"Sono de Inverno", novo filme do diretor turco Nuri Bilge Ceylan, levou o prêmio máximo no Festival de Cannes do ano passado e tem sido aclamado pelos críticos, que dizem que o diretor afirma seu lugar como um dos mais importantes autores de hoje.
Como seu trabalho, Ceylan é reticente e introspectivo. Em uma entrevista recente, ele só se animou quando mencionaram que o filme era quase impossível de descrever.
"Eu não sei dizer do que se trata", disse Ceylan (pronuncia-se ZHAY-lan) durante um chá com sua esposa no apartamento que ele usa como escritório. "É sobre a vida. Meus filmes são principalmente sobre pessoas tentando entender as relações humanas. A história, ou o que está acontecendo, não é assim tão importante."
Baseado em duas obras de Anton Chekhov e situado em um hotel da Anatólia rural no inverno, "Sono de Inverno" conta a história de Aydin, ator aposentado cujo nome em turco significa "intelectual iluminado", e Nihal, sua bela esposa mais jovem, que se mudam para um hotel que ele havia herdado. O filme é estrelado por Haluk Bilginer como o marido alternadamente compassivo e arrogante, Melisa Sozen como sua esposa compreensiva e frustrada, e Demet Akbag, atriz de muitas comédias turcas, como a irmã divorciada de Aydin.
O filme começa com um ato de vingança: um menino jogando uma pedra na janela de um carro. Sua família deve aluguel a Aydin, mas a pessoa responsável pelo sustento havia sido presa. Outras questões sociais acontecem ao fundo; Nihal quer arrecadar dinheiro para ajudar a melhorar as escolas locais. Aydin, que passa seus dias escrevendo editoriais pomposos para o jornal local, acha que ela está perdendo tempo.
O filme toca em temas que Ceylan já explorou em filmes anteriores a divisão entre a Turquia rural e urbana, a classe trabalhadora e os intelectuais, religião e secularismo; além de honra, orgulho, moralidade e as formas em que podemos, ou não, expressar amor.
As discussões entre Aydin e Nihal são o produto de intensa colaboração entre Ceylan, de 55 anos, e sua esposa, Ebru Ceylan, de 38. Juntos, eles escreveram o roteiro, como fizeram em "Era uma vez na Anatólia", que ganhou o Grand Prix em Cannes em 2011, e "Climas", filme de 2006 no qual eles atuam como um casal cujo relacionamento se desfaz.
Há 15 anos, Ceylan disse, ele queria fazer um filme baseado nos contos "A Esposa" e "Gente Surpéflua" de Chekhov, mas até o sucesso de "Era uma vez na Anatólia", que também foi baseado em Tchekhov, faltava-lhe a confiança para abraçar a tarefa.
Ebru Ceylan acrescentou que sempre chora quando relê "A Esposa". "É um conto que toca as profundezas dos sentimentos e das emoções que quase nunca são tocadas. Coisas experimentadas entre duas pessoas, mas que parecem impossíveis de explicar", ela disse.
O próprio Ceylan financiou seus primeiros filmes, onde parentes e amigos próximos atuavam.
Para a estreia de "Sono de Inverno" em Cannes, ele e o elenco passaram pelo tapete vermelho usando fitas pretas em solidariedade às vítimas de um acidente em uma mina na Turquia. Ele dedicou sua Palma de Ouro "aos jovens turcos e àqueles que perderam suas vidas no último ano", uma referência implícita aos mineiros e aos que se envolveram nas revoltas no Parque Gezi em 2013 em Istambul.
"Sono de Inverno", que custou 3 milhões de euros (US$ 3,7 milhões) e recebeu financiamento do governo turco e da produtora francesa Memento Films, não é abertamente político, mas trata de questões sociais.
Depois de Cannes, o filme foi mostrado em festivais internacionais durante todo o ano passado.
"O valor de Ceylan está na sua capacidade de transformar histórias pessoais em uma grande narrativa que sugere algo sobre a situação do país", disse Firat Yucel, editor da revista de cinema turca Altyazi. Ceylan disse que seu trabalho se baseia em sutilezas. "O ambíguo é parte da vida é isso que faz valer a pena fazer filmes", ele disse.
Ele ignora as convenções de Hollywood que trazem sempre lindas lições. "Eles buscam a auto ajuda. Eu só estou tentando mostrar a vida como a sinto."