Uma estrela surgiu no Oriente.
Seguindo seu brilho, de acordo com a história bíblica, os três Reis Magos chegaram a Belém e souberam que o filho de Deus tinha vindo para morrer por nossos pecados.
Até onde se sabe, paz na Terra aos homens de boa vontade funciona aqui, mas alguns astrônomos e teólogos imaginam como o resto do universo receberia essa mensagem.
Descobriu-se nas últimas duas décadas que há bilhões de planetas potencialmente habitáveis na Via Láctea. Só no mês passado, cientistas da agência espacial norte-americana, a NASA, disseram que a sonda em Marte detectou metano, sinal provável da presença de micróbios.
Ou seja, não é tão inconcebível imaginar outras criaturas espalhadas por bilhões de anos-luz de história cósmica.
Será que Cristo veio para morrer por seus pecados também? Ou, como Geoffrey Marcy, explorador de exoplanetas da Universidade da Califórnia em Berkeley, disse recentemente em um e-mail: "Será que eles sabem que é Natal?"
É claro que os terráqueos não são as únicas criaturas da Via Láctea abençoadas aos olhos de Deus, diz ele. "Uma conversa sobre religião com seres inteligentes de outro planeta pode fazer a humanidade perceber como nossas crenças são limitadas", afirma.
O Papa Francisco sugeriu em uma homilia, em maio, que batizaria marcianos se eles aterrissassem na Praça de São Pedro e o pedissem.
Você deve estar se perguntando: mas como um alienígena peca? Na Terra, a violência e o sofrimento fazem parte do esforço darwiniano pela sobrevivência que nos gerou, afirma Ted Peters, professor do Centro de Teologia e Ciências Naturais de Berkeley, na Califórnia. Ele escreveu no jornal Philosophical Transactions of the Royal Society, em 2011: "Se os extraterrestres são feitos do mesmo material que nós, será que compartilham a ambiguidade entre o bem e o mal que nos é tão familiar?".
Mas e se eles forem computadores ou outras formas de inteligência artificial que podem nos superar como mestres do universo?
Acadêmicos cristãos como o Dr. Peters e até o Papa concordam com a possibilidade de que a redenção se estende a toda a criação, talvez até ao mundo inanimado.
"Como Ele pode ser Deus e deixar os alienígenas em pecado? Afinal, foi bom para nós; por que não seria bom para eles?", questiona o reverendo George V. Coyne, ex-diretor do Observatório do Vaticano e hoje padre jesuíta, no livro que escreveu em 2000. "Many Worlds: The New Universe, Extraterrestrial Life and the Theological Implications" ("Muitos mundos: o novo universo, vida extraterrestre e as implicações teológicas").
Guy Consolmagno, outro jesuíta do Observatório do Vaticano, passou dez anos trabalhando e dando aulas como cientista planetário, especializado em meteoritos. Em sua opinião, o Natal seria uma história maravilhosa para os alienígenas, mas admite não ter respostas e que esse detalhe faz parte da diversão.
Para ele, ao contrário da percepção popular, a religião, assim como a ciência, não é um livro fechado. "A ciência é o que entendemos sobre as verdades que conhecemos parcialmente; a religião tenta se aproximar das verdades que não entendemos. Quanto mais você sabe, mais percebe que não entende. A isso chamamos progresso", diz.
E conclui afirmando que o desafio maior na vida de uma pessoa ou espécie é aprender as verdades alheias sem desistir da própria.
Brincando, o Dr. Marcy evocou o que chama de "modelo multidivino do universo".
Segundo ele, pode haver espaço no universo para mais de uma verdade se todo planeta habitado tiver seu deus próprio. E sua população pode ter tanta certeza de suas crenças como nós, humanos, temos das nossas.
"As divindades delimitaram seus territórios galácticos operacionais e somente com a pesquisa do SETI (referindo-se ao projeto que busca inteligência extraterrestre) saberemos se o nosso Deus é o único do universo", conclui.
No universo ideal, talvez todas essas verdades e deuses possam coexistir de forma misteriosa e até reveladora ou, quem sabe, seja só aquilo em que queremos acreditar e a realidade é que há outra resposta, mais assustadora, para o Natal.
A tal da estrela do Oriente, por exemplo; ela foi tema de um clássico de Arthur C. Clarke, escritor de ficção científica e visionário do espaço.
Em "A Estrela", conto publicado em 1955, uma expedição ao local da explosão de uma supernova descobre os restos de uma civilização antiga, cuidadosamente preservada porque seus membros sabiam que seriam destruídos. A história é narrada pelo astrofísico a bordo, por sinal um jesuíta que consegue definir exatamente quando ocorreu a explosão que acabou com aquela raça e como era a Terra há dois mil anos.
"Não pode haver dúvida: o antigo mistério está resolvido, finalmente. E, no entanto, ó Deus, havia tantas outras estrelas que podíeis ter usado. Que necessidade havia de dar esta gente ao fogo, para que o símbolo do seu sacrifício pudesse um dia ter brilhado sobre Belém?"
O irmão Consolmagno conhece a história. "Não é o tipo do Deus que me satisfaz", confessa ele.
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