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Relíquias assírias que existiram durante três mil anos foram quebradas e profanadas; ruínas dos tempos da Babilônia, bombardeadas e destruídas; pergaminhos e templos, devastados da Somália a Timbuktu.

Diretores de museus, arqueólogos e colecionadores se uniram em seu horror enquanto militantes islâmicos se exibem arrasando artefatos do mundo antigo.

O aniquilamento também intensificou o debate sobre a devolução de peças antigas aos países de origem por museus e colecionadores ocidentais, em uma prática conhecida como repatriação.

Para Gary Vikan, ex-diretor do Museu de Arte Walters, em Baltimore, Maryland, a violência no Iraque, Síria, Afeganistão e norte da África deveria — e vai — fazer as instituições pensarem duas vezes antes de fazer alguma restituição.

“Acho que isso põe um fim na fé excessiva em favor do modelo de repatriação”, diz ele.

Outros estudiosos e arqueólogos sugerem que aqueles que usam a força destrutiva dos extremistas para defender a não-devolução querem justificar práticas desacreditadas.

“Era só uma questão de tempo até que uma parte da comunidade de colecionadores tentasse se aproveitar desse pesadelo cultural em vantagem própria”, afirma Ricardo J. Elia, arqueólogo da Universidade de Boston.

A repatriação é reverenciada em tratados internacionais, defendida pelo governo dos EUA e considerada uma resposta moral às muitas décadas em que comerciantes e museus ocidentais negociaram e manipularam indiscriminada — e muitas vezes ilegalmente — relíquias mundiais.

Aqueles que são contrários à política são considerados defensores do colonialismo e da “máfia cultural”.

“Virou meio que uma filosofia idolatrar os itens culturais, deplorando qualquer tipo de intenção comercial em relação a eles”, afirma Timothy Potts, arqueólogo e diretor do Museu J. Paul Getty, em Los Angeles.

Ele, porém, assim como outros especialistas em antiguidades, dizem que as pilhagens cometidas pelo Estado Islâmico, também conhecido como EIIL, e outros grupos radicais, enfraquecem essa doutrina. Destaque entre eles é James Cuno, presidente do Fundo J. Paul Getty, que administra o museu de mesmo nome. Conhecido por defender o princípio de que as antiguidades importantes devem ser tratadas como propriedade comum à humanidade, Cuno publicou recentemente um artigo na revista trimestral Foreign Affairs e uma carta aberta no New York Times alegando que a repatriação em massa ameaça o patrimônio cultural dos países que supostamente beneficiariam.

“Calamidades podem ocorrer em qualquer lugar, mas é pouco provável que aconteçam em todos os lugares ao mesmo tempo. É por isso que o risco deve ser distribuído e não concentrado”, defendeu ele em entrevista.

Outros também se manifestaram: Abdulrahman al-Rashed, comentarista do Grupo MBC, uma rede de TV de Dubai, surpreendeu muita gente ao escrever um artigo para um jornal declarando: “As depredações recentes provam que não merecemos os tesouros que enchem nossos museus e estão enterrados sob nossas areias”.

O prefeito de Londres, Boris Johnson, cita os eventos no Iraque e na Síria para justificar a remoção, há 200 anos, dos chamados Mármores de Elgin do Partenon, na Grécia, e sua permanência no Museu Britânico, onde estão até hoje.

Os defensores da repatriação se dizem desanimados com o retorno de uma discussão que estava praticamente ganha.

“O Iraque pode ser o grande problema hoje, mas não há razão para crer que amanhã não seja Nova York. As estátuas iraquianas ameaçadas têm três mil anos e já viram a ascensão e queda de muitos impérios”, afirma Tess Davis, advogada e especialista em artefatos saqueados da Coalizão de Antiguidades, que é a favor da repatriação.

Já Peter Tompa, ex-vice-presidente do Comitê Legal do Patrimônio Artístico e Cultural da American Bar Association (um tipo de versão norte-americana da OAB), diz que concorda com o colega que comentou: “Se os povos desses países são indiferentes e até hostis ao ‘patrimônio cultural’, por que deixar que abandonem e destruam esses tesouros?”.

Em tempos de conflito, a quem pertencem os artefatos históricos?

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