Visitante toca quadro em relevo que reproduz obra “O Guarda-Sol”, de Goya; exposição “Tocando o Prado” vai até 28 de junho| Foto: Pablo Blazquez Dominguez/Getty Images

Os guardas do Museu do Prado geralmente exigem que os visitantes se mantenham a um braço de distância de suas obras-primas. Mas, numa manhã recente neste museu de Madri, José Pedro González passava os dedos por uma das mais famosas pinturas de El Greco, “O Cavalheiro da Mão no Peito”.

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Ele fez um movimento de vaivém sobre os olhos do fidalgo, esfregou a barba da figura e finalmente chegou à mão, acompanhando as bordas de cada dedo.

Naturalmente, tratava-se de uma cópia. Mas —e isso é o mais surpreendente— essa cópia estava em três dimensões, para que González, 56, cego desde os 14 anos, pudesse experimentar a pintura por si próprio.

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“É uma sensação incrível”, descreveu. “Sinto a pintura até o detalhe de cada unha.”

González estava visitando uma exposição pequena e altamente incomum, chamada “Tocando o Prado”, que foi concebida para permitir que pessoas cegas ou com visão limitada pudessem, pelo tato, criar uma imagem mental de uma pintura.

A mostra, que vai até 28 de junho, ocupa uma passagem lateral do museu. Estão expostas cópias tridimensionais de seis telas famosas do acervo do Prado, incluindo “O Guarda-Sol” (Goya), uma natureza morta de Van der Hamen, “A Forja de Vulcano” (Velázquez) e “Noli Me Tangere” (Correggio), retratando um encontro de Jesus com Maria Madalena.

O Metropolitan Museum of Art (MoMA), de Nova York, e a National Gallery, de Londres, estão entre os vários museus que já organizam atividades para visitantes cegos, incluindo visitas guiadas especiais, aulas de desenho e oficinas “de toque”, no qual os deficientes visuais podem tatear esculturas. O Louvre, em Paris, também tem uma Galeria Tátil com reproduções de algumas esculturas de seu acervo.

Outros exemplos incluem o Museu de Arte de Denver e o Museu Nacional de San Carlos, na Cidade do México, um dos pioneiros no uso da colagem para reproduzir pinturas que pudessem ser sentidas pelos cegos.

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Mas a ideia de oferecer aos cegos a chance de tatear as telas por intermédio de cópias impressas em 3D vai muito além.

Em 2011, a Galeria degli Uffizi, em Florença (Itália), exibiu uma versão mais modesta do método tridimensional do Prado, oferecendo uma cópia reduzida de uma das suas obras-primas, “O Nascimento de Vênus”, de Botticelli.

Outros museus têm usado cópias 3D em preto e branco. Mas Fernando Pérez Suescun, curador da exposição no Prado, disse que para eles foi “importante adicionar a cor, porque os deficientes visuais muitas vezes ainda podem perceber um pouco de cor”.

Partindo de uma foto em alta resolução da tela, os funcionários da gráfica especializada Estudios Durero, próxima a Bilbao, selecionam texturas e características que pudessem ser realçadas para os cegos.

Em seguida, eles criaram uma impressão com uma tinta especial e, depois, usaram um processo químico para adicionar volume. Cada obra apresentada no Prado custa cerca de US$ 6.680.

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Um guia de áudio acompanha os cegos pela exposição, mas outros visitantes também recebem um guia de áudio e uma máscara para que possam se relacionar melhor com aquilo que um deficiente visual percebe.

González nunca havia visto o retrato do cavalheiro de El Greco, uma das muitas obras-primas do Prado. Mas ele havia visitado museus quando criança e continuou a fazer isso depois de perder a visão, com a ajuda de sua mulher, que lhe descreve as pinturas.

“É muito bom ver as pinturas com minha mulher e ficar com ela, mas faz claramente uma grande diferença quando eu consigo descobrir uma pintura sozinho em vez de escutar o que ela tem a me dizer”, afirmou.

Andrés Oteo, 56, que ficou cego por causa de um glaucoma há 35 anos, disse que havia visto o retrato do fidalgo na sua juventude, mas “uma coisa é lembrar mais ou menos de como era, e outra coisa é poder tocá-la em todos os seus detalhes”. Ele acrescentou: “É como recuperar a visão”.