. A questão agora é como grupos maiores, milhares de neurônios, trabalham juntos —seja para produzir uma ação, como pegar uma xícara, ou para perceber uma flor.

Existem maneiras de gravar a atividade elétrica neuronal no cérebro, e esses métodos estão melhorando rapidamente. Mas, explicou o cientista, "se eu lhe mostrar uma imagem de milhares de neurônios disparando, isso não vai dizer nada". A análise informatizada ajuda a reduzir e simplificar um quadro como esse, mas, segundo ele, o objetivo é descobrir o mecanismo fisiológico por trás dos dados.

Recentemente, ele trabalhou com Nate Sawtell, outro pesquisador de Columbia, e Ann Kennedy, pós-graduanda no laboratório de Sawtell, estudando peixes do tipo "fracamente elétricos". Ao contrário das enguias elétricas e de outros peixes que usam os choques para atordoar suas presas, esses peixes geram um campo elétrico fraco, que os ajuda a localizar a presa. Os pesquisadores conceberam experiências para tentar compreender como o cérebro e os órgãos de detecção de eletricidade desses peixes funcionam.

Abbott se juntou a outros no laboratório para levar essa compreensão um pouco além. O peixe fracamente elétrico tem dois sistemas de detecção. Um deles é passivo, colhendo campos elétricos de outros peixes ou presas. O outro é ativo, o envio de um pulso para comunicação ou como uma versão elétrica do sonar. Eles sabiam que o peixe era capaz de anular o seu próprio pulso elétrico, criando o que Abbott chamou de "imagem negativa".

Eles conectaram fios ao cérebro de um peixe fracamente elétrico e descobriram que um grupo de neurônios estava enviando uma cópia atrasada do comando que outra parte do cérebro destinava ao seu órgão elétrico. O sinal atrasado ia direto para o sistema de detecção passiva, de forma a cancelar a informação do pulso elétrico. "O cérebro precisa calcular o que é autogerado versus o que é externo", explicou Sawtell.

Essa descoberta pode não parecer um grande avanço, mas Abbott disse que ela ajuda a iluminar como uma criatura passa a traçar uma distinção entre si e o mundo. É o começo da compreensão acerca de como um cérebro ordena a enxurrada de dados que chegam do mundo exterior, dando-lhes sentido.

Isso, afinal de contas, é parte do trabalho do cérebro —construir uma imagem do mundo a partir de fótons e elétrons, luz e escuridão, moléculas e movimento e conectá-la com o que o peixe, ou a pessoa, se lembra, necessita e deseja.

"Nós olhamos o sistema nervoso das duas pontas para dentro", disse Abbott —ou seja, sensações que fluem para o cérebro e ações que são iniciadas lá. "Em algum lugar no meio fica realmente a inteligência, certo? É aí onde está a ação."

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